CRÍTICO DA FOLHA

Steven Zaillian não teve muitas oportunidades na direção, o que talvez se explique pelo fato de seu trabalho de estréia, "Lances Inocentes" (Telecine Emotion, 21h), fazer sentido.
Lá está a história de um jovem gênio do xadrez, cujo pai, como todos os pais, quer ver o garoto nas nuvens, e cujo mestre quer que ele copie de Bobby Fischer, o antigo campeão mundial, o espírito de competição elevado a uma potência demencial.
Ou seja, de inocentes esses lances não têm nada. A circunstância de serem executados por crianças enfatiza, no entanto, aquilo que o comportamento humano tem de mais destrutivo.
Estar em um mundo onde se vê o próximo como inimigo (ou concorrente) talvez seja nosso destino.
Sorrir por isso, não necessariamente.
(INÁCIO ARAUJO)

DOCUMENTÁRIO

Especial traz expressões da poesia de Piva

DA REDAÇÃO

"Para ser poeta tem de ser como os coribantes que, quando recebem o deus, quando incorporam o deus, sacodem a cabeça para frente e para trás." Com essa citação aos sacerdotes da deusa Cibele na Frígia (Ásia antiga), o poeta "marginal" Roberto Piva dá início ao documentário "Assombração Urbana com Roberto Piva", de Valesca Dios, que a TV Cultura exibe na próxima segunda, às 6h, e na sexta (dia 17), à 0h15.
Dos coribantes, Piva segue para duas definições de sua arte que lhe são caras: "Poesia é a subversão do corpo", de Octavio Paz (1914-1998), e "A poesia é a mais fascinante orgia ao alcance do homem", de André Breton (1896-1966). Em menos de um minuto, estão colocadas as principais idéias que norteiam a obra poética de Piva: o corpo, a orgia e a transcendência.
O eu do poeta é sempre um eu-corpo, que participa e interfere no presente e que se modifica pela sua experimentação física, seja no sexo ou no convívio na cidade (quase sempre São Paulo).
A orgia é muito menos um tema relacionado com o corpo e com o homo e pan-erotismo do poeta do que com a festa de referências humanistas que perpassa os poemas. É uma orgia de história, que traz para o presente do poema toda uma tradição cultural humanista, num clima, este sim, orgiástico, de ninguém é de ninguém.
Já a transcendência é marcada pela busca do êxtase, que pode vir tanto da euforia do álcool quanto pelas revelações dos alucinógenos, em um plano, e pelas experiências místicas do xamanismo, em outro.
Ao longo do filme, essas três expressões da poesia de Piva são esmiuçadas na voz do próprio autor e nos depoimentos do diretor de teatro Zé Celso Martinez Corrêa, do crítico literário Davi Arrigucci Jr., do escritor João Silvério Trevisan e dos poetas Cláudio Willer, Rodrigo de Haro e Fernando de Franceschi.
(GUILHERME WERNECK)