São Paulo, sábado, 09 de setembro de 2006

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Macalé prega amor e ingenuidade

Cantor, que faz shows em São Paulo hoje e amanhã, diz que distância de Caetano é antiga e lamenta ofensa a Gal Costa

Luiz Melodia e Lanny Gordin são convidados ao palco, em apresentações que ocorrem no Sesc Pinheiros baseadas em parceria com poeta


Ana Carolina Fernandes/Folha Imagem
Macalé mostra músicas do CD "Real Grandeza", que reúne suas parcerias com Waly Salomão


LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO

Não faz muito tempo, ele estava envolvido em polêmicas com Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa... Hoje, Jards Macalé, 63, se esforça para se desviar dos temas explosivos e quer o amor inscrito até na bandeira nacional, ao lado do "ordem e progresso". É sintomático, então, que ele apresente hoje e amanhã no projeto Patriamada, no Sesc Pinheiros, o show "Real Grandeza".
"Faço questão de ser ingênuo", diz, referindo-se à idéia de mexer na bandeira. "Prefiro isso do que ficar fomentando a violência, o lado brutal da vida. O amor é o lema de construção de uma civilização saudável. Hoje, a doença grassa."
Talvez Macalé nem tenha mudado muito em 40 anos de carreira. Mas pode estar dirigindo a si mesmo o grito de "Gotham City" que lhe valeu vaias no Festival Internacional da Canção de 1969: "Cuidado!".
Ele diz que já era amor o que queria expressar quando, em outro festival (o Abertura, da TV Globo, em 1975), comeu pétalas de rosa enquanto cantava "Princípio do Prazer". Mas cenas como essa lhe custaram o rótulo de maldito.
"É uma coisa idiota. Não sabiam como nos catalogar, aí botaram esse apelido. Se é para ficar ao lado de Baudelaire, Rimbaud, é uma honra. Mas isso virou uma tragédia. Eu e outros começamos a desmontar essa maldição. Eu gosto da diferença", diz ele, que prefere uma outra classificação: "Sou independente até de mim mesmo. Sou solto no mundo".
Entre os outros "malditos", estão Jorge Mautner, Itamar Assumpção e dois convidados dos shows: Lanny Gordin e Luiz Melodia. O guitarrista tocou muito com Macalé, Gal e faz aparições bissextas em palcos e estúdios. O autor de "Pérola Negra" é, para Macalé, "um dos maiores cantores do país".
"Gosto de coisas estranhas e vozes estranhas: João Gilberto, Louis Armstrong, Bola de Nieve... Melodia é um deles. Tem uma voz rascante, mas terna."

"Vapor Barato"
Acompanhados pelo grupo feminino Orquídeas do Brasil, os dois cantarão juntos "Negra Melodia", que Macalé e Waly Salomão fizeram para o amigo.
E Melodia ainda cantará outras. Mas o eixo do repertório do show é o CD "Real Grandeza", que reúne todas as parcerias de Macalé com Waly, morto em 2003.
"De todas, só uma ficou datada, e é exatamente a que se canta mais, a mais perene: "Vapor Barato". A letra diz: "Eu não preciso de muito dinheiro". Mas, infelizmente, precisamos de dinheiro para viver nesse mundo globalizado", diz.
Na hora de "Berceuse Crioulle", Macalé dá lugar no show a Maria Bethânia -ou à gravação dela no CD. Bethânia morou com Macalé nos anos 60 e sempre foi próxima. Com Caetano, o afastamento se firmou após a polêmica dos cachês no Réveillon carioca de 95. Macalé defendeu Paulinho da Viola -que ganhou menos do que os outros- e foi chamado de "canalha" por Caetano.
"O afastamento já começou quando voltamos de Londres em 72. Não foram discordâncias, mas seguimos linhas diferentes. Não gosto de falar porque, hoje, acho melhor somar do que dividir", afirma ele, tentando ser amoroso também com Gal, a quem chamou de "burrinha" em 2001. "Um telefonema [de um repórter] me pegou distraído, mas gosto muito dela. É uma das maiores, senão a maior cantora do país."
À casa de Gilberto Gil, Macalé foi no último dia 21, na reunião de artistas com Lula. Reconhece que as declarações de Wagner Tiso e Paulo Betti sobre a falta de ética na política foram infelizes, e declara o voto em Lula sem empolgação.
"A política está uma coisa suja. Olho em volta e não vejo nada. Voto no Lula por comparação. Tenho saudade do Darcy Ribeiro. Gostaria de votar nele para presidente", diz. Com saudade dos estudos de violoncelo na juventude, ele retomou as aulas, graças ao instrumento que ganhou de Lobão. Mais um item para formar uma personalidade que, assim como as de Waly e Melodia, ele acredita ser "indivisível".
"Essa é uma marca legal. Quem ouve minha voz e meu violão, que já foi chamado de surrealista e que eu já chamei de neurótico, identifica. Não é aquela história de ouvir e ficar: "parece com não sei quem, parece com um monte de gente, e no final não é nenhum desses'", afirma ele, orgulhoso.

REAL GRANDEZA
Quando:
hoje, às 21h, e amanhã, às 18h
Onde: Sesc Pinheiros (r. Paes Leme, 195, SP, tel. 0/xx/11/3095-9400)
Quanto: R$ 10 a R$ 20


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