São Paulo, sábado, 10 de julho de 2010

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CRÍTICA ROMANCE

Autora narra racismo com doses de ousadia e conformismo

BIA ABRAMO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

De que matéria são feitos os best-sellers?
O livro que capturaa imaginação de milhões de pessoas sempre parece conter uma espécie de mistério: por que a leitura desta obra se torna obrigatória, enquanto outros tantos livros não merecem nem mesmo um olhar nas livrarias?
"To Kill a Mockinbird", ou "O Sol É para Todos", responde ao menos à primeira vista essa pergunta: trata-se de capturar uma questão latente no imaginário coletivo de uma época e processá-la com doses bem equilibradas de ousadia e conformismo.
Nos anos 60, no bojo da luta pelos direitos civis, a notoriedade do único romance de Harper Lee se fez com sua abordagem a um tempo corajosa e cautelosa do racismo.
Voltando para o Alabama dos anos 30, remonta a história do julgamento de um estupro de uma mulher branca atribuído a um negro.
No centro, Atticus Finch, um advogado reto e habilidoso com as palavras, defenderá Tom Robinson e terá de dobrar suas noções de justiça aos preconceitos locais.
Caiu como luva para certa sensibilidade que se formava em torno da questão racial e que ia ganhando espaço no debate público.
Os abusos e as iniquidades, prudentemente localizadas no Sul atrasado e devastado pela miséria do período da Depressão, deveriam ser corrigidos pela aplicação correta da lei e pela ampliação do ideal democrático (daí o título em português).
A ótima versão cinematográfica do romance, de 1962, traz um Atticus Finch, interpretado por Gregory Peck, com estatura daquele herói típico do cinema norte-americano: o homem comum capaz de lutar individual e solitariamente contra tudo e contra todos.

EDUCAÇÃO MORAL
Se a coragem do romance continua sendo encantadora, na mesma medida pode-se pensar que a cautela e prudência são também decisivas para o seu sucesso.
Construída a partir das reminiscências argutas da filha mais nova de Atticus, a narrativa acaba por se constituir numa educação moral e cívica da conformidade.
Afinal, qualquer discussão mais ampla sobre racismo, nos EUA, não comportava muita reflexão histórica -a desigualdade entre negros e brancos estava lá desde sempre; tratava-se apenas de aparar os excessos e se acautelar contra o pior.
Da questão racial em "O Sol É Para Todos" à sexualidade adolescente na saga "Crepúsculo", o best-seller parece ser uma espécie de pedagogia do conformismo.


O SOL É PARA TODOS

AUTORA Harper Lee
TRADUÇÃO Maria Apparecida Rego
EDITORA José Olympio
QUANTO R$ 40 (364 págs.)
AVALIAÇÃO bom



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