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MÔNICA BERGAMO
Greg Salibian/Folha Imagem
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Aos 85 anos, o general Euclydes Bueno manda em tudo o que diz respeito ao mais simbólico monumento da cidade e decide até quem pode chegar perto dele: "Escorracei um funcionário da prefeitura", diz.
O dono do Obelisco
"Desculpe. Mas, sem a autorização do general, ninguém entra aqui." Na porta de grade do Obelisco,
o mais simbólico monumento de São Paulo, o cabo Sergio Vilella não cede a nenhum apelo. Nem a prefeita Marta Suplicy entraria lá sem a autorização do
militar. O cabo já barrou até a mulher e o neto do temido general, pois não sabia se ele gostaria que os dois,
sozinhos, visitassem o lugar. E eis que surge o general
nas escadarias. "Eu já estou de saco cheio", grita ele,
caminhando, a passos miúdos, em direção ao fotógrafo que quer entrar no Obelisco. "E eu lá sei se você é parente do Bin Laden? Mando te prender!"
E quem é, afinal, o general? É
Euclydes Bueno Filho, um militar reformado de 85 anos (foi da
turma do ex-presidente João
Baptista Figueiredo na Escola
Militar do Realengo, nos anos
30), menos de 1,65 m, com ares
enfezados e uma voz rouca com
a qual manda e desmanda no
cartão-postal da cidade.
Ele passou a ser uma espécie
de dono do Obelisco em 2001,
quando foi nomeado pela Sociedade Veteranos de 32
-°MMDC, responsável jurídica
pelo monumento, para o cargo
de "coordenador-geral do Obelisco". Passou então a controlar
tudo. É ele quem negocia com as
empresas que financiam a reforma de R$ 1,5 milhão que está
sendo feita no lugar. É ele quem
fiscaliza as obras. É ele quem decide quem chega perto ou é
mantido a distância.
No fim do ano, por exemplo,
apareceu por lá um funcionário
da prefeitura. Queria tirar do
monumento cartazes com os
nomes dos patrocinadores da
reforma. "Escorracei ele", conta
o general. Uma emissora de TV
quis autorização para levar ao
Obelisco praticantes de rapel.
"Ah, quer, é?", respondeu o general. "Que beleza!" E não autorizou. O general Bueno, que é
engenheiro de armamentos,
ajudou a criar a primeira metralhadora brasileira e, mais velho,
colaborou com o SNI, não sossega.
No Réveillon, vândalos tentaram incendiar a tela de proteção
que uma empresa de telefone
colocou na obra. Ele estava lá,
exigindo reforço na segurança.
Já aconteceu de ele telefonar às 3
horas da manhã para o engenheiro João Carlos Beneton,
responsável por parte das obras.
"Mas o general tem um carisma
tão grande que a gente acaba
gostando dele", diz Beneton. Se
alguém dá palpite sobre a obra
sem ser chamado, Bueno reage:
"Você manda aqui agora? Eu
não sabia".
As obras no Obelisco começaram em 2002, quando cupins já
haviam destruído a instalação
elétrica, rachaduras e goteiras
apareceram por toda a parte e a
laje corria o risco de desabar.
Num primeiro momento, foram patrocinadas pela Nestlé.
Neste ano, a Claro, de telefone
celular, resolveu bancar uma segunda parte das obras.
A polêmica foi grande quando
a Claro envolveu o Obelisco
com telas de proteção com seu
logotipo, o que motivou a acusação de que o monumento estava sendo "privatizado". "Se
fôssemos seguir a Bíblia, seria
muito bom fazermos a obra
sem que ninguém soubesse.
Mas, no mundo dos negócios,
isso não funciona. A empresa
quer se beneficiar diante da opinião pública", diz Fábio Fernandes, presidente da F/Nazca, que
detém a conta da empresa.
O Obelisco é o mais alto
monumento da cidade.
Começou a ser construído em 1947, em homenagem aos que
combateram na Revolução Constitucionalista de 1932, foi concluído em 1960 e está cheio
de simbolismos, principalmente referentes
ao dia em que foi deflagrada a revolução, 9 de
julho de 1932.
A área total do monumento é de 1.932 m2. A
altura é de 72 metros
-e 7, somado a 2, é
igual a 9. São nove os
degraus na entrada. Os
14 columbários, onde
estão os restos mortais
de cerca de 700 combatentes, representam as
14 paradas de Jesus na
Via Sacra.
Tem também muitos
mistérios. Num lugar
do subsolo estão sacos
com cinzas de mais de
uma centena de combatentes, pois não há columbários suficientes
para guardá-las. As visitas ao lugar, no entanto,
estão vetadas pelo general.
AVENIDA PAULISTA
O guardião do tempo
É o "Seu Sola" quem cuida
de um dos mais conhecidos
pontos de referência da cidade: o relógio do Conjunto Nacional. O paulistano Valentim Sola, 76, é o responsável,
desde 1975, pelo bom funcionamento do maior relógio da
América Latina -um gigante com 75 metros de comprimento e 17 metros de altura.
"O consumo de energia elétrica equivale ao de uma cidade com 3.000 habitantes", diz.
À frente de uma equipe de
15 pessoas que se revezam na
vistoria feita todas as noites,
seu Sola só tem um pavor:
chuvas de granizo. "São nosso inimigo número um", afirma, fazendo uma careta. É
que as pedrinhas de gelo,
quando batem nos tubos de
néon, podem quebrá-los. A
última chuva de granizo deu
um prejuízo a seu Sola. Ele
conta que a palavra Itaú do
relógio ficou como se tivesse
"uma falha nos dentes". Saldo final: 20 tubos quebrados e
uma baita dor de cabeça para
seu Sola.
Daqui a seis meses, o relógio, que funciona há 45 anos,
vai passar por uma repintura
geral. "O que eu mais gosto é
da credibilidade desse relógio. Ele está sempre marcando a hora e a temperatura certas. Não erra." As horas são
ajustadas por satélite; a temperatura, a partir de um sensor instalado na alameda
Santos.
VETERANO
Viver para contar
O general Bueno foi escolhido para o "posto", entre outros, por Geraldo Faria Marcondes, presidente da Sociedade Veteranos de 32. Aos 91
anos, os olhos de Marcondes
ficam cheios de lágrimas
quando ele relembra os dias
em que lutou na Revolução
de 32. "Saí de Bauru com 40
rapazes e me incorporei a um
batalhão. O capitão me pôs
como orientador de 12 rapazes." Ele lembra que deu
"muitos tiros", no Vale do Paraíba, em direção a um avião
vermelho do governo de Getúlio Vargas que dava rasante
e convidava os paulistas a deporem as armas. Seus pais
doaram jóias para o financiamento da luta.
Ele lembra de um cabo que
declarou, brincando, que enterraria todos os companheiros. "Foi o primeiro a morrer." Outro companheiro
morreu nos braços de Marcondes. O veterano se exalta
ao contar que, numa palestra,
alertou os estudantes: "Respeitem a história do Brasil.
Porque se não vocês não vivem". Pára, e completa, em
voz alta: "Vocês vegetam".
E-mail: bergamo@folhasp.com.br
Com Cleo Guimarães e Álvaro Leme
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