São Paulo, segunda-feira, 08 de dezembro de 2008

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crítica/ cinema/"Quando Você Viu Seu Pai pela Última Vez?"

Melodrama sobre a perda da figura paterna só reúne clichê psicanalítico

CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA

"Uma história verdadeira": anuncia o letreiro antes da primeira imagem de "Quando Você Viu Seu Pai pela Última Vez?". O procedimento é apenas a primeira da longa série de obviedades que ocupará o tempo do espectador durante os 92 minutos seguintes da projeção.
Nem seria preciso alertar que se trata de história verdadeira. Talvez fosse mais pertinente ter um alerta do tipo "uma história banal", pois é disso que se trata. Nela acompanhamos os sofrimentos de Blake, um escritor de meia-idade confrontado com o anúncio da morte iminente do pai, vítima de câncer.
É hora então de Blake rememorar seu relacionamento com a figura paterna, seu permanente desajuste diante de um homem brincalhão, que preferia não levar a vida tão a sério, em contraste com o filho, mergulhado em leituras como "Os Irmãos Karamazov", de onde retira munição para sua guerrilha psíquica contra o pai.
Com doses cavalares de clichês psicanalíticos, o filme avança num território do qual, pela evidência de outros sinais, nem se preocupa se destacar. A morte de um ente querido é o mais eloqüente de seu pertencimento à zona do melodrama, com a manipulação emocional típica do gênero. Ao tema se agrega uma trilha sonora excessivamente melosa, em que violinos em profusão nos alertam sem trégua de que estamos diante de um "filme sensível".
Ou seja, isso exclui o espectador que exige estratégias de sensibilização além das óbvias. Na falta delas, resta acompanhar, sem nunca conseguir alcançar a necessária empatia, as transformações pessoais de Blake durante a adolescência.
Garoto tímido, inábil e, por conseqüência, solitário, Blake expressa aquela fase típica da vida em que parece faltar no mundo um espaço de sobrevivência imune à selva de afetos familiares que sempre parecem inadequados. Quando emerge sua sexualidade, Blake a exercita também de modo solitário, já que seu "problema" de comunicação não se reduz às dificuldades com a figura paterna.
Graças à entrada em cena de Matthew Beard, jovem ator que injeta vigor na projeção da opacidade típica da adolescência, o longa ganha um pouco de interesse em seu miolo. Como melodrama, contudo, o filme exige uma resolução que todos sabemos de antemão que deve culminar no ritual de despedida. Diante da perda do pai, Blake adulto se encontrará, ainda uma vez, sozinho, com fantasmas de outra ordem.
Com tanto peso nas costas, o filme não se decide se opta pela ironia ou se assume de vez o sentimentalismo. Termina disfarçando-se de "sensível", sem chegar a ser convincente.
A estratégia fracassa de vez em quando, na cena final, que justifica a pergunta do título, a história enfatiza seu didatismo com a mais banal das mensagens, na linha "lição de vida". Melhor o espectador se poupar de tamanho constrangimento.


QUANDO VOCÊ VIU SEU PAI PELA ÚLTIMA VEZ?
Produção: Reino Unido/Irlanda, 2007
Direção: Anand Tucker
Com: Colin Firth e Jim Broadbent
Onde: Cine Bombril
Classificação: 14 anos
Avaliação: ruim



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