São Paulo, terça-feira, 09 de março de 2004

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PALESTRAS

Seminário, que marca edição de obra do antropólogo francês, debate seus impactos no pensamento de hoje

USP celebra "dádivas" de Marcel Mauss

CASSIANO ELEK MACHADO
DA REPORTAGEM LOCAL

Os leitores brasileiros de ciências sociais estão diante de uma "dádiva". Um breve seminário a ser realizado amanhã e quinta-feira em São Paulo marca a reedição no país de um dos livros centrais das humanidades na segunda metade do século 20, "Sociologia e Antropologia", de Marcel Mauss.
Trabalho publicado em 1950, postumamente, o catatau organizado pelo sociólogo francês George Gurvitch reúne um conjunto de ensaios que o seu conterrâneo imprimira em revistas de ciências sociais a partir de 1902.
Primeiro livro de Mauss (1872-1950), o volume alargou o prestígio que o intelectual tinha nos círculos universitários franceses e o consagrou como um dos fundadores da antropologia moderna.
Com temas tão distintos como a função da magia nas sociedades ditas "primitivas" ou o modo como nelas se lidava com o corpo (desde as diferentes maneiras de andar até as posições sexuais), os ensaios de "Sociologia e Antropologia" ilustram a amplitude do pensamento "maussiano".
Essa elasticidade ficará visível no ciclo "Leituras de Mauss", que a editora Cosac & Naify, responsável pela publicação, realiza na USP em parceria com o departamento de antropologia e o programa de pós-graduação de antropologia social da universidade.
O primeiro dia do evento, amanhã, será dos professores de antropologia. Beatriz Perrone-Moisés, da USP, abre os trabalhos falando sobre "a noção de pessoa".
"A grande lição desse texto", opina a professora, "é a idéia de que cada cultura tem uma noção própria do que é o ser humano". "A noção de indivíduo, que costumamos considerar como universal, é recente e restrita ao ocidente", completa a tradutora de Lévi-Strauss (que assina a introdução de "Sociologia e Antropologia").
O texto mais conhecido de Mauss, "Ensaio sobre a Dádiva", será o tema de João Dal Poz, professor da Universidade Federal de Mato Grosso. Segundo a professora da USP Fernanda Peixoto, que organizou o evento com a antropóloga Florencia Ferrari (coordenadora editorial do livro), o etnólogo falará sobre leituras contemporâneas do texto, no qual "Mauss define as sociedades não ocidentais como fundamentadas na idéia de troca".
Em "Ensaio sobre a Dádiva", de 1924, que foi considerado um dos dez textos mais importantes da não-ficção no século 20 por júri do caderno Mais! em 11/4/1999, Mauss descreve a obrigatoriedade de dar e retribuir presentes em sociedades "primitivas" (o que pode ser alargado para todas as sociedades) como "fato social total".
Com esse segundo conceito, derivado das idéias de seu tio, Émile Durkheim (que faz parte do tripé elementar da sociologia, com Marx e Max Weber), Mauss pretende mostrar como nas trocas (dar, receber e retribuir) exprimem-se as instituições religiosas, jurídicas, morais, econômicas.
A terceira componente da mesa em "Leituras de Mauss" deixa um pouco esse universo de lado para concentrar-se no percurso mais pessoal do pensador. Léa Freitas Perez, professora da Universidade Federal de Minas Gerais, que está traduzindo biografia de Mauss feita por Michel Fournier, vai falar sobre seu papel como mestre de nomes tão variados como Lévi-Strauss, Michel Leiris e George Bataille, entre outros.
Bataille, ensaísta e romancista, e sua relação com Mauss serão tema ainda de palestra do segundo dia do evento, em intervenção da professora de literatura da PUC-SP Eliane Robert Moraes.
Outros dois "estranhos no ninho" antropológico completam a mesa: Heloisa Pontes, da Unicamp, que vai discutir os ensaios de Mauss sobre o corpo, e o artista Arthur Omar ("tudo o que faço é também uma certa antropologia", diz o autor do livro "Antropologia da Face Gloriosa").


LEITURAS DE MARCEL MAUSS.
Amanhã, das 17h30 às 19h30 (Fernanda Peixoto, Beatriz Perrone-Moisés, Léa Freitas Perez e João Dal Poz); quinta, das 17h30 às 19h30 (Florencia Ferrari, Eliane Robert Moraes, Heloisa Pontes e Arthur Omar). Onde: Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP -sala 24/Ciências Sociais (av. Prof. Luciano Gualberto, 315, Cidade Universitária, SP, tel. 0/xx/11/3091-3726). Grátis.



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