São Paulo, quarta-feira, 08 de dezembro de 2004

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VISUAIS

Artista inaugura exposição amanhã em galeria em SP acompanhada do lançamento de livro sobre sua trajetória

Palatnik inventa uma ciência do lúdico

Fernando Donasci/Folha Imagem
O artista em frente ao aparelho cinecromático (1955-2004) que ele reconstruiu para a exposição


JULIANA MONACHESI
FREE-LANCE PARA A FOLHA

A Bienal de São Paulo de 1951 é nosso atestado maior de vanguardismo. Mas de vanguarda mesmo naquele ano foi Abraham Palatnik, que expôs seu primeiro aparelho cinecromático na Bienal sem poder participar da premiação porque a obra não se enquadrava em nenhuma das categorias da exposição. Além de questionarem a aparente indefinição do objeto, faziam outras restrições: "Um crítico na época reclamou que o trabalho só podia ser visto no escuro", conta Palatnik, que retrucou: "Mas se uma pintura só pode se vista na luz!?".
Fundador da arte tecnológica no Brasil e um dos pioneiros da arte cinética no mundo, Palatnik sempre guiou seu trabalho por uma inversão criativa das formas de pensar e observar o mundo. Aos 76 anos, o artista-inventor inaugura amanhã exposição de obras recentes na galeria Nara Roesler, com curadoria de Frederico Morais, onde será lançado "Abraham Palatnik" (Cosac Naif, 216 págs.), livro de Luiz Camillo Osório sobre sua trajetória.
Conhecido pelos aparelhos cinecromáticos, "máquinas pictóricas" que fazem as cores se movimentar dentro de caixas de luz -são dezenas de lâmpadas funcionando com base em uma combinatória que se repete em looping de cerca de 20 minutos-, e posteriormente pelos objetos cinéticos, em que evidencia o baile mecânico que nos aparelhos ficava escondido atrás de um tecido sintético, Palatnik teve uma breve passagem pela pintura e militou no produtivismo, mantendo uma fábrica de móveis com o irmão de 1954 até meados da década de 60.
Sem nunca separar a produção como artista da produção como designer industrial, as invenções estéticas das científicas (com inventos patenteados, inclusive), Palatnik não abre mão de um processo lúdico na confecção da obra, ainda que esta tenha base matemática e movimentos programados: "o resultado é sempre surpreendente para mim".
Camillo Osório afirma, no livro, que a vocação de sua obra é "dar ordem ao movimento", buscando nos materiais da natureza e do cotidiano dinâmicas visuais, revelando constantes em meio ao aparente caos. Leia a seguir trechos da entrevista dele à Folha.
 

A importância do fazer Eu faço tudo, eu não tenho auxiliar; sempre trabalhei sozinho. Recentemente parei de fazer os cortes das "Progressões" [relevos e pinturas feitas a partir da organização de fatias (de madeira, papel-cartão, tela etc.)]; eu costumava fazer em casa, com uma serra de fita, mas produzia muita poeira. Então me ocorreu que poderia fazer esse corte a laser. No resultado visual não muda nada, os dentes da serra deixavam um vestígio, mas que nunca me perturbou, o que me incomodava era a poeira.

Cinecromáticos Eu fiz 33 naquela época e agora já adicionei mais alguns, e fui desenvolvendo a técnica. Os primeiros eram muito improvisados. O primeiro nem era para ter sido exposto na Bienal, mas aconteceu. Eu sabia que tinha de ter engrenagens para movimentar, mas para acelerar as experiências, as minhas transmissões eram feitas com barbante, com motores de ventilador, eram muito improvisadas. Então o Mário Pedrosa me disse: "Vamos mandar para a Bienal" e eu respondi que não dava, com aquele barbante, e ele retrucou: "Vai ter que ir assim mesmo". Não dava tempo realmente. Então eu arrisquei. Mas deu certo, agüentou a Bienal inteira.

Relevos A presença do material cotidiano estava me fascinando no final da década de 60, e eu senti que o virtual é achado nos elementos cotidianos: no papel, na madeira. Os artistas ficam fascinados pelo papel, fazem gravuras, fazem desenhos, coisas maravilhosas, mas eu achava que o papel tinha que ter uma vida própria, devia ser ele mesmo; então eu descobri o topo do papel e comecei a dar cortes naquilo com serra de fita e programar as profundidades de cortes para conseguir alguma visão de relevo. Depois então me ocorreu que esse trabalho poderia ser feito como um sistema binário, com um par de facas gráficas, e eles hoje são feitos assim.


ABRAHAM PALATNIK. Onde: galeria Nara Roesler (av. Europa, 655, tel. 0/xx/ 11/3063-2344). Quando: abertura hoje, às 20h; de seg. a sex., das 10h às 19h; sáb., das 11h às 15h; até 31/1. Quanto: entrada franca. Preços das obras: de R$ 33 mil a R$ 120 mil.


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