São Paulo, segunda-feira, 08 de agosto de 2005 |
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Filme feito na Baixada Fluminense após a chacina de 30 pessoas é exibido em festival suíço Mortes densas
SILVANA ARANTES DA REPORTAGEM LOCAL Por enquanto, é a metade de um filme. A versão do documentário brasileiro "Atos dos Homens" a que o Festival de Locarno assiste hoje tem 40 minutos de 80 previstos para a montagem final. Convidado da mostra suíça como "work in progress" (trabalho em andamento), o novo longa-metragem do cineasta Kiko Goifman ("Morte Densa", "33") registra a vida na Baixada Fluminense após a chacina de 30 pessoas, em março deste ano. Na introdução do filme (que a Folha viu em São Paulo), Goifman, 37, conta que tentou ignorar a matança em Nova Iguaçu e Queimados e seguir com o projeto que estava a ponto de filmar. O cineasta faria um filme sobre sete sobreviventes a chacinas brasileiras, como as de Vigário Geral (21 mortos, em 1993), Corumbiara (12 mortos, em 1995) e Carajás (19 mortos, em 1996). Fechar os olhos para o que havia ocorrido na Baixada, porém, "foi impossível", diz Goifman, que partiu para lá depois de fazer um pacto com a equipe: "Não tomaria nenhuma decisão sozinho". Dividir entre todos a responsabilidade foi compromisso firmado depois que Goifman ouviu de amigos seus conhecedores da Baixada que não era boa idéia filmar naquele local, naquele momento. "Eles me diziam que eu estava me metendo num assunto muito perigoso, que são os grupos de extermínio", afirma. Mas, assim como o projeto inicial de documentar sete sobreviventes de chacinas não pretendia ser "um "pot-pourri" da desgraça brasileira, e sim um olhar sobre a vida das pessoas", este "Atos dos Homens" tampouco se interessa em esmiuçar as vísceras do crime. Pontuam o filme conversas com moradores do local. O documentarista quer saber como cada um toca a sua vida ali. Invariavelmente, a violência surge na conversa e, especificamente, a recém-ocorrida chacina. O diálogo mais tenso é com um matador, integrante de grupo de extermínio, cuja imagem não aparece. "Já que a polícia não cobra de ninguém, a gente cobra com mais rigor", diz o homem. Ele enumera execuções que perpetrou. Diz que "vagabundo tem que morrer mesmo". E, pensando no futuro, conclui: "Se for para chorar a minha mãe, que chorem as deles [as vítimas] primeiro". São lágrimas de uma mãe as que interrompem a fala de outra entrevistada do filme. A mulher narra o enterro do filho, um travesti vítima da chacina, que tem policiais militares como suspeitos de serem os autores. "O caráter dele [o filho] não estava na roupa. Se o caráter estivesse na roupa, estaria numa farda", diz a mãe, sem mostrar o rosto. Por que parentes de vítimas, que se sentem ameaçados, ou um matador exigem anonimato, mas concordam em falar num filme? Essa e outras perguntas Goifman responde na entrevista a seguir. Folha - O sr. sai deste mergulho
na Baixada Fluminense com que
idéia a respeito do local? Folha - Por que pessoas que não
querem que sua imagem apareça
aceitam falar para um filme? Folha - E quanto ao matador? Folha - No filme, o sr. ressalta as
sensações de medo e calor. Era um
medo difuso ou específico? Folha - Por que, estando na Baixada nos dias seguintes à chacina,
o filme não investiga o crime? |
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