São Paulo, segunda-feira, 08 de setembro de 2008

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análise

"Não foram drogas ou álcool, foi a fúria"

PEDRO BUTCHER
CRÍTICO DA FOLHA

Foi assim que Mickey Rourke tentou explicar sua decisão de largar uma fulgurante carreira no cinema quando tinha tudo para se tornar uma espécie de Marlon Brando dos anos 80/90. "A fúria era algo que eu cultivava. Era intimidadora, e uma coisa de macho, também", disse, em 2005, ao "The Times".
Naquele ano, Rourke voltava às telas nos violentos "Sin City", de Robert Rodriguez, e "Domino", de Tony Scott. "Sin City" foi um sucesso, mas a aparência do ator estava tão modificada pelo visual estilizado do filme, que só fãs mais fiéis o notaram.
Para quem já conhecia Rourke, foi um susto vê-lo nas entrevistas promocionais de "Sin City". O que havia acontecido com seu rosto? Não era botox. Mais tarde, saberíamos que ele havia passado por quatro operações para reconstituir a cartilagem do nariz e consertar uma fratura no osso da bochecha, resultado de dezenas de lutas de boxe -carreira que ele resolveu retomar em 1993.
Ao que tudo indica, a volta por cima de Rourke virá de verdade com "The Wrestler". O filme de Darren Aronofsky, que conta justamente a história da volta por cima de um lutador, apareceu meio de surpresa na competição do Festival de Veneza e acabou saindo de lá com o Leão de Ouro. Rourke só não teria levado o prêmio de interpretação porque o regulamento impede o acúmulo de troféus nessas duas categorias.
Rourke apareceu pela primeira vez em 1979, na comédia "1941", de Spielberg. Mas chamou atenção em 1980, no neo-noir "Corpos Ardentes", de Lawrence Kasdan. Ainda em 1980, apareceu em "O Portal do Paraíso", de Michael Cimino -diretor que lhe daria os melhores papéis de sua carreira, em "O Ano do Dragão" (1985) e "Horas de Desespero" (1990).
Mas foi em 1983 que Rourke encontrou o papel capaz de o consagrar como herdeiro de Brando: o Motorcycle Boy da obra-prima "Rumble Fish", de Coppola (traduzido por aqui como "O Selvagem da Motocicleta").
O Leão de Ouro para "The Wrestler" pode até ter um significado importante para Aronofsky, que há dois anos saiu de Veneza de cabeça baixa com a péssima recepção de "Fonte da Vida" (realmente terrível). Mas o fato é que a irregular carreira do cineasta, que inclui ainda os duvidosos "Pi" (1998) e "Réquiem para um Sonho" (2000), não demonstrou envergadura para um prêmio desse peso.
O mesmo não se pode dizer de Mickey Rourke -um ator com a fúria e a elegância de um leão. Já se fala, evidentemente, em uma indicação para o Oscar, mas não é bom contar com a boa vontade da Academia em relação aos filhos malditos de Hollywood. Quem sabe?


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