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São Paulo, segunda-feira, 10 de novembro de 2003

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EVENTO

Programação abre ao público amanhã, com palestra de Moacyr Scliar sobre o humor; quarta é a vez de Herchcovitch

Ciclo analisa influência judaica na cultura

MÁRVIO DOS ANJOS
DA REDAÇÃO

Com a proposta de divulgar a cultura judaica para o grande público, o Centro da Cultura Judaica - Casa de Cultura de Israel começa hoje, com uma recepção para convidados, o primeiro Ciclo Multicultural Judaico-Brasileiro.
Com uma programação que vai até 24 de novembro e que inclui o 7º Festival de Cinema Judaico, em parceria com A Hebraica, o centro escalou personalidades com destaque nas artes para a curadoria de debates. Nomes como o escritor e colunista da Folha Moacyr Scliar, o estilista Alexandre Herchcovitch, o cineasta Hector Babenco, o chef Breno Lerner e o maestro John Neschling comandarão painéis sobre as influências da cultura judaica em seus ofícios.
"A idéia é trazer o grande público para dentro da comunidade", diz a idealizadora e produtora executiva, Yael Steiner, 29.
O evento abre para o público amanhã, às 19h30, com palestra de Scliar, 66, sobre o humor na literatura judaica moderna, e leituras de textos. Leia os principais trechos da entrevista com o autor sobre o assunto.

Folha - O que é exatamente o humor judaico?
Moacyr Scliar -
É um humor muito peculiar, com alguma melancolia. Não é um humor feito para provocar o riso franco, a gargalhada, e sim o sorriso. É também um humor filosófico, que representa uma defesa emocional contra o desespero de um povo acostumado à perseguição.

Folha - Esse humor sempre foi característica do povo judeu?
Scliar -
Na verdade, ele é uma característica de um período na história judaica, a partir do fim do século 19, quando os judeus começam a ser mais perseguidos. Ele não existia, por exemplo, nos tempos bíblicos.

Folha - Quem são os grandes expoentes desse humor?
Scliar -
Bem, primeiro é preciso dizer que se trata de um humor folclórico, de incontáveis historietas. Uma vez eu organizei uma antologia de humor judaico ["Do Éden ao Divã", ed. Shalom] e fiquei surpreso com a quantidade de histórias. Devo ter lido umas 2.000 ou 3.000 historietas.
Existe também uma versão literária, em que o maior expoente é [o ucraniano] Scholem Aleichem [1859-1916], que é um pseudônimo, pois significa "a paz seja convosco". Esse autor do século 19 retratou a vida nas aldeias judaicas da Europa Oriental com uma genialidade comparável à de Mark Twain [1835-1910]. No Brasil, poderíamos dizer que ele tem um toque de Machado de Assis.
E hoje, nos EUA, esse humor é representado pelo escritor Philip Roth e pelo diretor Woody Allen.

Folha - E no Brasil, quem seguiria esse tipo de humor?
Scliar -
Vou lhe dizer uma coisa: para quem tem sensibilidade, é bastante perceptível a influência desse humor em Clarice Lispector [1920-1977], ainda que a temática dela não seja judaica.

Folha - Onde o humor judaico é mais perceptível na sua obra?
Scliar -
Em toda ela, mas acho que ele aparece com mais clareza em "Exército de Um Homem Só" e em "O Centauro no Jardim". Não consigo escrever sem essa referência de humor que vem desde o berço. Meus pais, imigrantes da Europa Oriental, eram ótimos contadores dessas historinhas.

Folha - E entre autores de origem não-judaica, em quem o senhor nota a influência desse humor?
Scliar -
O Luis Fernando Verissimo, de quem eu costumo dizer que é o nosso Woody Allen mais gordinho e mais talentoso (risos).



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