São Paulo, quarta-feira, 08 de junho de 2011

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João Cabral falava sobre o projeto desde os anos 1960

Em excursão europeia da montagem de "Morte e Vida Severina", poeta descreveu ideia de "A Casa de Farinha"

Texto de Evaldo Cabral sobre importância da mandioca pode integrar edição do inédito a ser publicada pela Alfaguara

José Patrício - 16.mai.04/Folhapress
Casa de farinha reproduzida durante festa de São João no Anhembi, em São Paulo

DE SÃO PAULO

Pelo menos desde 1966, quando acompanhou a turnê europeia do grupo de teatro do Tuca na antológica montagem de "Morte e Vida Severina", João Cabral de Melo Neto já falava que escreveria "A Casa de Farinha".
Silnei Siqueira, o diretor daquele espetáculo (com música de Chico Buarque), conta que, na ocasião, o poeta lhe descreveu a ideia.
"Ele queria uma coisa muito bonita, uma história sobre a estranheza das pessoas da casa de farinha porque o dono do local de repente deixa de cobrar aluguel", lembra.
Como muitos, Silnei achava que o projeto não fora adiante e pareceu eufórico ao saber que João Cabral deixou um manuscrito e que ele será editado. "Ô, nego, que bela notícia para mim, que coisa boa, eu não sabia disso."
Numa entrevista em 1987, o autor de "Museu de Tudo" disse que o auto estava "praticamente pela metade".
Segundo Inez Cabral de Melo, 63, segunda dos cinco filhos de João Cabral, no manuscrito não há personagens específicos, mas coros, cujos arautos são os trabalhadores da casa de farinha. Os homens que levam a mandioca ao local são os "pessimistas", e as mulheres que a descascam são as "otimistas".
Os "pessimistas" fazem circular um boato de que a casa de farinha vai fechar.
O auto gira em torno das conjecturas sobre o futuro dos trabalhadores. "Vai virar uma usina? A Sudene, que paira como uma entidade, vai transformar aquilo em outra coisa?", detalha Inez.
Ela diz que o manuscrito tem papéis de todos os tamanhos. "Papai escrevia à mão, em pedacinhos de papel. No meio de uma conversa, de repente ele tirava um papel, escrevia e guardava no bolso."
Depois de digitados, os inéditos resultaram em 35 páginas. O livro terá textos complementares. Um deles, segundo deseja Inez, poderá ser do historiador Evaldo Cabral de Melo, irmão de João, sobre a importância da mandioca para as culturas nordestina e brasileira.

ANSIEDADE
Estudioso da obra do poeta (está ampliando o seu livro "João Cabral - A Poesia do Menos"), o professor Antonio Carlos Secchin notou de pronto o estilo cabralino no trecho obtido pela Folha.
"Esse processo de elogiar o que é de baixo para cima, e não de cima para baixo, é uma constante na poesia dele. Em "Tecendo a Manhã" ["Um galo sozinho não tece uma manhã..."], ele faz elogio do trabalho solidário e diz que a manhã é tecida a partir de uma luz que é feita do chão para o alto."
Secchin sabia do projeto de "A Casa de Farinha", mas também achava que o poeta não o havia executado. Ao ser informado de que o manuscrito será editado, disse: "Estou louco para ver isso, mas calmamente eu espero. Apenas sei controlar a minha ansiedade". (FABIO VICTOR)


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