São Paulo, sexta-feira, 10 de novembro de 2000

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Shaft

Divulgação
O detetive Shaft em ação



Sequência do seriado de 1971, que estréia hoje no Brasil, traz detetive em versão violenta e vingativa


MILLY LACOMBE
ESPECIAL PARA A FOLHA, EM LOS ANGELES

Samuel Leroy Jackson se lembra com clareza do dia em que entrou em uma sala de cinema, no verão de 1971, para assistir a "Shaft", então estrelado pelo galã negro Richard Roundtree.
Era a primeira vez que Hollywood tirava um ator negro do plano de fundo para trazê-lo ao primeiro, como herói. E o jovem Samuel ficou em êxtase. "Foi ali que percebi que pessoas como eu poderiam eventualmente ser o mocinho", disse Samuel em entrevista à Folha, em Los Angeles. "Minha vida mudou no instante em que eu conheci Shaft, aquele negro que se vestia elegantemente, era viril, corajoso e justo."
Foi com surpresa que, quase 30 anos depois, o mesmo Samuel recebeu o roteiro de "Shaft", o novo Shaft, em sua mesa.
"Em princípio, achei que fazer um remake do filme seria bobagem. Não precisávamos de um outro Shaft, o primeiro tinha sido suficiente." Mas, ao saber que o novo filme não seria um remake, mas sim uma continuação, ele aceitou encarnar o Shaft do milênio, interpretando agora o sobrinho do original.
Jackson, que há exatos dez anos venceu o vício de cocaína, só gostaria que esse novo Shaft fosse ativo sexualmente. "Porque, como diz a trilha sonora do filme, Shaft é uma máquina de sexo para todas as mulheres."
O CD com a trilha foi lançado em setembro no Brasil pela BMG (R$ 20, em média).
Jackson, que foi indicado em 94 ao Oscar de melhor ator por "Pulp Fiction" e é apaixonado pelo teatro -já interpretou peças na Broadway e off-Broadway-, quando tem um tempo livre, gosta de jogar golfe com seu amigo Michael Jordan. Leia abaixo trechos da entrevista à Folha.

Folha - Quem é Shaft no ano 2000?
Samuel L. Jackson -
Deixa eu dizer quem foi Shaft. Shaft foi um ícone, o herói que nos ajudou a vencer a barreira branca de Hollywood, um dos detonadores da "blaxploitation" (exploração de temas negros em Hollywood). Passamos dessa fase, e o Shaft de hoje, apesar de reprimido sexualmente e até por causa dessa repressão, é mais violento, mais vingativo do que o anterior. Se ele tivesse tido direito a cenas de sexo, talvez não fosse assim tão sanguinário (rindo).

Folha - Ainda existe racismo em Hollywood?
Jackson -
Claro que sim. Quando entro em uma sala para fazer um teste, a primeira coisa que vêem é que sou negro. Poucos atores conseguiram vencer a barreira da cor em Hollywood. Na verdade, acho que apenas Eddie Murphy conseguiu. Hoje, ele é apenas um sujeito engraçado. Muitas vezes, para conseguir o papel, tenho de convencer o diretor ou o produtor de que o protagonista daquele filme poderia ser negro, uma idéia que nem sequer tinha passado pela cabeça deles.

Folha - Ganhando mais de US$ 5 milhões por filme, por que você continua a trabalhar sem parar, fazendo três, quatro filmes por ano?
Jackson -
Tenho um código genético propenso a vícios, ao exagero. Foi assim com a cocaína e, hoje, é assim com o trabalho. Mas a verdade é que eu gosto do que faço e trabalho com prazer. Por exemplo, não poderia deixar escapar a chance de estar em "Star Wars" nem que fosse meu sexto filme do ano.

Folha - Você, pelo que consta, aprendeu a interpretar sob influência de algum estimulante. Com a droga tão incorporada à sua vida profissional, quando você decidiu que era hora de parar?
Jackson -
Eu cheirei tanto pó que hoje tenho um rombo no meu nariz, que eu não pretendo consertar, porque ele me faz lembrar dessa época para a qual não quero voltar. Porque nem com um rombo no nariz eu achei que era hora de parar. Eu simplesmente comecei a fumar o pó. Há dez anos, com medo de morrer e de não ver minha filha crescer, decidi me internar em uma clínica e me livrar do vício. Todos os dias, quando acordo, agradeço a Deus por estar sóbrio e peço para não beber nem cheirar nas próximas 24 horas.

Folha - O que mudou depois disso?
Jackson -
Eu conheci um Samuel que sabia atuar sóbrio e de forma menos embaçada, mais limpa e, por isso, mais profunda. Minha carreira decolou, e o vôo ganhou novos ares depois de "Pulp Fiction", de Quentin Tarantino, e "Duro de Matar 3", de John McTiernan. O resto é história.


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