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LITERATURA
Elogiado autor mineiro lança livro depois de 20 anos e deve ter material "de gaveta" publicado ainda este ano
Orlando Bastos deixa o semi-ostracismo
MARCELO PEN
CRÍTICO DA FOLHA
Orlando Bastos, 82, se desculpa
várias vezes por sua timidez. "Sou
muito acanhado para falar sobre
meus livros", diz o escritor que já
foi elogiado por Pedro Nava, Carlos Drummond de Andrade, José
Paulo Paes e foi tema de ensaio de
Malcolm Silverman, da San Diego
State University.
Sua última obra, "De Repente,
às Três da Tarde", foi lançada há
quase 20 anos. Nesse meio tempo,
discretamente como bom mineiro (o autor é de Divisa Nova, MG),
pingou contos em jornais, escreveu dois romances inéditos e organizou antologias.
A editora W11 redescobriu e
adotou o autor. Lançou "O Último Sábado", primeira reunião de
contos de Bastos desde 1984, e deve publicar seu material engavetado a partir deste ano. O escritor,
que confessa destilar em suas páginas sua "obsessão" pelas coisas
e pelo falar de Minas, trocou dois
dedos de prosa com a Folha.
Folha - Qual a razão desse hiato
de mais de 20 anos desde a publicação de seu último livro?
Orlando Bastos - Na verdade, publiquei contos na imprensa durante os anos 80. Essa ficção foi
reunida em "O Último Sábado".
Também escrevi dois romances
("O Poetastro" e "A Lamparina e
a Estrela") e organizei antologias,
sobre a Revolução Francesa, o
Egito, Israel. Tudo inédito. Só
agora uma editora se interessou.
Voltei a ficar animado.
Folha - O senhor trabalha com um
universo específico, pequenas cidades do interior de Minas Gerais.
Bastos - Tenho dificuldade com
ficção urbana. Cada autor deve
criar seu universo, e a partir dele
lidar com questões universais. As
situações e os personagens que
tomam conta de mim quando escrevo vêm do sertão mineiro.
Folha - Os enredos se baseiam em
"causos" reais?
Bastos - Pequenas conjunturas,
características e o linguajar dos
personagens podem apoiar-se em
acontecimentos e pessoas de minha infância e adolescência, mas
no geral é inventado. Às vezes a
inspiração vem nos sonhos.
Folha - Nota-se uma preocupação
com o falar dos personagens.
Bastos - Para mim, o linguajar é
elemento essencial da escrita. Às
vezes o personagem determina
sua linguagem, às vezes a linguagem dita seu comportamento.
Folha - Há influência de Guimarães Rosa na pesquisa formal da
linguagem?
Bastos - Guimarães mostrou como era possível reinventar artisticamente, poeticamente, o substrato linguístico do sertanejo. Mas
antes de ter lido várias vezes
"Grande Sertão: Veredas", na década de 30, fazia meus exercícios
literários em que entabulei experiências com a linguagem local.
Folha - Quais suas influências?
Bastos - Guimarães, Machado de
Assis, Carlos Drummond de Andrade. Fui muito influenciado por
autores portugueses como Eça de
Queiroz e os neo-realistas.
Folha - Vários de seus contos tratam da morte -morrida, matada
ou suicidada. O tema o persegue?
Bastos - Medito bastante sobre a
morte, mas nunca planejei fixar-me especialmente nela. Quando
começo um conto, muitas vezes
não sei como ele vai terminar. Esforço-me para estabelecer o primeiro parágrafo, que funciona
como um leque. Posso depois deixar-me levar. O conto é como um
rio calmo, que desliza profundamente até seu misterioso destino.
Para mim, o processo de criação é
um mistério.
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