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Crítica/Bienal de Veneza
Seleção de artistas evoca potência e fragilidade
Mostra principal tem conjunto de obras coeso, mas falha ao evitar controvérsias
FABIO CYPRIANO
ENVIADO ESPECIAL A VENEZA
"T téia 1", de Lygia Pape, a obra que abre
a mostra "Fazer
Mundos", de Daniel Birnbaum,
na 53ª Bienal de Veneza, resume bem tudo o que se vai ver
daí em diante: uma seleção elegante, construída de forma frágil e ao mesmo tempo potente.
A elegância da obra de Pape,
com fios dourados que constroem pilares quadrados, está
também no vídeo da italiana
Grazia Toderi, "Orbite Rosse"
(órbitas vermelhas), uma imagem ovalada com milhares de
estrelas, que parece um mapa
de uma galáxia, mas que, vista
de perto, são bombardeios de
guerra, um dos trabalhos mais
fortes da mostra.
O argentino Tomas Saraceno, em operação semelhante,
constrói uma das mais surpreendentes instalações da
Bienal, com fios que se transformam em globos, e dificultam o caminhar dos visitantes.
"Fazer Mundos" -a mostra
tem 47 línguas no título, para
tratar a arte como forma de tradução- se vale também da fragilidade, como os fios de Pape, o
que faz com que a ideia de desenho seja recorrente, como nas
obras de Marjetica Potrc, Öyvind Fahlström ou Richard
Wentworth, entre outros.
A fragilidade/potência está
também nas formas de expor,
como nas fotos de vários formatos, algumas coladas na parede com fita adesiva, na sala de
Wolfgang Tillmans, na invisibilidade da obra de Renata Lucas,
ao asfaltar partes do chão da exposição, por onde muitos caminharam sem perceber.
Mas a qualidade na seleção
dos 77 artistas de Birnbaum,
com o assistente Jochen Volz,
também se revela problemática: a delicadeza das obras evita
controvérsias, como se o fazer
mundos na arte ocorresse num
sentido paralelo ao seu contexto. "Fazer Mundos" diagnostica bem a fragilidade que o mundo enfrenta, mas fica aí.
Brasil exótico
Já as representações nacionais seguem com disparidades
gritantes. Por um lado, pavilhões como o dos Estados Unidos, que merecidamente ganhou o Leão de Ouro com Bruce Nauman, gastam milhões de dólares numa demonstração de
poder -dessa vez, os EUA além
de seu próprio espaço ocuparam outros dois na cidade.
Por outro lado, alguns pavilhões se rendem a estereótipos,
como aconteceu desta vez com
o Brasil, visto de forma exótica,
por meio da produção de Delson Uchôa e Luiz Braga, seleção
a cargo de Ivo Mesquita.
Esse "Brasil profundo", por
conta da temática regionalista
e um tanto folclórica, que parece propaganda governamental,
tornou-se ainda mais arcaico
perto de escolhas radicais, como Teresa Margolles, no México, que abordou a violência de
execuções ligadas ao narcotráfico; Elmgreen & Dragset, artistas que curaram o pavilhão nórdico e dinamarquês, recebendo
menção honrosa do júri, com
uma abordagem sarcástica sobre colecionismo; ou Shaun
Gladwell, na Austrália, levando
a cultura pop a um rigor formal
impressionante.
Mesmo assim, a diversidade
continua exercendo uma forma
de oxigenação em Veneza. E,
felizmente, Renata Lucas, Sara
Ramo, Cildo Meireles e Lygia
Pape, apresentam um Brasil
muito mais complexo que o do
pavilhão nacional.
Avaliação: bom
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