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Francês David B. narra drama familiar na HQ "Epiléptico"
Editora Conrad lança primeiro volume do álbum premiado
MARCO AURÉLIO CANÔNICO
DA REPORTAGEM LOCAL
É sabido que autores franceses com reminiscências da infância já escreveram grandes
histórias. Agora, com a publicação de "Epiléptico", de David
B., o Brasil tem a chance de descobrir que eles também desenham boas histórias a partir
desse tipo de memória.
A premiada obra (melhor roteiro no Festival de Angoulême
de 2000), que será publicada
em três volumes, pela Conrad,
é um romance de formação que
acompanha a vida do imaginativo Pierre-François Beauchard (nome real do autor) e de
sua família.
O evento que baliza toda a
narrativa, como o pouco sutil
título brasileiro já entrega, é a
epilepsia de seu irmão mais velho, Jean-Christophe.
A partir da "ascensão do
grande mal" (o título original,
"L'Ascension du Haut Mal"),
quando o menino tinha apenas
sete anos (e o autor, cinco), a vida dos Beauchard passa a ser
regida pelas crises e pela busca
de uma cura para elas, em médicos e até na macrobiótica.
"Eu tinha de fazer algo sobre
essa história tão pessoal, que
era como um fantasma me assombrando", explica Beauchard em entrevista à Folha,
por e-mail. "Desenhá-la foi
uma forma de exorcizá-la, tornou-se algo meu, que eu pude
entender e aceitar."
Conflitos
Claro está que "Epiléptico" é
uma obra extremamente pessoal, mas o fato de ser uma graphic novel (ou seja, resolvida
com desenhos, além de texto)
torna a exposição de Beauchard muito mais gritante.
A vida de seus avós, pais e irmãos (há também uma caçula,
Florence, autora do prefácio)
são abertas e analisadas com
um olhar nada complacente, às
vezes até mesmo cruel.
Não falta, no entanto, bom
humor e até mesmo algo de
análise social na obra. Nascido
em 1959, Beauchard cresceu na
França pós-Guerra da Argélia
(1954-1962) e retrata o preconceito contra os muçulmanos.
"Os conflitos entre civilizações, países e pessoas sempre
me interessaram. Quando
crianças, fomos relegados por
nossos amigos devido à doença
do meu irmão, então sempre
tentei entender por quê as pessoas afastam outras ."
Como desenhista, Beauchard
se diz influenciado "por todo tipo de arte primitiva: africana,
ameríndia, esquimó, medieval". Seu estilo, especialmente
no preto-e-branco de "Epiléptico", lembra um Crumb ou um
Joe Sacco menos caricatos, remetendo também, ocasionalmente, a xilogravuras.
Pekar por Picasso
Beauchard foi um dos fundadores, em 1990, da hoje célebre
L'Association, editora independente formada por quadrinistas que introduziu novos
formatos e temáticas na "bande
dessinée" franco-belga.
"Epiléptico" foi originalmente publicado pela L'Association
entre 1996 e 2003, em seis tomos, e ganhou reconhecimento
crítico imediato -o britânico
"The Guardian", por exemplo,
comparou-o a "Harvey Pekar
desenhado por Picasso".
A reação dos leitores, especialmente aqueles com algum
familiar doente crônico, foi ainda mais apaixonada.
"Epilépticos e seus familiares
me procuram em festivais e são
bastante emotivos sobre o livro. A epilepsia é uma doença
pouco conhecida e pouco retratada, as pessoas ficaram felizes
por verem alguém falando sobre seus problemas."
EPILÉPTICO (VOL. 1)
Autor: David B.
Tradutora: Idalina Lopes
Editora: Conrad
Quanto: R$ 45 (176 págs.)
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