São Paulo, Segunda-feira, 10 de Julho de 2000
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RELÂMPAGOS

Vias aéreas

JOÃO GILBERTO NOLL

Quando ela entrou no recinto de olhares pedregosos, no interior daquele prédio escuro e maltratado, parecendo uma loja de quinquilharias, percebeu que caíra numa séria cilada. O vivo no ambiente era apenas o movimento custoso de algumas pálpebras. Tinha o bebê que vez ou outra demonstrava a dissonância aflita da respiração. Tudo úmido. Ela, que tanto cobiçava acordar um dia em outra circunstância que não a sua de costume, agora não podia evitar a memória clara de sua cozinha matutina, dois ou três farelos no chão. De joelhos, catava um a um. Então arrancou o gelado bebê do recôncavo trevoso. Fugiu. No claro, como que sugou a face inteira da criança. Sentiu na boca o insuportável líquido pastoso. E viu que o bebê respirava livre enfim, adormecia.



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