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CONEXÃO POP
Cultura e violência
Pça. Roosevelt e "baixo Augusta" ganharam vida devido à sociedade, e não a ações do governo
THIAGO NEY
DA REPORTAGEM LOCAL
SERIA IRRESPONSÁVEL colocar a
culpa no poder público pelo
ocorrido com Mário Bortolotto no sábado passado. Mas o episódio joga luz sobre uma questão que
está na pauta há décadas, mas que
não recebe tratamento adequado: a
revitalização urbanística e cultural
da região central de São Paulo.
Na capa da Ilustrada de hoje, o
secretário da Cultura Carlos Augusto Calil fala sobre o assunto.
Bortolotto levou três tiros durante tentativa de assalto ao Espaço Parlapatões, na pça. Roosevelt.
Assim como a "baixa Augusta", de
uns três, quatro anos para cá, a pça.
Roosevelt tornou-se um reduto
cultural do centro de São Paulo.
Enquanto na região da Augusta o
povoamento foi motivado por clubes e casas de shows (Vegas, Studio
SP, Inferno, Outs etc.), que trouxeram na esteira restaurantes, cabeleireiros, lan houses, na Roosevelt
a ocupação deu-se com o teatro.
Em dezembro de 2000, o grupo
Os Satyros instalou-se na praça.
Hoje, são seis teatros, muitos deles
com bares anexos. O público foi à
praça, que se tornou um local de
convivência em vez de ponto de
venda e de consumo de drogas, como era conhecido anos atrás.
O que é comum à Augusta e à
Roosevelt? Ambas ganharam nova
vida devido exclusivamente à iniciativa da sociedade. Não houve
qualquer apoio ou política do governo para a ocupação das regiões.
Um projeto orçado em R$ 40 milhões destinado à reurbanização da
praça Roosevelt está parado na
Prefeitura. Não há verba para a
realização das obras. Enquanto isso, com a proibição de funcionamento dos bares durante a madrugada, a praça e sua horrenda estrutura em concreto ficam abandonadas à noite, com iluminação insuficiente e segurança inexistente.
O governo de SP prevê gastar R$
311,8 milhões com o Teatro de
Ópera e Dança, que será montado
na área batizada de Nova Luz. Não
adianta brincar com semântica;
Nova Luz ainda é Cracolândia. Será que alguém do governo tem coragem de passear pelas ruas da região durante a noite? Não vale levar escolta policial ou seguranças.
A vida noturna de São Paulo tornou-se uma das mais movimentadas do mundo. Todo final de semana, os clubes recebem DJs expressivos; há incontáveis opções de
shows; os bares multiplicam-se e
multiplicam ofertas de empregos;
há excursões vindas do interior para assistir a peças de teatro.
O que o governo faz? Incentiva
esse tipo de manifestação? Empresários e produtores culturais ouvidos por esta coluna, que preferem
o anonimato, afirmam que a burocracia da prefeitura, por exemplo,
dificulta como pode a obtenção de
alvarás. Assim, fica mais fácil para
fiscais corruptos extorquirem dinheiro dos estabelecimentos por
motivos os mais variados. Interditam-se casas noturnas. Obrigam-se os bares a fechar as portas. Todos sabem o que ocorre. O governo
sabe. Mas não toma atitude.
thiago.ney@uol.com.br
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