São Paulo, quarta-feira, 09 de maio de 2007

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entrevista

Para Bastos, jovens usam TV para se exibir

ENVIADO AO RIO

O baiano Othon Bastos está ligado aos palcos de resistência nos anos 60 em Salvador, por meio do Teatro Vila Velha, do qual foi um dos idealizadores, e em São Paulo, com participações nos grupos Arena e Oficina. É nome expressivo do cinema, com atuações marcantes em obras como "Deus e o Diabo na Terra do Sol" (1964), de Glauber Rocha. Casado há 41 anos com a atriz Martha Overbeck, Bastos fala da nova peça e critica o "exibicionismo" dos artistas iniciantes da TV.

 

FOLHA - Como o sr. concebe a relação entre o general e a mulher?
OTHON BASTOS -
Na peça, o manifesto é apenas um ponto de partida para eles discutirem os 50 anos de casamento. O que aconteceu durante aquele tempo? O que foi abafado e hoje está engasgado? O importante é que descobrem que vivem um amor incondicional. Para ele, o Exército, a guerra e o país têm mais importância do que a vida a dois. De repente, sua mulher volta para a universidade, cultiva o pensamento de esquerda, vira uma "opositora" sob o mesmo teto.

FOLHA - Faz teatro hoje com a gana dos primeiros anos?
BASTOS -
Para mim, o teatro não tem época. É a minha grande escola, é o que faço com maior devoção, o que mais respeito. É onde eu comecei, de onde eu parti. Então, sempre tenho saudade do comecinho, do Paschoal Carlos Magno, da Escola de Teatro da Bahia, do Teatro Vila Velha em Salvador, que ajudei a construir. Quando eu entro no teatro, trago comigo esse mundo em que vivi. E vivo.

FOLHA - A palavra "resistência" traduz o espírito da época?
BASTOS -
Minha geração era movida pela ideologia do grupo, do coletivo. Nos anos 60, eu deixei Salvador para ir para o Oficina. O Zé Celso tinha premonições em relação ao presente histórico, como em "Na Selva das Cidades", com o AI-5 batendo na porta, a gente sofrendo.

FOLHA - Como vê o discurso do fim das ideologias?
BASTOS -
Você pode ser fundamentalista de direita, fundamentalista de esquerda. De minha parte, tomo muito cuidado, como se carregasse um novelo para soltar a linha e ter certeza do caminho de volta, não correr o risco de se perder.

FOLHA - Parece ter se tornado comum ao iniciante buscar visibilidade a qualquer custo.
BASTOS -
Isso tudo é ridículo. As pessoas gostam de ir para a televisão para se exibir. Há atores maravilhosos, belíssimos, que têm interesse em aprender, pesquisar. Mas há uma parte que [segue] a futilidade, a banalidade...

FOLHA - No cinema, o sr. procurou fugir à mitificação de alguns papéis, não foi?
BASTOS -
Não posso viver eternamente sendo o Corisco ["Deus e o Diabo...'], o Paulo Honório ["São Bernardo'] e outros trabalhos que aconteceram em momentos necessários. Acho um absurdo quando os artistas dizem "eu fiz". Fez, fez, porra, eu quero saber do que se faz agora, quero o presente.


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