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MoMA amplia acervo latino-americano
Curador do museu, Luiz Pérez-Oramas defende a saída de coleções para o exterior e fala sobre as aquisições no Brasil
A artista Mira Schendel terá retrospectiva em Nova York em 2009; em novembro, museu exibe aquisições recentes da América Latina
SILAS MARTÍ
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
À frente do cargo -criado para ele- de curador de arte latino-americana no Museum of
Modern Art (MoMA), de Nova
York, o venezuelano Luiz Pérez-Oramas afirmou à Folha
que fará no museu uma retrospectiva da artista brasileira Mira Schendel, ao lado de obras
do argentino León Ferrari, em
2009. No mês que vem, o MoMA abre uma exposição com as
principais aquisições de arte latino-americana realizadas nos
últimos cinco anos, com obras
de Lygia Clark e Hélio Oiticica.
Sobre a discussão que sucedeu a venda, há sete meses, da
coleção de Adolpho Leirner -
uma das mais importantes de
arte construtiva brasileira-
para o Museum of Fine Arts de
Houston, Oramas acrescenta
um capítulo. À época, o circuito
da arte se dividiu: houve quem
apoiasse a venda, e outros protestaram contra a ida das obras
para os EUA. Prestes a completar um ano à frente das aquisições do MoMA na América Latina, ele defende a saída das coleções para o exterior e reconhece que o mundo da arte tem
os olhos voltados para cá.
Oramas acaba de organizar
parte da Bienal do Mercosul,
em cartaz até 18 de novembro
em Porto Alegre, e falou à Folha, por telefone, de Caracas.
Leia a seguir os principais trechos da entrevista.
FOLHA - Como se justifica o interesse atual pela arte latino-americana?
LUIZ PÉREZ-ORAMAS - Isso se deve
à diversidade cada vez maior de
origem demográfica hispano-americana nos EUA, que afeta
as instituições culturais e o
meio universitário, que é a
grande locomotiva da consciência cultural do país. Tenho
a impressão de que voltamos a
viver o que se viveu nos anos
40, quando artistas latinos tinham um acesso facilitado à cena internacional. Mas acho, no
entanto, que há uma geração de
artistas, dos anos 60 e 70, que
foram ignorados pelos museus
internacionais.
FOLHA - Por que foram ignorados?
ORAMAS - A produção de artistas como Hélio Oiticica, Regina
Silveira, Artur Barrio e Cildo
Meireles não pôde ser analisada naquela época porque se impôs, nos EUA, a tirania estética
da pop art. Houve uma imposição muito clara de um cânone
estético que privilegiava as modalidades figurativas do pop.
FOLHA - Os museus estrangeiros
estão tentando preencher essas lacunas nos acervos agora?
ORAMAS - Posso falar sobre o
caso do MoMA, onde decidimos criar um fundo específico
para a aquisição de obras latino-americanas. Havia grandes
lacunas na coleção no que diz
respeito às linguagens abstratas geométricas, concretas e
neoconcretas. Nós conseguimos adquirir um importantíssimo conjunto [dessa época],
com obras de Lygia Clark, Hélio Oiticica, Aflredo Volpi,
Willys de Castro e Waltercio
Caldas.
FOLHA - O governo brasileiro, após
a venda da coleção de Adolpho Leirner, estuda como impedir a saída de
obras representativas do país. O que
o sr. acha dessa iniciativa?
ORAMAS- Não acho que seja
uma boa medida. Não faz sentido que uma coleção importante
como a de Adolpho Leirner fique numa casa privada no Brasil sem que o público possa vê-la porque as instituições brasileiras não tiveram interesse.
Sei que Leirner tentou vender a
coleção no Brasil e não houve
interesse. Não entendo, portanto, como podem fazer um
escândalo. O ponto essencial é
que as instituições têm de ser
capazes de adquirir uma coleção como essa, sobretudo no
Brasil, em que o mercado de arte movimenta cifras comparáveis às dos grandes centros.
FOLHA - Como lidar então com o
risco de esvaziar os acervos locais?
ORAMAS - A aquisição de uma
coleção impõe uma responsabilidade. Se eu adquiro uma coleção fundamental da arte de
um país, eu tenho de contribuir
para que os cidadãos desse país
tenham acesso às obras. Isso
pode ser discutido.
FOLHA - Por que o sr. trouxe para a
Bienal do Mercosul apenas artistas
venezuelanos?
ORAMAS - Nós latino-americanos nos conhecemos apenas
através do filtro que nos projeta
à ressonância internacional.
Para mim, é importante que os
latino-americanos se confrontem com seus contemporâneos, na própria diversidade
estética. Temos que evitar a deformação conceitual que implica usar uma lente de leitura
alheia às propostas artísticas
do nosso contexto.
FOLHA - Mas, ao defender a venda
das coleções, o sr. não vai contra esse argumento?
ORAMAS - Não, porque, ao mesmo tempo que defendo um conhecimento direto das cenas
artísticas, estou favorecendo
que elas tenham melhor representação internacional. Eu sou
contra uma mediação que possa deformar o conteúdo original de nossa produção, mas
acho que haverá maior conhecimento de uma obra quanto
melhor for sua representação.
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