São Paulo, quinta-feira, 09 de outubro de 2008

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Peça de Edward Albee sonda o desejo

"A Cabra ou Quem É Sylvia?" mostra a paixão pouco usual de um arquiteto

Texto do autor de "Quem Tem Medo de Virginia Woolf?" recebe direção de Jô Soares e estréia amanhã no teatro Vivo


Rogério Cassimiro/Folha Imagem
Os atores José Wilker e Denise del Vecchio ensaiam "A Cabra ou Quem É Sylvia?', peça de Edward Albee aqui dirigida por Jô Soares

LUCAS NEVES
DA REPORTAGEM LOCAL

Martin Grey é um arquiteto cinqüentão que acaba de receber o Prêmio Pritzker (o mais importante de sua área) e comanda o projeto bilionário de construção da Cidade Mundial.
Ama a mulher, Stella, que nunca traiu. Isso até cruzar olhares com Sylvia numa colina e dar-se "um alumbramento, um êxtase, um amor sublime".
A dona da expressão "pura, confiante, tão sem malícia", bem entendido, é a personagem-título de "A Cabra ou Quem É Sylvia?", do americano Edward Albee, que ganha montagem dirigida por Jô Soares (também responsável pela adaptação) a partir de amanhã.
No texto de 2000, a seu modo cruel e irônico, o autor de "Quem Tem Medo de Virginia Woolf?" sonda os desvãos do desejo a partir da revelação gradual do affair de Martin. O primeiro a ouvir o relato é o melhor amigo do casal, o jornalista Rossi, que não consegue fazer com que o arquiteto se concentre para uma entrevista de TV. Em seguida, uma carta de Rossi coloca Stella e o filho, Billy, a par do que se passa.
Tiradas ácidas pontuam a cena em que ela confronta o marido -e destrói parte considerável da mobília da sala. "Como é que ela faz? Ela anda atrás de você balindo?", debocha. "Fala sério", pede ele, mais adiante.
"Não, o assunto é sério demais pra eu falar sério", retruca ela.
"O que faz com que a situação da história passe é o humor. Senão, fica intolerável. Albee diz que essa é a peça mais política dele, porque fala de tolerância, de até onde as pessoas aceitam ou não as coisas. Ao adaptar, minha preocupação foi sublinhar o lado universal e coloquial do texto, situar no aqui e agora", explica Jô.

Decadência
Para Denise del Vecchio, que interpreta Stella, a peça é "urgente" por "falar de uma decadência" refletida no âmbito familiar. "Martin a certa altura fala: "É o fim do fim, o fundo do poço, a descarga puxada". Essa era a imagem do Bush hoje [anteontem] na televisão: um homem derretido, sem moral nenhuma para responder aos jornalistas sobre a crise econômica. Isso está na peça. Ela é a pele da gente hoje, faz um vômito."
Parte da crítica norte-americana viu no texto de Albee certo pudor em se enfronhar nas zonas mais sombrias, abjetas da libido. O humor teria esse papel atenuante. José Wilker, o Martin da encenação atual, desafia: "Por que esse crítico não escreveu uma peça então sobre esse mergulho na alma humana? Desde "Virginia Woolf", Albee repetiu esse texto "n" vezes, investigando um tipo de relacionamento à exaustão. Uma coisa notável em autores como ele -a qual muitas vezes vemos por aqui com olhar enviesado- é que eles não abrem mão de investigar seus assuntos compulsivamente, interminavelmente. Temos aqui uma tendência à "novidadice", exatamente por que somos superficiais".


A CABRA OU QUEM É SYLVIA?
Quando: estréia amanhã, às 21h30; sex. e sáb., às 21h30; dom., às 19h; até 21/12
Onde: teatro Vivo (av. Dr. Chucri Zaidan, 860, São Paulo, tel. 0/ xx/11/ 7420-1520)
Quanto: de R$ 50 a R$ 60
Classificação indicativa: não recomendado para menores de 16 anos



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