São Paulo, Terça-feira, 09 de Março de 1999
Texto Anterior | Índice

Morre o autor argentino Adolfo Bioy Casares

MAURÍCIO SANTANA DIAS
de Buenos Aires

Morreu ontem em uma clínica de Buenos Aires um dos maiores escritores argentinos deste século, Adolfo Bioy Casares.
Casares, que havia sido internado três vezes nos últimos dois meses com problemas cardíacos e respiratórios, será enterrado hoje no cemitério da Recoleta, mesmo bairro onde morava. O autor de "A Invenção de Morel" tinha 84 anos.
Ao lado de Ernesto Sábato (ainda vivo, com 87 anos), Julio Cortázar (1914-1984) e Jorge Luis Borges (1899-1986), Casares formou o quarteto dos maiores autores argentinos contemporâneos.
Sofisticado esteta da língua espanhola, amante dos esportes e das mulheres, eterno dândi dos salões de Buenos Aires, Bioy Casares se tornou célebre em 1940, quando publicou a novela fantástica "A Invenção de Morel", considerada pelo compatriota Jorge Luís Borges uma obra perfeita.
Desde então, Bioy Casares publicou uma grande quantidade de romances, relatos autobiográficos, novelas e contos.
Entre suas principais obras se destacam "Plano de Evasão", "O Sonho dos Heróis", Histórias Fantásticas", "Histórias de Amor" e "Histórias Desaforadas".
Pelo conjunto de sua obra, Adolfo Bioy Casares recebeu o maior prêmio literário de língua espanhola, o Prêmio Cervantes, em 1992. Recentemente, ao sair do hospital onde esteve internado, Bioy confessou: "É muito bom receber prêmios".
Sempre associado à figura de Jorge Luis Borges, 15 anos mais velho que ele e, em certo sentido, seu pai intelectual, Bioy Casares no entanto construiu uma obra própria, marcado pela estranheza e pelo humor em surdina.
"Numa época de escritores caóticos, que se vangloriam de sê-lo, Bioy é um homem clássico", o definiu o amigo Borges. A intimidade com Borges inclusive levou os dois escritores a escrever, sob os pseudônimos de H. Bustos Domecq e B. Suárez Lynch, algumas obras a quatro mãos.
Casado com a escritora Silvina Ocampo de 1940 até sua morte, em 1993, irmã de Victoria Ocampo (diretora da célebre revista literária "Sur"), Adolfo Vicente Perfecto Bioy Casares foi, junto com sua mulher, uma das principais referências culturais da Argentina a partir da década de 40.
Na casa de Adolfo e Silvina se reunia frequentemente boa parte da intelectualidade portenha e ali também surgiam as polêmicas e dissidências entre os escritores "populares" (como Roberto Arlt) e os "aristocratas" (como o próprio Bioy e Borges).
O escritor preparava o lançamento de "Conversações com Borges" para este ano, quando o amigo completaria cem anos. "Entre as décadas de 40 e 80, Borges vinha comer na minha casa quase todas as noites. Nas manhãs seguintes, eu escrevia o que havíamos conversado em meu diário. Produzi 2.000 páginas", disse à Folha Casares em setembro do ano passado.
Além do livro sobre Borges, o escritor tinha outros projetos. O narrador de inventos fantásticos, que redigia à mão e não usava computador e máquina de escrever, havia terminado recentemente um conto, estudava elaborar novas memórias e guardava na cabeça o argumento de uma novela.
Pouco antes de morrer, Bioy disse de si mesmo: "Sou um espírito melancólico, mas com temperamento extrovertido".
Os meios literários latino-americanos lamentaram a morte de Casares. O escritor mexicano Carlos Fuentes, autor de clássicos como "Gringo Velho" e "A Morte de Artêmio Cruz", disse que Casares foi um "talento sui generis".


Texto Anterior: Na noite, ela é objeto de culto
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.