São Paulo, sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

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100 anos da imigração japonesa

Orimoto explora absurdo da sociedade

Artista japonês ligado ao grupo Fluxus ganha mostra no Masp, aberta ao público hoje, três dias após recuperação de telas

"Disseram para eu tomar cuidado com minhas obras por aqui", brincou Orimoto, que trabalhou com Nam June Paik e Joseph Beuys

SILAS MARTÍ
DA REPORTAGEM LOCAL

Três dias depois da recuperação de duas obras-chave de seu acervo -um Portinari e um Picasso roubados em 20 de dezembro-, o Masp abre para o público a maior retrospectiva já realizada da obra do artista japonês Tatsumi Orimoto, 63, inciando o calendário de exposições no Brasil em comemoração do centenário da imigração japonesa.
Estão na mostra 1.400 fotos, 200 desenhos e dez vídeos do artista que usa e retrata a mãe com Alzheimer em quase todas as obras, a despeito da doença.
Nome importante do grupo Fluxus nos anos 70, quando viveu em Nova York, Orimoto foi assistente do pioneiro da videoarte, Nam June Paik, e conviveu com Joseph Beuys, figura central da arte contemporânea.
Ele chegou a ajudar o artista alemão na famosa performance "I Like America and America Likes Me", em que se trancou numa galeria nova-iorquina com um coiote selvagem por cinco dias em 1974.
Ele abriria sua exposição para convidados ontem no Masp com um jantar para 50 avós nipo-brasileiras (leia texto ao lado). "É meu presente para elas, que são como se fossem amigas da minha mãe", disse Orimoto em entrevista à Folha no subsolo do museu, anteontem -a conversa foi interrompida três vezes pelos testes do alarme que acabava de ser instalado, na tentativa de evitar assaltos.
"Disseram para eu tomar cuidado com minhas obras por aqui", brincou o artista. Orimoto herdou de Paik e Beuys o temperamento enigmático e o hábito de distorcer o cotidiano em performances e vídeos absurdos, fazendo de sua arte uma ponte entre Oriente e Ocidente e filtrando os dois lados do mundo por um prisma às vezes bizarro.
Foi na 21ª Bienal de São Paulo, em 1991, que Orimoto se transformou pela primeira vez no "Bread Man", homem com pães amarrados à cabeça que circulava pela cidade, distribuindo pelas ruas um alimento-símbolo do Ocidente. Toda uma parede do Masp está tomada por fotos dessas performances em SP e no mundo.
Com a saúde da mãe debilitada, Orimoto voltou a viver no Japão. Do convívio diário com ela, surgiu uma de suas séries mais célebres: "Bread Man Son + Alzheimer Mama" (1996), em que aparece com pães na cabeça abraçando e brincando com a mãe, alheia a tudo.
Aos 88 anos, ela participa de outras performances com um pneu em torno do pescoço ou andando pelas ruas de Tóquio com sapatos gigantes.
"Alguns parentes me criticam por usar a minha mãe, mas ela sempre participou sem rancor e fala para as amigas que ficou famosa", diz Orimoto. Em "Art Mama Diary", o artista documenta a rotina da mãe em fotografias em preto e branco. Os dois aparecem juntos em vários momentos, cada vez mais parecidos um com o outro, quase trocando papéis.

Espaço interrogado
Apesar da estranheza e de certo incômodo que causam, é difícil identificar tristeza nos retratos. Na rotina imaginada por Orimoto, as dificuldades dos idosos integram com graça o discurso sobre público e privado que acompanhou sua trajetória desde o início.
Estão na mostra os primeiros experimentos de Orimoto nessa linha: o artista dentro de uma caixa de papelão em sua casa em Tóquio, uma performance em Nova York em que aparece dentro de uma caixa e, de volta ao Japão, ao lado de colegiais dentro de latas gigantes.
Os espaços compactos do Japão são justapostos à vastidão da América, e, "como desbravador e não como conquistador", segundo frisa a curadora da mostra, Tereza de Arruda, Orimoto documenta seus passos pelas ruas do mundo todo.


TATSUMI ORIMOTO
Quando:
de ter. a dom., das 10h às 18h; qui., das 10h às 20h; até 10/2
Onde: Masp (av. Paulista, 1.578, tel. 0/xx/11/3251-5644)
Quanto: R$ 15


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