São Paulo, quarta-feira, 08 de maio de 2002

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TELEVISÃO

Com direção de Ninho Moraes, jornalista estréia nas madrugadas, tentando trazer substância ao cenário atual

Programa explora versatilidade de Gabi

ESTHER HAMBURGER
CRÍTICA DA FOLHA

Aécio Neves nasceu em 10 de março de 1960. É do signo de peixes, com ascendente em escorpião. Posou de coração de pelúcia vermelho em punho para uma foto "lambe-lambe" digital a ser enviada a um ente querido. Separado, o deputado elegeu sua filha como destinatária do mimo que faz o momento relax de "De Frente com Gabi", o promissor programa de Marília Gabriela, que volta à TV aberta no SBT.
O programa estréia em momento em que a conjuntura político-econômica-eleitoral está aquecida, em tom parecido com narrativas de seriados melodramáticos. Mercados econômicos e financeiros se comportam de maneira cada vez mais subjetiva, movidos por especulações sobre o futuro econômico dos países, que, por sua vez, obedecem a eventos voláteis. Denúncias provocam escândalos, que abalam mercados, que mudam previsões, que sinalizam melhoras ou pioras econômicas.
Candidatos administram suas carreiras segundo índices de opinião, esses indicadores flutuantes e imprevisíveis, que servem no entanto de bússola. Governantes se guiam por critérios semelhantes. E o jogo de imagens, que define o que é e o que não é notícia, o que merece e o que não merece visibilidade, vai se tornando dimensão estratégica. Nesse contexto, o programa oferta ao convidado seu mapa astral, um instrumento de navegação tão ou mais confiável nos instáveis tempos atuais.
"Talk shows" são vitrines para políticos, artistas, esportistas. Palcos privilegiados para propaganda de um novo CD, uma peça de teatro etc. Servem também à veiculação de campanhas eleitorais. O desafio está em ir além dessa exposição quase institucional, provocando novas perspectivas.
Desde seus tempos de âncora do "TV Mulher", Gabi se afirmou como jornalista versátil, capaz de dominar uma variedade de assuntos, penetrar o universo do entrevistado e a partir de lá provocar depoimentos que tragam novidade. Olho no olho com o convidado, pode ir além do mero "revelar segredos de pessoas famosas" -como alardeia o anúncio do programa, a la revista "Caras"- e provocar polêmica. Como outros trabalhos da apresentadora, o programa tem direção de Ninho Moraes e é um alívio.
Maquiagem discreta, cenários em tons cinza, um convidado no estúdio e um convidado linkado via satélite -presença virtual através de monitor de cristal líquido. A atmosfera é limpa, simples e direta. Câmeras no teto e em movimento procuram escrutinar ângulos inusitados.
O programa estreou quente, aproveitando entrevistas agendadas anteriormente com Aécio Neves, no estúdio, e Pedro Simon, via satélite de Brasília, para tratar do assunto político da semana: as denúncias de corrupção na privatização da Vale do Rio Doce.
Gabi foi simpática e, até certo ponto, reverente com "Aecinho", que conhece de seus tempos de secretário particular do avô Tancredo. Deixa que o jovem herdeiro mostre sua faceta de político ofensivo, empenhado em restaurar o respeito por instituições desgastadas. Mas questiona o aumento recente das tarifas de energia elétrica, uma consequência de erros de avaliação e planejamento do governo e das empresas privatizadas, pelo qual o contribuinte acabou -para variar- pagando.
Em tempos de "reality shows", carregados de futilidade, "De Frente com Gabi" não dispensa o coração de pelúcia, mas pode trazer substância. Mais uma vez competindo com Jô, Gabi talvez estimule o concorrente, outro interlocutor habilitado, a sintonizar questões seculares que o Brasil hesita em enfrentar. Ou a trazer à tona novos paradoxos, inspirados por transformações recentes.


De Frente com Gabi    
Quando: de seg. a sex., por volta de 0h30 (após o "Jornal do SBT"), no SBT




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