São Paulo, quarta-feira, 10 de outubro de 2001

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"ERAM TODOS TÃO JOVENS"

Sara e Gerald Murphy ganham biografia

Livro retrata jovem casal que representava o glamour

MARCELO PEN
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Alguns passam à história como artistas, outros como modelos. Mesmo assim, não devemos desmerecer os segundos diante da importância dos primeiros. Que seria de Da Vinci sem a senhora Francesco del Giocondo, de Dante sem Beatriz, de Vinicius sem Helô Pinheiro? A humanidade com certeza perderia a "Mona Lisa", boa parte da "Divina Comédia" e, como sabemos, a garota de Ipanema.
Sara e Gerald Murphy, os biografados da jornalista Amanda Vaill em "Eram Todos Tão Jovens", serviram de inspiração para alguns dos maiores nomes da arte do século 20. Fernand Léger pintou o casal, Picasso desenhou Sara, Hemingway serviu-se deles em "As Neves do Kilimanjaro", e John dos Passos, em "O Grande Capital". Mas o retrato mais perfeito dos dois está em "Suave É a Noite", de Scott Fitzgerald.
Sara e Gerald são a matriz dos protagonistas Dick e Nicole. Não diretamente, é claro. Gerald não era psiquiatra nem Sara esquizofrênica. Quem terminou no hospício foi Zelda, mulher de Scott. Mas os dois estão ali em tudo o que representa glamour, sofisticação, dinheiro e beleza.
Eles tinham muito dinheiro e ambição artística. Deixaram o provincianismo americano para se unir à nata da vanguarda francesa nos anos 20. Participaram da confecção dos cenários para os Ballets Russos, de Diaghilev e Stravinsky. Gerald, que pintava gigantescos quadros futuristas, ainda soltou algum a Diaghilev.
Mas a maior invenção do casal, na época, foi a da moda do veraneio na Côte d'Azur. Antes deles, chegando o verão, os turistas fugiam, e os hotéis ficavam às moscas. Gerald comprou uma casa em Cap d'Antibes. Chamou-a de Villa America. Seus vizinhos eram Cole e Linda Porter. A Riviera Francesa nunca mais foi a mesma.
Um dos primeiros hóspedes da Villa America foi Picasso, que, dizem, ficou caído por Sara. Fez dela dois desenhos. Num deles, Sara está vestida. Em outro, porta um delicado colar de pérolas. E mais nada. As pérolas eram a marca de Sara quando se tostava ao sol.
Sara fustigou outros corações, de Fitzgerald a Hemingway. Scott já era um escritor consagrado, mas Hemingway, que ainda não tinha publicado seu primeiro romance, transbordava charme. Convenceu o casal a segui-lo às touradas em Pamplona. Os Murphy ficaram encantados. Sobretudo Sara.
Fitzgerald espicaçava Gerald, cuja ambiguidade sexual era assunto melindroso, sendo grosseiro com os convidados homossexuais. Já Gertrude Stein se referiu a eles como a "geração perdida", expressão que se estendia a Archibald MacLeish, John dos Passos e Dorothy Parker.
Gerald Murphy deixou uma prova de bom gosto, desenhando uma bolsa feminina para a Mark Cross. É a famosa frasqueira de onde Grace Kelly tira suas pantufas e camisola quando vai dormir com James Stewart, em "Janela Indiscreta".


Eram Todos Tão Jovens
Everybody Was So Young: Gerald and Sara Murphy, a Lost Generation Love Story    
Autora: Amanda Vaill
Editora: Best Seller
Tradutor: Luiz A. de Oliveira Araújo
Quanto : R$ 46 (456 págs.)




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