São Paulo, sexta-feira, 08 de julho de 2005

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CINEMA/"CAIU DO CÉU"

Menino conversa com santos e divide fortuna com pobres em comédia do diretor de "Trainspotting"

Novo de Boyle funciona melhor visualmente

LEANDRO FORTINO
DA REPORTAGEM LOCAL

Danny Boyle já desenterrou defuntos, em "Cova Rasa", dividiu a seringa com junkies, em "Trainspotting", tornou real um amor impossível, em "Por uma Vida Menos Ordinária", morou em uma comunidade hippie, em "A Praia", e infectou a humanidade com um vírus mortal, em "Extermínio". Agora, ele atende às preces de um garotinho.
Isso mesmo, o diretor inglês, tido como a grande promessa do cinema britânico nos anos 90, filma os delírios de um menino fascinado por santos em "Caiu do Céu", seu primeiro longa que leva escondido o decepcionante aposto "para toda a família".
A fantasia se passa a uma semana de o Reino Unido trocar de vez as seguras libras esterlinas pelos assustadores euros.
Ronnie (James Nesbitt) é o pai viúvo dos garotos Damian (Alexander Nathan Etel), 7, e Anthony (Lewis Owen McGibbon), 10.
Após se mudar para uma casa em um bairro moderno e sem nenhum charme no subúrbio inglês, Damian, aficionado por santos, suas histórias e milagres, constrói uma fortaleza de caixas de papelão ao lado dos trilhos do trem.
Mas a imaginação do garoto vai bem além de seu talento como engenheiro, e ele passa a enxergar e conversar com seus santos prediletos e a descobrir que sua sina é mesmo ajudar os pobres.
O dinheiro para isso literalmente cai do céu: uma sacola cheia de notas de libras desaba do nada em cima do castelo de papel do protagonista. Damian acredita que ela foi enviada por Deus.
Como ele e o irmão mais velho administrarão a fortuna, que deve ser usada antes que as libras deixem de ser aceitas, é o que amarra a comédia, numa discussão que se divide entre fazer o bem (ajudar quem precisa) e o mal (adquirir bens de consumo material).
O último filme de Boyle, "Extermínio", já mostrava uma certa tendência para o melodrama ao colocar na história de horror a preocupação de um pai amoroso com o bem-estar da filha.
Mas o maior problema aqui é que ele não deixa clara sua posição sobre assuntos polêmicos e centrais do filme: caridade, religiosidade e relação familiar.
Tudo bem que saber a intenção exata do diretor em um filme não é essencial, mas Boyle não apresenta argumentos nem deixa dúvidas necessárias para que o espectador tire suas próprias conclusões sobre o assunto, o que pode ser muito frustrante.
Em algumas cenas, há a presença muito forte de merchandising, o que chega a chocar, como a caixa de papelão do aparelho de TV Philips e a própria sacola do dinheiro, com o logotipo da Nike "gritando", que aparece diversas vezes durante todo o filme.
Mas, visualmente, "Caiu do Céu" funciona muito bem, carregado de cores fortes e de cenas em stop-motion (quadro a quadro) que reproduzem bem a visão criativa de uma criança de sete anos.


Caiu do Céu
Millions
  
Direção: Danny Boyle
Produção: Reino Unido, 2004
Com: James Nesbitt, Alexander Nathan Etel e Lewis Owen McGibbon
Quando: a partir de hoje nos cines Reserva Cultural, Bristol, Market Place Playarte e circuito


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