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GUERRA NOS BÁLCÃS
O ex-líder da banda iugoslava Bajaga & Instruktori, atualmente solo, fala sobre a situação de seu país
"Amo o basquete americano", diz Cucik
PAULO VIEIRA
especial para a Folha
As bombas da Otan sobre a Iugoslávia têm servido, até aqui, para
pelo menos duas coisas. Unir a população em torno do presidente
Slobodan Milosevic e movimentar
a cena rock local. Dejan Cucik, 39,
foi um dos primeiros a se apresentar nos shows ao ar livre que acontecem em Belgrado, capital iugoslava, desde o início dos ataques.
Embora jamais tenha votado em
Milosevic, Cucik vê Kossovo como
""berço do país" e crê que os EUA
estão se tornando ""uma máquina
de guerra".
Cucik tornou-se popular na Iugoslávia pré-dissolução dos anos
80 ao integrar a banda Bajaga &
Instruktori. Em 87, lançou-se em
carreira solo, gravando até aqui sete discos. Cucik diz que o Bajaga
vendia em média 300 mil cópias a
cada disco, mas isso faz parte de
uma ""Iugoslávia rica", que ficou
há tempos para trás. ""Estou feliz se
vender 10 mil, 20 mil cópias hoje
em dia". Cucik falou à Folha, por
e-mail, de Belgrado.
Folha - Como é viver num país
em guerra?
Dejan Cucik - Eu não consigo estar bem em outro lugar, mesmo
tendo amigos e parentes pelo
mundo. Por isso, fico em Belgrado.
Estamos seguros, mas cada dia é
diferente. Sou pai de um menino
de 2 anos, e minha mulher está grávida de seis meses, mas vamos ficar. Esses dias houve mortes em
Aleksinac, onde minha mulher
tem parentes muito próximos. A
Otan se desculpou pelos erros de
alvo. Essas desculpas nos confortaram muito (risos).
Folha - O sr. colaborou nos
show/manifestos contra a Otan,
em Belgrado. O sentimento aí é diferente de um show comum?
Cucik - Eu toquei justamente no
primeiro dia. Há duas coisas boas
sobre esses concertos: a primeira é
que as pessoas melhoram de humor, o que aliás é bastante sérvio; a
outra é possibilitar uma chance de
desabafar. Mas há também um aspecto negativo: alguns usaram esses shows para se promover.
Folha - Qual a sua opinião sobre
Slobodan Milosevic e a ocupação
militar de Kossovo?
Cucik - Eu nunca votei nele. Fui,
inclusive, ativo em manifestações
contra Milosevic há alguns anos.
Mas quando as bombas começaram a cair, foi o fim dos demais políticos. Milosevic foi democraticamente eleito, e meu país está agora
sob agressão.
Sobre Kossovo, lá é o berço de
nosso país, e toquei lá várias vezes.
Pode-se dizer que nos últimos 50
anos houve uma limpeza étnica silenciosa, com a população sérvia
caindo de 50% para 10% da população da província.
Ninguém fala que as lideranças
albanesas mantêm seu povo de
maneira a ser facilmente manipulado. Conseguem isso com pouca
educação e estimulando a fertilidade. Creia-me, não sou vítima da
propaganda oficial. Uma das coisas boas de crescer sob o comunismo é que você aprende a não confiar em ninguém, especialmente na
TV estatal.
Folha - O sr. acredita no surgimento de novos líderes oposicionistas na Iugoslávia após os bombardeios?
Cucik - É uma possibilidade.
Acho que é essa uma das grandes
metas da política americana. Criar
pelo mundo países supostamente
democráticos, países onde as pessoas possam ser manipuladas e
controladas por desejos de luxúria
e consumismo.
Folha - Por que a Iugoslávia tem
uma cena pop importante?
Cucik - Nós somos um país de
"crossroads" (rotas de travessia).
O rock sempre foi uma forma
eclética de arte, e a nossa mentalidade aberta a diferentes influências é boa para o rock.
Folha - A guerra mudou seu sentimento em relação aos norte-americanos, mesmo aqueles que
o sr. admira ou admirava?
Cucik - Eu não sei ainda... Você
não pode escapar à idéia de que a
ignorância geral do povo americano é que torna possível que os
EUA se transformem numa perigosa e incontrolável máquina de
guerra. Por outro lado, eu ainda
gosto do rock americano, amo o
basquete americano e, para falar a
verdade, estou tomando uma Coca-Cola exatamente agora... Mas
o cinema... Eu não consigo mais
ver aquele lixo. Eu lembro de
meus pais falando de como suas
vidas mudaram nos anos 50,
quando os filmes americanos começaram a ser exibidos por aqui.
Eram filmes cheios de alegria e
otimismo. Agora, essa produção
de Hollywood cheia de destruição
a cada quadro... Não sei, talvez eu
não entenda muito bem.
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