São Paulo, domingo, 09 de setembro de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

De cafetão a literato

Sucesso em "Paraíso Tropical" como o cafajeste Jáder, Chico Diaz vive um professor de literatura no cinema

Rafael Andrade - 4.set.07/Folha Imagem
Chico Diaz no Rio, onde atua em seu 54º filme, "Saens Peña"; o ator tem outros 4 longas à espera da estréia


LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO

Ele é uma das caras mais representativas do atual cinema brasileiro. Mas precisou de 48 anos de vida e 30 de carreira para fazer na TV um personagem de grande popularidade. O que seria, para muitos, motivo de amargura é, para Chico Diaz, satisfação garantida.
"Intuí um caminho artístico que só se confirmou depois. Manter uma linha, uma coerência tem seu preço. Recusei o culto ao personalismo, o ser famoso antes da hora", avalia.
Com o sucesso em "Paraíso Tropical", parte da conta chegou. Há três semanas, na estréia da peça "Um Dia, no Verão", em que atua sua mulher, Sílvia Buarque, ele pediu aos fotógrafos que o esperassem acomodar sua mãe para então posar. Uma coluna de jornal publicou que ele mostrara seu estilo Jáder, o cafetão da novela. E confirmou que o ator não entende o que chama de "ramo das celebridades".
"São pirilampos em torno de uma luz inócua, efêmera. Já vêem o final da história, mas não têm história nenhuma", incomoda-se.
A história de Diaz tem sua trilha mais visível no cinema. No fim deste mês, ele acabará de rodar seu 54º filme, "Saens Peña", de Vinícius Reis (diretor do documentário "A Cobra Fumou"). O título é o nome da principal praça da Tijuca, tradicional bairro de classe média da zona norte carioca.
Paulo, personagem de Diaz, é um pacato professor de literatura casado com Teresa (Maria Padilha), dona de uma loja de pães de queijo. Ele é convidado a escrever um livro sobre a história da Tijuca, e seu maior desejo é conhecer o compositor Aldir Blanc, artista mais famoso do bairro.
"Fico lendo aquilo que o personagem leria para escrever o livro e fico fascinado", conta ele, que tem outros quatro longas prontos, à espera da estréia.

Cinema "espontâneo"
"Saens Peña" tem uma produção modesta, o que não é novidade para Diaz. Seu currículo inclui produções alternativas na Amazônia e, principalmente, no Nordeste.
"O cinema, mas não o oficial, o espontâneo, cuidou de mim, me alimentou. Ele me tirou de Rio e São Paulo e me fez conhecer o país inteiro. Sem "Corisco e Dadá", "Baile Perfumado", "Amarelo Manga", eu não poderia fazer Jáder", afirma, citando trabalhos nordestinos que ganharam projeção nacional.
A experiência nesses filmes, somada ao tipo físico, fez do ator a encarnação de um "homem brasileiro", como ele enxerga. Seria um homem miscigenado, um tanto bronco e pobre -ou remediado por algum tipo de expediente marginal. Por um lado, o perfil lhe agrada: "Há um heroísmo que me interessa, uma fibra que está em todas as regiões. E as histórias desse país, não só a história com "h" maiúsculo, são muito mal contadas. Não foi um caminho procurado racionalmente no início, mas depois eu botei o foco nesses personagens".
Por outro lado, sua ampla galeria de vilões é algo que preocupa: "É a visão que se tem do povo brasileiro: tem cara de pobre, põe perto da violência. Eu me preocupo com o estereótipo, sim, e evito esse tipo de personagem. Mas as conversas sofisticadas e elegantes com o Gilberto [Braga] me convenceram de que eu teria uma interlocução na novela".
Seu primeiro objetivo, diz, foi evitar uma "truculência" que aproximaria Jáder do feitor Clemente, vilãozão que fez em outra trama de Gilberto Braga, "Força de um Desejo" (1999). Em conseqüência, o segundo foi injetar "gaiatice e humor" no personagem e no ambiente que o cerca -é criação de Diaz a expressão "catiguria", usada por Bebel (Camila Pitanga).
"O Jáder cria subterfúgios para sobreviver, para se achar um herói. Não vou generalizar para o Brasil, mas ele tem muito do carioca, que se acha dono do pedaço", diz ele, que nasceu no México, filho de pai paraguaio e mãe paulista, e se radicou no Rio aos 9 anos.
Depois do estouro inicial, quando dominou a novela ao lado de Camila Pitanga e Wagner Moura, Diaz está agora no lado baixo do que classifica de "flutuação de personagens". Como o epicentro da novela é a pergunta "quem matou Taís?", e Jáder ainda não está entre os suspeitos, sua participação anda secundária. Mas existe a possibilidade de ele ir para a cadeia na condição de herói, assumindo a culpa por um assassinato cometido pela filha, Joana (Fernanda Machado).
"Eu não imaginava que um personagem como esse seria querido como está sendo. Acho que o país mudou. É um bom sinal", diz ele, reduzindo um pouco do ceticismo de seu "homem brasileiro".


Texto Anterior: Horário nobre na TV aberta
Próximo Texto: Diaz trocou arquitetura e ativismo político por teatro
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.