São Paulo, sábado, 08 de junho de 2002

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Fatos concretos


Cinquentenário do movimento paulista sai da sombra da Semana de 22 e ganha luz própria em evento em São Paulo


FRANCESCA ANGIOLILLO
DA REPORTAGEM LOCAL

O primeiro fato é matemático: 2002 marca os primeiros 50 anos de arte concreta paulista.
Foi em 1952 que o Grupo Ruptura reuniu-se para sua primeira mostra, numa acanhada sala do Museu de Arte Moderna, então localizado no centro da cidade.
O trabalho dos sete jovens artistas reverbera até hoje, numa espécie de espírito de São Paulo; a "cara" da cidade é um pouco a que o movimento por eles deflagrado inventou -está, por exemplo, no desenho das calçadas, reprodução estilizada do mapa do Estado.
Nada mais coerente, portanto, do que o aniversário ganhar comemoração no coração da cidade. Mais especificamente na Vila Buarque, no Centro Universitário Maria Antonia (Ceuma).
O evento "Arte Concreta Paulista" desdobra-se até o fim do ano. Suas primeiras manifestações são duas mostras que serão inauguradas na semana que vem, a do Grupo Ruptura e a de Antônio Maluf.
Ao planejar com um grupo de curadores o calendário para 2002, o crítico Lorenzo Mammì, 45, diretor do Ceuma, se deu conta de que a efeméride "estava passando despercebida". "Todo mundo falava dos 80 anos da Semana de Arte Moderna", diz Mammì.
A percepção de que a importância do movimento é constantemente eclipsada por outros dois marcos da história da arte brasileira é outro fator a nortear as comemorações -que terão, ainda, mostras sobre a revista "Noigandres", palco da poesia concretista, e sobre Waldemar Cordeiro, um dos papas do movimento.
Comprimida entre o marco 1, a Semana de Arte Moderna, e o marco 2, o neo-concretismo de Lygia Clark, Lygia Pape e Hélio Oiticica, a arte concreta de São Paulo é, na opinião de Mammì, o "momento da virada da arte paulista", por ter previsto "aplicação mais sistemática do ideal modernista num raio mais amplo".
Por raio mais amplo entenda-se a extensão do domínio artístico a peças do dia-a-dia. Era a preocupação dos jovens artistas -nomes hoje consagrados pelos conhecedores, como Geraldo de Barros e Luiz Sacilotto- levar a arte ao cotidiano.
Daí a produção concretista ter ido além do suporte da tela e da escultura e chegado aos azulejos, cartazes e até estampas de tecido.
Justamente essa busca pela popularização, porém, é um dos fatores a contribuir para um certo oblívio do movimento pelo grande público a que se destinava. Não teve a força de "fato inaugural" do modernismo, nem se impôs de modo "marginal", como os neoconcretos, diz Mammì, "sem demérito para um ou outro".
Não faz sentido, segue ele, buscar sua "obra-prima", mas é importante ressaltar que ela foi responsável pela "criação de um gosto", marcando "um antes e um depois evidentes".

Conjuntura
Uma série de circunstâncias operou para que a arte concreta paulista se tornasse a "fagulha que desencadeou a arte moderna brasileira": a vinda do artista suíço Max Bill, em 50; a criação do Instituto de Arte Contemporânea do Masp e seu pioneiro curso de desenho industrial, em 51; e a primeira Bienal de São Paulo, em 52.
Foi com a primeira Bienal que se projetou a "ovelha desgarrada" dos concretistas, Antônio Maluf. Aos 25 anos, após rápida passagem pelo IAC, Maluf concebeu o célebre cartaz da Bienal, que, com sua perspectiva a partir de retângulos de diferentes tamanhos, é considerado precursor do design gráfico moderno nacional.
Em 53, poucos meses após a exposição do Grupo Ruptura no MAM-SP, Maluf participava da 1ª Exposição Nacional de Arte Abstrata, no hotel Quitandinha, em Petrópolis, ao lado do carioca Grupo Frente, mas independente.
A mostra dedicada a Maluf, 75, no Ceuma é a segunda individual de toda sua vida e mereceu a sala maior do evento.
Nela estarão expostos quadros e exemplos de arte aplicada -como tecidos e reproduções de painéis de azulejos-, selecionados por Regina Teixeira de Barros para retratar o amplo espectro da produção do artista.
Sob curadoria de Rejane Cintrão, os artistas do Ruptura -Geraldo de Barros, Lothar Charoux, Waldemar Cordeiro, Kazmer Féjer, Leopold Haar, Luiz Sacilotto e Anatol Wladyslaw- dividem o espaço da sala menor, de dimensões mais próximas à do ambiente que a hospedou originalmente em 52 e que se buscou reproduzir.


GRUPO RUPTURA - obras de Geraldo de Barros, Lothar Charoux, Waldermar Cordeiro, Kazmer Féjer, Leopold Haar, Luiz Sacilotto e Anatol Wladyslaw. Curadoria: Rejane Cintrão. Onde: Centro Universitário Maria Antonia (r. Maria Antonia, 294; tel. 0/xx/11/3255-5538). Quando: de 13/6 a 21/7. De seg. a sex., das 12h às 21h; sáb., dom. e fer., das 9h às 21h. Grátis



ANTONIO MALUF - Pintura e arte aplicada. Curadoria: Regina T. de Barros. Idem.



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