São Paulo, quinta-feira, 09 de novembro de 2006

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Mix Brasil destaca "marginal" da Turquia

Famoso no circuito das artes, cineasta Kutlug Ataman retrata o submundo

Em sua 14ª edição, festival acontece de amanhã até o dia 19, em São Paulo, com filmes em cinco salas, festas e atrações musicais


FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL

Apesar de cineasta, o turco Kutlug Ataman, 45, é mais conhecido entre os aficionados de arte contemporânea. Tendo participado de mostras importantes como a Documenta, de Kassel (Alemanha), a Bienal de Veneza (Itália) e a própria Bienal de São Paulo, em 2002, sua produção é marcada por dar voz a personagens muitas vezes confinados ao submundo, sejam eles homossexuais ou não.
"Os marginais são muito superiores a nós, pois são mais centrados, mais fortes, apesar da imprensa caracterizá-los sem realmente os conhecer", diz o diretor à Folha.
Sua mais recente produção para cinema, entretanto, foca um aspecto nem tanto radical: a vida de duas adolescentes em Istambul, Behiye e Handan, que possuem uma relação intensa, quase apaixonada, mas não concretizada. Trata-se de "Duas Garotas em Istambul", baseado no romance homônimo de Perihan Magden.
O filme é um dos destaques do 14º Festival Mix Brasil de Cinema e Vídeo da Diversidade Sexual, que tem início hoje, para convidados, com a exibição de "Boy Culture", de Q. Allan Brocka, no Espaço Unibanco.
A partir de amanhã e até o dia 19, o Mix se espalha por cinco locais de exibição de São Paulo e segue depois para outras três cidades, Rio, Niterói e Brasília. "Duas Garotas" será exibido na quarta, dia 15, à 1h da manhã, no Espaço Unibanco. Além de filmes, o festival conta ainda com uma programação de música em dez clubes da cidade.

Conexão
Curiosamente, foi em São Paulo que Ataman visitou pela primeira vez uma bienal, em 1994, na sua primeira vinda à cidade, das cinco que já realizou. Na época, não imaginou que, oito anos depois, estaria exposto no mesmo prédio. "Foi muito inspirador ver a Bienal", afirma o artista.
Em 1997, após ter realizado seu primeiro longa, Ataman gravou quase oito horas de depoimentos com a cantora de ópera Semiha Berksoy e as mostrou, informalmente, para a curadora Rosa Martinez e, então, foi "descoberto" para as artes plásticas. "Eu comecei a realizar "Semiha B. Unplugged" e fiz isso de uma maneira bem distinta da forma tradicional de produzir um filme. Eu não sabia realmente o que era aquilo, e, logo após o término das filmagens, meu parceiro convidou Rosa para um encontro", afirma Ataman.
Na seqüência, o artista já participou da Bienal de Istambul, que era organizada por Martinez, e entrou rápido para o circuito das mostras, o que ainda incluem as respeitadas Serpentine Gallery e Tate, ambas em Londres, onde exibiu depoimentos distintos, de terroristas a travestis. "Eu tenho a atenção voltada para pessoas que sabem transmitir como elas são. Gosto de mostrar como identidade pode ser formada através da fala", diz o diretor.
"Antes de tudo, me sinto um cineasta. O mundo das artes plásticas não mudou minha forma de trabalho, apesar de perceber que são áreas distintas. O cinema é muito mais conservador, enquanto as artes plásticas, mais livres e abertas para o contemporâneo", afirma Ataman.
Em sua nova produção, o cineasta buscou retratar o cotidiano adolescente em Istambul, mas acaba vendo similaridades com São Paulo.
"A cultura brasileira e a turca são muito parecidas. Ambas têm ainda uma grande maioria jovem -os jovens são puros e sempre têm idéias de risco. É disso que o filme trata, a partir de um argumento aparentemente banal, mas de forma romântica", conta o cineasta.
Em suas produções, Ataman sempre aborda o universo homossexual, sendo ele mesmo gay assumido desde o início de sua carreira, em 1993, com "O Rabo da Serpente".
"Sou conhecido por "abrir portas" na Turquia, tentar novas possibilidades no país e direcionar as pessoas de forma sensata. No início de minha carreira isso até trouxe dificuldades, mas hoje a sociedade turca é mais dinâmica e não sofro mais preconceitos", diz ainda o diretor.


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