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análise
"Não foram drogas ou álcool, foi a fúria"
PEDRO BUTCHER
CRÍTICO DA FOLHA
Foi assim que Mickey
Rourke tentou explicar
sua decisão de largar uma
fulgurante carreira no cinema quando tinha tudo
para se tornar uma espécie
de Marlon Brando dos
anos 80/90. "A fúria era algo que eu cultivava. Era intimidadora, e uma coisa de
macho, também", disse,
em 2005, ao "The Times".
Naquele ano, Rourke
voltava às telas nos violentos "Sin City", de Robert
Rodriguez, e "Domino", de
Tony Scott. "Sin City" foi
um sucesso, mas a aparência do ator estava tão modificada pelo visual estilizado do filme, que só fãs
mais fiéis o notaram.
Para quem já conhecia
Rourke, foi um susto vê-lo
nas entrevistas promocionais de "Sin City". O que
havia acontecido com seu
rosto? Não era botox. Mais
tarde, saberíamos que ele
havia passado por quatro
operações para reconstituir a cartilagem do nariz e
consertar uma fratura no
osso da bochecha, resultado de dezenas de lutas de
boxe -carreira que ele resolveu retomar em 1993.
Ao que tudo indica, a
volta por cima de Rourke
virá de verdade com "The
Wrestler". O filme de Darren Aronofsky, que conta
justamente a história da
volta por cima de um lutador, apareceu meio de surpresa na competição do
Festival de Veneza e acabou saindo de lá com o
Leão de Ouro. Rourke só
não teria levado o prêmio
de interpretação porque o
regulamento impede o
acúmulo de troféus nessas
duas categorias.
Rourke apareceu pela
primeira vez em 1979, na
comédia "1941", de Spielberg. Mas chamou atenção
em 1980, no neo-noir
"Corpos Ardentes", de Lawrence Kasdan. Ainda em
1980, apareceu em "O Portal do Paraíso", de Michael
Cimino -diretor que lhe
daria os melhores papéis
de sua carreira, em "O Ano
do Dragão" (1985) e "Horas de Desespero" (1990).
Mas foi em 1983 que
Rourke encontrou o papel
capaz de o consagrar como
herdeiro de Brando: o Motorcycle Boy da obra-prima "Rumble Fish", de
Coppola (traduzido por
aqui como "O Selvagem da
Motocicleta").
O Leão de Ouro para
"The Wrestler" pode até
ter um significado importante para Aronofsky, que
há dois anos saiu de Veneza de cabeça baixa com a
péssima recepção de
"Fonte da Vida" (realmente terrível). Mas o fato é
que a irregular carreira do
cineasta, que inclui ainda
os duvidosos "Pi" (1998) e
"Réquiem para um Sonho"
(2000), não demonstrou
envergadura para um prêmio desse peso.
O mesmo não se pode
dizer de Mickey Rourke
-um ator com a fúria e a
elegância de um leão. Já se
fala, evidentemente, em
uma indicação para o Oscar, mas não é bom contar
com a boa vontade da Academia em relação aos filhos malditos de Hollywood. Quem sabe?
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