São Paulo, quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

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Periferia renova samba de São Paulo

Movimento surgiu no fim dos anos 90, com foco no samba de raiz, na formação de novos talentos e novas composições

Encontro Mutirão do Samba impulsiona novos sambistas, como Douglas Germano, Adriana Moreira e Marquinho Dikuã

THIAGO MENDONÇA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

A tarde chuvosa de anteontem não impediu a descontração do encontro, que começou com atraso devido aos alagamentos. Na mesa do bar estavam representantes de algumas das comunidades de samba de São Paulo, movimento que tomou conta das periferias.
Presentes Selito SD, do Projeto Nosso Samba de Osasco, T.Kaçula, da Rua do Samba Paulista, Babalu, do Samba da Laje, Marquinhos Dikuã, do Samba de Todos os Tempos, Marquinhos Jaca, da Vai-Vai, e Caio Prado, ex-Projeto Nosso Samba. Adriana Moreira, uma das belas vozes desta geração de sambistas, avisa que ela e Douglas Germano não conseguirão vir por conta da chuva. Entre sambas e risadas, eles contam a história do novo samba paulista.
Nos anos 90, surgiram os primeiros sinais de saturação do pagode comercial. Ao mesmo tempo, as escolas de samba vinham deixando de agregar compositores para se tornarem um triste pastiche dos desfiles cariocas. Não havia mais espaços para os compositores. Alguns anunciaram a morte do samba, mas ele sobreviveu tímida e desorganizadamente nos quintais e botecos da periferia paulistana.
Em 1997, surgiu o Mutirão do Samba, um encontro de sambistas, visando o culto ao samba de raiz, a formação de novos talentos e a exibição de novos sambas. Douglas, um dos fundadores, via ali um estímulo à criação. "O Mutirão nasceu com a vontade de registrar nossa própria história. Neste grupo de 32 pessoas havia compositores, percussionistas de escola de samba e de botequim, instrumentistas, cantores."
Surgia algo novo em São Paulo. "Uma roda com composições próprias, que era ao mesmo tempo um encontro e um espaço de formação", lembra Adriana. O mutirão durou três anos e dali saiu toda uma nova geração de compositores e músicos, alguns com trabalhos autorais, como Adriana, Douglas e Kiko Dinucci.
A experiência do Mutirão serviu como inspiração para a formação de uma série de novas experiências. Projeto Nosso Samba, Samba da Vela, Samba Autêntico, Samba da Laje, Samba de Todos os Tempos, entre dezenas de comunidades. "Surgiu uma série desses núcleos, a partir do samba tradicional", conta Selito. "Ninguém aguentava mais aquela mesmice dos anos 90", diz Kaçula. "A vulgarização das letras a repetição das fórmulas de sucesso."
As comunidades são um culto às batucadas, uma retomada do samba a partir da tradição, que gerou uma nova sonoridade paulistana.
O movimento desencadeou também a busca de um samba com sotaque próprio, livre do samba do Rio. Caio Prado identifica a ideia de morte do samba com o culto excessivo ao passado do samba carioca. "Queríamos um samba com ideias nossas, literatura nossa, que falasse do nosso cotidiano."
O novo samba paulistano procura ser a crônica de seu tempo e espaço. Como observa Marquinhos Jaca, "tem gente que usa roupa de bamba da antiga, agindo como se vivesse em 1954. Nosso samba tem que retratar nossa realidade".
Marquinho Dikuã acredita que as comunidades possam abrir uma nova possibilidade para sua geração de sambistas. Está em curso um boom de independente de discos de samba. "Hoje há em São Paulo 30, 40 comunidades de samba que reúnem por ano 300 a 400 mil pessoas. Temos público." Caio coloca um porém: "A gente conseguiu se reunir para produzir, mas essa produção não consegue ser escoada. A pergunta é como quebrar a barreira e cair nas graças do povo."


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