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Periferia renova samba de São Paulo
Movimento surgiu no fim dos anos 90, com foco no samba de raiz, na formação de novos talentos e novas composições
Encontro Mutirão do Samba impulsiona novos sambistas, como Douglas Germano, Adriana Moreira
e Marquinho Dikuã
THIAGO MENDONÇA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
A tarde chuvosa de anteontem não impediu a descontração do encontro, que começou
com atraso devido aos alagamentos. Na mesa do bar estavam representantes de algumas das comunidades de samba de São Paulo, movimento
que tomou conta das periferias.
Presentes Selito SD, do Projeto Nosso Samba de Osasco,
T.Kaçula, da Rua do Samba
Paulista, Babalu, do Samba da
Laje, Marquinhos Dikuã, do
Samba de Todos os Tempos,
Marquinhos Jaca, da Vai-Vai, e
Caio Prado, ex-Projeto Nosso
Samba. Adriana Moreira, uma
das belas vozes desta geração
de sambistas, avisa que ela e
Douglas Germano não conseguirão vir por conta da chuva.
Entre sambas e risadas, eles
contam a história do novo samba paulista.
Nos anos 90, surgiram os primeiros sinais de saturação do
pagode comercial. Ao mesmo
tempo, as escolas de samba vinham deixando de agregar
compositores para se tornarem
um triste pastiche dos desfiles
cariocas. Não havia mais espaços para os compositores. Alguns anunciaram a morte do
samba, mas ele sobreviveu tímida e desorganizadamente
nos quintais e botecos da periferia paulistana.
Em 1997, surgiu o Mutirão do
Samba, um encontro de sambistas, visando o culto ao samba
de raiz, a formação de novos talentos e a exibição de novos
sambas. Douglas, um dos fundadores, via ali um estímulo à
criação. "O Mutirão nasceu
com a vontade de registrar nossa própria história. Neste grupo
de 32 pessoas havia compositores, percussionistas de escola
de samba e de botequim, instrumentistas, cantores."
Surgia algo novo em São Paulo. "Uma roda com composições próprias, que era ao mesmo tempo um encontro e um
espaço de formação", lembra
Adriana. O mutirão durou três
anos e dali saiu toda uma nova
geração de compositores e músicos, alguns com trabalhos autorais, como Adriana, Douglas e
Kiko Dinucci.
A experiência do Mutirão
serviu como inspiração para a
formação de uma série de novas experiências. Projeto Nosso
Samba, Samba da Vela, Samba
Autêntico, Samba da Laje,
Samba de Todos os Tempos,
entre dezenas de comunidades.
"Surgiu uma série desses núcleos, a partir do samba tradicional", conta Selito. "Ninguém
aguentava mais aquela mesmice dos anos 90", diz Kaçula. "A
vulgarização das letras a repetição das fórmulas de sucesso."
As comunidades são um culto às batucadas, uma retomada
do samba a partir da tradição,
que gerou uma nova sonoridade paulistana.
O movimento desencadeou
também a busca de um samba
com sotaque próprio, livre do
samba do Rio. Caio Prado identifica a ideia de morte do samba
com o culto excessivo ao passado do samba carioca. "Queríamos um samba com ideias nossas, literatura nossa, que falasse do nosso cotidiano."
O novo samba paulistano
procura ser a crônica de seu
tempo e espaço. Como observa
Marquinhos Jaca, "tem gente
que usa roupa de bamba da antiga, agindo como se vivesse em
1954. Nosso samba tem que retratar nossa realidade".
Marquinho Dikuã acredita
que as comunidades possam
abrir uma nova possibilidade
para sua geração de sambistas.
Está em curso um boom de independente de discos de samba. "Hoje há em São Paulo 30,
40 comunidades de samba que
reúnem por ano 300 a 400 mil
pessoas. Temos público." Caio
coloca um porém: "A gente
conseguiu se reunir para produzir, mas essa produção não
consegue ser escoada. A pergunta é como quebrar a barreira e cair nas graças do povo."
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