São Paulo, sábado, 08 de junho de 2002

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Documenta exibe mapa da arte sem fronteiras

France Presse
Bicicletas estacionadas em frente ao Museu Fridericianum, que fazem parte da obra do artista Meschac Gaba, em Kassel



Mais importante mostra contemporânea começa hoje em Kassel, na Alemanha


FABIO CYPRIANO
ENVIADO ESPECIAL A KASSEL

A Documenta 11, "a mais importante mostra de arte contemporânea", é inaugurada hoje, em Kassel, na Alemanha. O caráter superlativo da exposição é adotado pelo próprio curador-geral, o nigeriano Okwui Enwezor. "É a mais importante porque é feita lentamente. Três anos é o tempo ideal para organizar uma mostra prospectiva, que possa apresentar as tendências atuais da arte", disse Enwezor em concorrida entrevista coletiva, para mais de mil pessoas, anteontem.
Estavam presentes não só jornalistas, mas diretores de museus de toda parte e até ex-curadores do evento, como Catherine David (98) e Harald Szeemann (72).
A primeira Documenta foi inaugurada em 1955, por Arnold Bode, com a cidade de Kassel ainda em ruínas após a Segunda Guerra Mundial, para resgatar o panorama da arte moderna, banida da Alemanha nazista, especialmente após a exposição "Arte Degenerada", de 1937, organizada a pedido de Hitler para condenar a estética modernista.
O caráter político da primeira exposição é retomado agora por Enwezor, nigeriano que vive em Nova York, primeiro não-europeu a curar a exposição. A mostra que é inaugurada hoje é considerada a quinta plataforma, após quatro seminários em quatro cantos do planeta. Nunca a Documenta havia passado por tal processo. Os debates tiveram início em março do ano passado em Viena, com o tema "Democracia Não-Realizada", e terminaram em janeiro passado em Lagos, na Nigéria, tratando de grandes cidades africanas.

Constelação
"A Documenta reflete a totalidade do mundo, que vive um período de instabilidade das identidades neste momento, que denomino de pós-colonial; a mostra foi fundada num período de questionamentos como o que vivemos hoje", disse Enwezor.
Para conseguir abarcar a "totalidade do mundo", Enwezor teve o auxílio de seis curadores-assistentes: o argentino Carlos Basualdo, a alemã Ute Meta Bauer, a americana Susanne Ghez, o sul-africano Sarat Maharaj, o inglês Mark Nash e o espanhol Octavio Zaya.
Todos eles, na entrevista coletiva, deram ênfase ao caráter investigativo da arte. "A tensão da arte contemporânea não é apenas estética, mas definitivamente voltada à produção do conhecimento", afirmou Maharaj.
Aliada a essa função epistemológica, outra marca foi definida: "O cenário da arte hoje é transnacional, por isso nosso ponto de partida não foi geográfico, mas sim trabalhar a geografia de forma complexa", disse Basualdo.
De fato, grande parte das 450 obras dos 116 artistas na exposição aponta para essa complexidade. Um dos trabalhos que melhor exemplifica essa idéia é a instalação de Shirin Neshat, que também participou da 25ª Bienal de São Paulo. Iraniana, residente em Nova York, Neshat apresenta a videoinstalação "Tooba", produzida no México.
Fronteiras e nacionalidades não são mais importantes para a produção da arte. Na obra, de grande carga dramática, uma mulher está encaixada dentro de uma árvore numa paisagem árida. Em volta da árvore há um muro. Camponeses surgem das montanhas, pulam o muro até se aproximarem da mulher. A obra é cheia de metáforas: a integração homem-natureza e a necessidade de saltar barreiras para tal integração são duas delas.
A Documenta, com um orçamento de US$ 12,78 milhões, ganha nesta 11ª edição novo espaço expositivo. Além do tradicional Museu Fridericianum, a Documenta-Halle e a Kultur-Banhoff, foi ampliada em mais 6.000 m2 com o prédio de uma antiga cervejaria. "Esse é o melhor espaço da mostra, espero que seja mantido", disse Szeemann à Folha.
O local é realmente o mais sofisticado do evento. Um imenso labirinto, com carpete no piso e novas paredes. Lá estão alguns dos artistas mais reconhecidos da mostra, como a francesa Louise Bourgeois, o fotógrafo norte-americano Allan Sekula e o inglês Steve Mcqueen.
Organizada por meio de um processo tão intenso, marcado pelos debates políticos das primeiras plataformas, a expectativa era se o nível artístico da Documenta estaria comprometido. "A mostra não é uma conclusão, mas uma constelação", disse Enwezor. O brilho das obras selecionadas, mas de 70% delas produzidas para a exposição, atesta que, de fato, a Documenta continua sendo a mais importante mostra de arte contemporânea do planeta.


DOCUMENTA 11 - mostra com 450 obras de 116 artistas de todo o mundo. Curadoria: Okwui Enwezor. Quando: abertura hoje; diariamente, das 10h às 20h. Até 8/9. Onde: Kassel, Alemanha. Site: www.documenta.de.



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