São Paulo, sábado, 10 de abril de 2004

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BIENAL DO LIVRO

Adam Thirlwell conta que leitura "política" de seu livro o surpreendeu e comenta de Aids a Machado de Assis

"Romance é recheado de sexo", afirma autor

DA REPORTAGEM LOCAL

Leia a seguir mais trechos da entrevista com o escritor inglês Adam Thirlwell, autor de "Política", nos quais ele fala sobre política, sexo e... Machado de Assis. (CASSIANO ELEK MACHADO)

 

Folha - O livro se chama "Política", mas trata de amor e sexo. Você usa o termo "política" no sentido do "teatro do poder", assim como se pode falar em amor ou sexo como um teatro?
Adam Thirlwell -
Acho que o título pode ser visto de duas maneiras. O primeiro brinca com a idéia de que, apesar de não parecer inicialmente ser um livro sobre política, o livro tem também um bocado de política dentro dele. E a forma do romance, o comportamento dos personagens, é espelhada em aspectos políticos. Por outro lado, é uma brincadeira. Não há no livro muito do que as pessoas imaginam como política.

Folha - Você menciona o Marquês de Sade como alguém que fazia excentricidades políticas. Você também busca essa excentricidade?
Thirlwell -
Não. Acho que os romances de Sade são prejudicados pelo excesso de teorias de seu autor, pelo fato de que nada que acontece neles é fruto do desejo dos personagens, mas sim do desejo de Sade de provar, com cada ação, algum de seus pontos políticos. Não queria que meu livro fosse guiado por digressões políticas. Para mim a parte mais importante é o enredo geral, o lado mais comum do romance. As digressões uso só para mostrar como é problemático tentar fazer digressões.

Folha - Mas como você lida com essa leitura política de seu livro?
Thirlwell -
Ela é mais freqüente do que eu imaginaria. Os críticos em geral querem ver no livro uma obra totalmente política, uma alegoria de teorias ou da situação política. Eu buscava algo mais descompromissado, ainda que às vezes as analogias funcionem.

Folha - O narrador afirma ao longo do livro que o romance não é sobre sexo, que é sobre generosidade e afins. Aqui no Brasil "Política" está saindo em uma coleção de livros "safados", que terá Henry Miller, Philip Roth, entre outros. O que você acha dessa companhia?
Adam Thirlwell -
Existem diferenças de como eu penso no meu livro e como as editoras querem vendê-lo (risos). Bem, é verdade que ao negar o tempo todo que o livro é sobre sexo estou brincando também. O romance é, obviamente, recheado de sexo. São comentários meio ingênuos, esses do narrador. É claro que o livro é sobre sexo. Mas é também sobre bondade, sobre se cada um deve ser altruísta ou pensar só em si.

Folha - Você descreve inúmeras cenas de sexo, de personagens com diferentes parceiros, e não menciona nunca camisinhas e Aids. Você não o fez intencionalmente?
Thirlwell -
Bem, eu cito as pílulas anticoncepcionais. É a única proteção dos personagens. Acho que isso é muito realista para relacionamentos. Talvez nas primeiras relações deles seria mais normal que usassem camisinha. Mas é um ponto interessante. Ninguém havia me perguntado sobre isso. É, talvez eu devesse...

Folha - Qual sua opinião sobre o grupo de autores que o acompanha na lista da "Granta"?
Thirlwell -
Não sei, muitos dos escritores ali só publicaram um ou dois livros. É difícil saber como é um escritor com tão pouco. Além disso, tento não ler autores jovens. Prefiro os mortos, com os quais não estou competindo.

Folha - Que mortos?
Thirlwell -
Flaubert, Stendhal, Machado de Assis.

Folha - Machado?
Thirlwell -
É, adoro "Dom Casmurro", um dos melhores livros que li. Tento fazer algo semelhante a isso. Ele é muito elegante.


POLÍTICA. Autor: Adam Thirlwell. Tradução: José Antonio Arantes. Editora: Companhia das Letras. Quanto: R$ 39,50.


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