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100 anos da imigração japonesa
Orimoto explora absurdo da sociedade
Artista japonês ligado ao grupo Fluxus ganha mostra no Masp, aberta ao público hoje, três dias após recuperação de telas
"Disseram para eu tomar cuidado com minhas obras por aqui", brincou Orimoto, que trabalhou com Nam June Paik e Joseph Beuys
SILAS MARTÍ
DA REPORTAGEM LOCAL
Três dias depois da recuperação de duas obras-chave de seu
acervo -um Portinari e um Picasso roubados em 20 de dezembro-, o Masp abre para o
público a maior retrospectiva já
realizada da obra do artista japonês Tatsumi Orimoto, 63, inciando o calendário de exposições no Brasil em comemoração do centenário da imigração
japonesa.
Estão na mostra 1.400 fotos,
200 desenhos e dez vídeos do
artista que usa e retrata a mãe
com Alzheimer em quase todas
as obras, a despeito da doença.
Nome importante do grupo
Fluxus nos anos 70, quando viveu em Nova York, Orimoto foi
assistente do pioneiro da videoarte, Nam June Paik, e conviveu com Joseph Beuys, figura
central da arte contemporânea.
Ele chegou a ajudar o artista
alemão na famosa performance
"I Like America and America
Likes Me", em que se trancou
numa galeria nova-iorquina
com um coiote selvagem por
cinco dias em 1974.
Ele abriria sua exposição para convidados ontem no Masp
com um jantar para 50 avós nipo-brasileiras (leia texto ao lado). "É meu presente para elas,
que são como se fossem amigas
da minha mãe", disse Orimoto
em entrevista à Folha no subsolo do museu, anteontem -a
conversa foi interrompida três
vezes pelos testes do alarme
que acabava de ser instalado,
na tentativa de evitar assaltos.
"Disseram para eu tomar
cuidado com minhas obras por
aqui", brincou o artista.
Orimoto herdou de Paik e
Beuys o temperamento enigmático e o hábito de distorcer o
cotidiano em performances e
vídeos absurdos, fazendo de
sua arte uma ponte entre
Oriente e Ocidente e filtrando
os dois lados do mundo por um
prisma às vezes bizarro.
Foi na 21ª Bienal de São Paulo, em 1991, que Orimoto se
transformou pela primeira vez
no "Bread Man", homem com
pães amarrados à cabeça que
circulava pela cidade, distribuindo pelas ruas um alimento-símbolo do Ocidente. Toda
uma parede do Masp está tomada por fotos dessas performances em SP e no mundo.
Com a saúde da mãe debilitada, Orimoto voltou a viver no
Japão. Do convívio diário com
ela, surgiu uma de suas séries
mais célebres: "Bread Man Son
+ Alzheimer Mama" (1996), em
que aparece com pães na cabeça abraçando e brincando com
a mãe, alheia a tudo.
Aos 88 anos, ela participa de
outras performances com um
pneu em torno do pescoço ou
andando pelas ruas de Tóquio
com sapatos gigantes.
"Alguns parentes me criticam por usar a minha mãe, mas
ela sempre participou sem rancor e fala para as amigas que ficou famosa", diz Orimoto.
Em "Art Mama Diary", o artista documenta a rotina da
mãe em fotografias em preto e
branco. Os dois aparecem juntos em vários momentos, cada
vez mais parecidos um com o
outro, quase trocando papéis.
Espaço interrogado
Apesar da estranheza e de
certo incômodo que causam, é
difícil identificar tristeza nos
retratos. Na rotina imaginada
por Orimoto, as dificuldades
dos idosos integram com graça
o discurso sobre público e privado que acompanhou sua trajetória desde o início.
Estão na mostra os primeiros
experimentos de Orimoto nessa linha: o artista dentro de
uma caixa de papelão em sua
casa em Tóquio, uma performance em Nova York em que
aparece dentro de uma caixa e,
de volta ao Japão, ao lado de colegiais dentro de latas gigantes.
Os espaços compactos do Japão são justapostos à vastidão
da América, e, "como desbravador e não como conquistador",
segundo frisa a curadora da
mostra, Tereza de Arruda, Orimoto documenta seus passos
pelas ruas do mundo todo.
TATSUMI ORIMOTO
Quando: de ter. a dom., das 10h às
18h; qui., das 10h às 20h; até 10/2
Onde: Masp (av. Paulista, 1.578, tel.
0/xx/11/3251-5644)
Quanto: R$ 15
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