São Paulo, sexta-feira, 09 de outubro de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Última Moda

ALCINO LEITE NETO, em Paris - ultima.moda@grupofolha.com.br

Corpo é o novo luxo em Paris

Em tempos de contenção econômica, grifes e estilistas da semana de moda francesa apostam em formas ultrassensuais

Tudo seguia sem surpresas no desfile da grife Viktor & Rolf, quando, de repente, as modelos começaram a entrar na passarela com roupas gigantescas. Eram feitas de metros e mais metros de tule compactados, parecendo blocos inteiriços de pano, enormes esculturas de tecido de formas circulares, em que os estilistas fizeram buracos oceânicos e recortes impiedosos, produzindo uma visão impressionante -tanto bela quanto absurda.
Foi uma dupla provocação da Viktor & Rolf na semana de moda de Paris, que terminou ontem. Primeiramente, por gastar tanto pano numa época de economia recessiva. Em segundo lugar, por relembrar que a moda é também feita de risco e de experimentação. "As pessoas não param de falar em cortes, em redução de orçamento... Nós pegamos isso ao pé da letra", ironizaram os estilistas.
Habitualmente mais aberta à inventividade, Paris desta vez puxou em geral o freio da criatividade descontrolada - a grife Viktor & Rolf foi exceção.
O cabresto colocado nos estilistas, porém, não implicou em timidez do design nem em perda de glamour. Ao contrário, a recessão teve até seu lado útil: trouxe o prêt-à-porter um tanto de volta à Terra. Como ocorreu em Milão, as maisons miraram realisticamente o desejo das mulheres, se esforçando por mostrar criações de apelo irresistível, embora sem o luxo e a ousadia de outros tempos.
Nem todas conseguiram. A Emmanuel Ungaro, por exemplo, que acaba de contratar a "starlette" Lindsay Lohan como consultora, afundou-se completamente no déjà-vu.
"Irresistível", em Paris, não implica em repisar lugares-comuns e evocar imagens banalizadas na TV e nas ruas. É preciso algo mais: inteligência para acrescentar -mesmo com o orçamento reduzido- novidade, interesse e alguma invenção aos looks. Tudo isso, sem jamais botar em risco o padrão de elegância exigido na fashion week mais famosa do mundo.
Foi essa alquimia que conseguiram fazer a Chanel, a Dior, a Lanvin, a Givenchy e a Balenciaga, para citar os principais desfiles exibidos nesta temporada da primavera-verão 2010.
Inspirada em temas campestres, a Chanel mostrou uma de suas coleções mais bonitas nos últimos anos. O desfile no Grand Palais foi uma verdadeira festa chique na roça, do cenário (um vasto depósito de feno) ao microshow da cantora britânica Lily Allen.
Muito idílica, de cores suaves e formas delicadas, a coleção, porém, não é nostálgica. É decididamente contemporânea, versátil e também apimentada, seguindo a palavra de ordem da temporada: é preciso ser sexy.
As grifes hesitaram em firmar imagens juvenis ou adultas das mulheres. Na Chanel, prevaleceram as primeiras. Mulheres mais fortes dominaram a Dior, que se inspirou nas "femmes fatales" do filme policial noir, e na Lanvin, com sua coleção passional e primorosa.
Apesar dessa hesitação, entre o jovial e o adulto, a semana de Paris esteve centrada na busca de uma feminilidade menos tensa e neurótica do que a proposta na estação passada.
Daí a ênfase em silhuetas soltas e diáfanas, em looks alegres feitos com tecidos vaporosos, muitas vezes transparentes (e algumas evocações do estilo hippie dos anos 70). Assim, também as calças vieram sobretudo folgadas (há exceções, como os desfiles da Balenciaga e da Balmain).
Isso não significou o desaparecimento total de formas mais estruturadas. Em contraposição à fragilidade transmitida pelas roupas leves, apareceram ombros fortes e realçados, cinturas marcadas, elementos masculinos e temas construtivos (a Givenchy fez sua bela coleção baseada em losangos e ziguezagues; Hussein Chalayan se baseou na estrutura do smoking; a Balenciaga explorou com brilho as geometrias).
Na decoração e nas estampas, a temporada é sobretudo dos motivos florais, mas as referências "étnicas" permanecem para o próximo verão -como na poética coleção de Issey Miyake. As cores dominantes foram o "nude" (pele), o bege, o rosa, o branco e o preto.
Seguindo Milão, Paris confirmou que o verão de 2010 será radicalmente sensual -com looks curtos e curtíssimos, fendas ousadas, shorts tipo calcinha, peças inspiradas em lingerie, entre outras malícias. Já que o luxo está em crise, por que não exibir esta preciosidade: o próprio corpo feminino?
com VIVIAN WHITEMAN



Texto Anterior: Música: Liam Gallagher confirma o fim do Oasis
Próximo Texto: Walter Franco busca acerto de contas histórico
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.