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CRÍTICA
Catequismo pontua o livro e o filme
SÉRGIO DÁVILA
DA REPORTAGEM LOCAL
"As Crônicas de Nárnia: O
Leão, a Feiticeira e o Guarda-Roupa" é Hollywood juntando a fome, a vontade de comer e a
criança esfaimada. A fome é a carência absoluta de roteiros originais: mais da metade dos dez filmes com maior bilheteria de 2005
até agora são seqüências, refilmagens, adaptações de livros, quadrinhos ou videogames. A vontade de comer é o imenso público
disposto a consumir produtos já
conhecidos, que ofereçam pouco
risco, diversão segura e o efeito
comparativo "é melhor/igual/
pior que o livro/original/etc.".
Já a criança esfaimada é problema deste filme. Depois de "A Paixão de Cristo", de Mel Gibson, o
cinema mainstream acordou para
a guinada à direita que a platéia
religiosa norte-americana havia
dado sob o George Bush pós-11 de
Setembro. Era preciso um "Harry
Potter" do bem, um "Senhor dos
Anéis" não-laico. Sai da gaveta o
britânico C.S. Lewis, que aliás foi
colega de classe em Oxford de
J.R.R. Tolkien, que o achava muito carola, segundo relatos da época de amigos dos dois -Lewis, de
volta, achava Tolkien "complicado" demais, com seus atlas, suas
terras e seus nomes.
"As Crônicas de Nárnia", em
geral, nada mais são do que uma
adaptação da Bíblia, mormente o
"Novo Testamento", para crianças. Adaptação competente e
imaginosa, com elementos novos,
atraentes, mas com o livro sagrado como fonte inegável. Assim, o
leão Aslan (Liam Neeson na voz
original) é Jesus Cristo, a Feiticeira Branca é o anjo caído e assim
por diante. Nenhum problema
nem juízo de valor, fosse tudo feito às claras.
Não é. E diz o contrato social
atual que devem ser catequizados
somente os que escolhem ser, não
os que são levados às escuras.
Dito isso, do ponto de vista estritamente cinematográfico, o diretor, Andrew Adamson, em
atuação pendular depois dos
idiossincráticos "Shrek 1" e
"Shrek 2", faz um trabalho competente, ajudado pelo tripé cenário-figurino-efeitos especiais, impecável. O elenco infantil também
não decepciona, mesmo para
quem, como este crítico, acredita
que a legislação trabalhista brasileira devesse ser aplicada também
a Hollywood: criança com menos
de 14 anos não trabalha, estuda. Já
o elenco adulto é liderado pela excelente Tilda Swilton (a feiticeira)
e o versátil Jim Broadbent (como
o professor amalucado, dono da
casa em que fica o armário).
Um detalhe irrita, pelo menos
na cópia assistida pela Folha: a
dublagem brasileira é feita seguindo os cânones do padrão Jardim Botânico de sotaque, ou seja,
em carioquês. Assim, o espectador ouve meninos e meninas supostamente britânicos chiando
mais que chaleira e dizendo "míssi", em vez de "miss"...
As Crônicas de Nárnia: O Leão, a Feiticeira e o Guarda-Roupa
The Chronicles of Narnia: The Lion, the
Witch and the Wardrobe
Direção: Andrew Adamson
Produção: EUA, 2005
Com: Tilda Swinton, Jim Broadbent,
Georgie Henley, Skandar Keynes, William
Moseley, Anna Popplewell e outros
Quando: a partir de hoje, nos cines HSBC
Belas Artes, Bristol e circuito
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