São Paulo, Sexta-feira, 09 de Abril de 1999
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TEATRO
Sandro Borelli estréia hoje no Centro Cultural São Paulo a versão do espetáculo do americano Martin Sherman
Coreógrafo cria versão em dança para "Bent"

ANA FRANCISCA PONZIO
especial para a Folha

Em 1981, o diretor teatral Roberto Vignati produziu em Santo André a peça "Bent", do norte-americano Martin Sherman.
Na platéia, um jovem de 19 anos, que mais tarde se destacaria como bailarino do Balé da Cidade de São Paulo, se impressionou com a pungência da encenação e do tema, sobre a opressão nazista aos homossexuais.
Quase duas décadas depois, Sandro Borelli, o bailarino paulista que conheceu a obra de Sherman pela montagem de Vignati, torna-se o primeiro coreógrafo a criar uma versão em dança para o espetáculo "Bent".
A partir de hoje, no porão do Centro Cultural São Paulo, Borelli apresenta "Bent - O Canto Preso", depois de estreá-la com sucesso no Festival de Teatro de Curitiba, mês passado.
Na carreira de Borelli, "Bent" assinala um avanço expressivo. Autor independente que tanto cria para si mesmo quanto para companhias como o Balé da Cidade de São Paulo, ele vem perseguindo há alguns anos uma identidade estética que agora se torna mais nítida e consistente.
Produzindo com perseverança e constância, Borelli pode não agradar maiorias. Sua preferência por temas que enfocam repressão e perversões sexuais recaiu algumas vezes em literalismos rasos.

"Visceralidade"
Em "Bent", no entanto, o coreógrafo mostra que sua temática recorrente ganhou um depuramento, como se ele finalmente tivesse tomado posse do idioma que vem tentando construir.
Conduzindo-se menos pelo intelecto e mais por uma "visceralidade" sempre vinculada ao erotismo, Borelli faz de "Bent" a obra mais bem resolvida de seu repertório que, embora de difícil digestão, apresenta qualidades inegáveis que merecem atenção.
Ao som de uma esplêndida trilha sonora, de autoria de Sérgio Zurawski, "Bent" procura trazer a dupla de homossexuais que protagoniza o espetáculo, para uma dimensão atual.
Alternando violência e fragilidade, os dois personagens -solitários no texto original- ganham, na versão de Borelli, a presença, em cena, de duas mulheres.

Fluxo fértil
Na maior parte do tempo, as mulheres permanecem no fundo do palco, servindo de contraponto à dupla masculina central.
Coreograficamente, Borelli acertou em cheio no ponto ao criar um fluxo coreográfico fértil e incessante para as mulheres e uma movimentação minimalista para os homens.
Prisioneiros de uma rotina interminável e castradora, eles permanecem durante longo tempo num mesmo espaço cênico, simulando uma corrida que não leva a lugar nenhum.
A essa movimentação básica, Borelli consegue imprimir uma dramaticidade e um despojamento que sustentam a totalidade do espetáculo.
Interpretando o papel principal ao lado de Ricardo Freire, o coreógrafo coloca sua apurada técnica física a favor de um personagem construído com densidade singular.
Coeso e bem alicerçado, o "Bent" de Borelli certamente acrescenta uma versão expressiva às inúmeras produção já recebidas pela obra de Sherman.

Espetáculo: Bent - O Canto Preso Autor: Sandro Borelli Quando: de hoje a 2 de maio; quinta a sábado, às 21h30, e domingo, às 20h30) Onde: Espaço Ademar Guerra - Centro Cultural São Paulo (r. Vergueiro, 1.000, tel. 011/277-3611, São Paulo, SP) Quanto: R$ 12


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