São Paulo, sábado, 08 de setembro de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Francês David B. narra drama familiar na HQ "Epiléptico"

Editora Conrad lança primeiro volume do álbum premiado

MARCO AURÉLIO CANÔNICO
DA REPORTAGEM LOCAL

É sabido que autores franceses com reminiscências da infância já escreveram grandes histórias. Agora, com a publicação de "Epiléptico", de David B., o Brasil tem a chance de descobrir que eles também desenham boas histórias a partir desse tipo de memória.
A premiada obra (melhor roteiro no Festival de Angoulême de 2000), que será publicada em três volumes, pela Conrad, é um romance de formação que acompanha a vida do imaginativo Pierre-François Beauchard (nome real do autor) e de sua família.
O evento que baliza toda a narrativa, como o pouco sutil título brasileiro já entrega, é a epilepsia de seu irmão mais velho, Jean-Christophe.
A partir da "ascensão do grande mal" (o título original, "L'Ascension du Haut Mal"), quando o menino tinha apenas sete anos (e o autor, cinco), a vida dos Beauchard passa a ser regida pelas crises e pela busca de uma cura para elas, em médicos e até na macrobiótica.
"Eu tinha de fazer algo sobre essa história tão pessoal, que era como um fantasma me assombrando", explica Beauchard em entrevista à Folha, por e-mail. "Desenhá-la foi uma forma de exorcizá-la, tornou-se algo meu, que eu pude entender e aceitar."

Conflitos
Claro está que "Epiléptico" é uma obra extremamente pessoal, mas o fato de ser uma graphic novel (ou seja, resolvida com desenhos, além de texto) torna a exposição de Beauchard muito mais gritante.
A vida de seus avós, pais e irmãos (há também uma caçula, Florence, autora do prefácio) são abertas e analisadas com um olhar nada complacente, às vezes até mesmo cruel.
Não falta, no entanto, bom humor e até mesmo algo de análise social na obra. Nascido em 1959, Beauchard cresceu na França pós-Guerra da Argélia (1954-1962) e retrata o preconceito contra os muçulmanos.
"Os conflitos entre civilizações, países e pessoas sempre me interessaram. Quando crianças, fomos relegados por nossos amigos devido à doença do meu irmão, então sempre tentei entender por quê as pessoas afastam outras ."
Como desenhista, Beauchard se diz influenciado "por todo tipo de arte primitiva: africana, ameríndia, esquimó, medieval". Seu estilo, especialmente no preto-e-branco de "Epiléptico", lembra um Crumb ou um Joe Sacco menos caricatos, remetendo também, ocasionalmente, a xilogravuras.

Pekar por Picasso
Beauchard foi um dos fundadores, em 1990, da hoje célebre L'Association, editora independente formada por quadrinistas que introduziu novos formatos e temáticas na "bande dessinée" franco-belga.
"Epiléptico" foi originalmente publicado pela L'Association entre 1996 e 2003, em seis tomos, e ganhou reconhecimento crítico imediato -o britânico "The Guardian", por exemplo, comparou-o a "Harvey Pekar desenhado por Picasso".
A reação dos leitores, especialmente aqueles com algum familiar doente crônico, foi ainda mais apaixonada.
"Epilépticos e seus familiares me procuram em festivais e são bastante emotivos sobre o livro. A epilepsia é uma doença pouco conhecida e pouco retratada, as pessoas ficaram felizes por verem alguém falando sobre seus problemas."


EPILÉPTICO (VOL. 1)
Autor: David B.
Tradutora: Idalina Lopes
Editora: Conrad
Quanto: R$ 45 (176 págs.)



Texto Anterior: Editora colabora com a USP
Próximo Texto: Livros: Mostra avalia literatura produzida na internet
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.