São Paulo, sábado, 09 de julho de 2005

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Escritores debatem pátria e viagens

DOS ENVIADOS ESPECIAIS A PARATI

O público aplaudiu muito, mas pôde perguntar pouco. A mediadora da última mesa de quinta-feira da Flip, a inglesa Liz Calder, selecionou apenas uma pergunta feita pela platéia ao cingalês (nascido no Sri Lanka) radicado no Canadá Michael Ondaatje e ao israelense David Grossman. Motivo: os dois se empolgaram com a conversa e começaram a trocar perguntas e impressões.
"É curioso quando você diz que me inveja por eu ter sempre morado em Jerusalém, enquanto você trocou de cidade várias vezes. Queria te contar que eu não vivo em um lugar seguro", brincou Grossman, arrancando risos de Ondaatje. "Nós [israelenses] não temos sensação de futuro. Quando leio nos jornais os planos dos Estados Unidos para a colheita de 2030, me espanto. Em Israel não falamos nem sobre os próximos dez anos, é um tabu. Israel é a terra prometida, mas é sempre prometida, nunca realizada. Queria dar motivos para que você me invejasse", disse o escritor ao colega.
Ondaatje contou como viajar ao Sri Lanka já lhe rendeu boas histórias, mas nunca realistas. Como saiu do país quando tinha nove anos, sempre tem um olhar de estranhamento em relação ao que encontra por lá. "[William] Faulkner, meu escritor preferido e minha maior influência, inventou um lugar. Eu fui ao Mississippi e não é nada daquilo que ele escreveu", disse ele, que não escapou de falar sobre "O Paciente Inglês", seu romance mais famoso, Oscar de melhor filme na adaptação de Anthony Minguella.
"Senti falta de algumas coisas [no filme], mas incentivei a equipe a buscar o próprio caminho. Reconheço que a história de um homem queimado numa cama e uma enfermeira deprimida não daria um filme eletrizante", disse.

Pimenta
Quinta-feira, por volta das 14h. Depois de uma manhã atribulada por conta dos atentados em Londres, um almoço na casa do príncipe dom João de Orleans e Bragança serviu de alívio cômico. À mesa, antes de se servir de vatapá, Salman Rushdie encheu a colher com molho de pimenta. Alguém o advertiu sobre os perigos do excesso de pimenta, mas o escritor não se fez de rogado: "Você sabe de onde eu venho?", brincou Rushdie, nascido em Bombaim, Índia, país conhecido por sua culinária picante. "Está fraquíssima", completou ele mais tarde.
Este é o segundo ano em que o almoço acontece na casa de d. João, um encontro que reúne escritores, jornalistas, agentes e editores para promover o programa de incentivo à tradução de livros brasileiros da Biblioteca Nacional, cujo fundador foi o rei dom João 6º. "Foi meu tataravô. Se eu não fizer o almoço, ele me puxa o pé à noite", brincou o príncipe.
Entre o vatapá com galinhada e a insólita sobremesa, uma mousse de caipirinha, os convidados -além de Rushdie, Liz Calder, Robert Alter etc.- percorreram com os olhos a casa, uma das jóias arquitetônicas de Parati, construída na segunda metade do séc. 17.


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