São Paulo, sábado, 11 de março de 2000


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INTERCÂMBIO ARQUITETÔNICO
Protecionismo divide arquitetos brasileiros

da Reportagem Local

Falta de investimentos no setor, inflação, inadequação técnica, reserva de mercado, desinteresse, pânico mesmo. Segundo alguns dos principais arquitetos do país, são várias as possíveis explicações para a ausência de intercâmbio entre o Brasil e arquitetos internacionais de prestígio, quebrada agora pelo português Álvaro Siza.
Ninguém fala explicitamente em protecionismo, mas a hipótese é aventada por Lúcio Gomes Machado, curador da recente 4ª Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo.
"Há uma certa resistência em se ter um intercâmbio internacional. Existe um certo pânico com a chegada dos grandes escritórios de arquitetura pois ainda não estamos conseguindo resolver a equação entre a importação de projetos internacionais e sua adequação às características e capacidades arquitetônicas nacionais", levantou Gomes Machado.
O arquiteto Carlos Bratke, presidente da Fundação Bienal, por sua vez, critica a reserva de mercado que existe dentro do próprio país. "Não acredito que haja protecionismo. Fora os grandes bancos, shoppings e corporações, que podem pagar os honorários, os arquitetos estrangeiros não têm grandes interesses em produzir aqui. A reserva de mercado no Brasil é que é impressionante. Mesmo que eu tente produzir em outra cidade, eu preciso estabelecer uma parceria com um arquiteto local para agilizar os trabalhos pois muitas vezes a implantação do projeto tem que ficar com o arquiteto local, algo que é muito provinciano", disse Bratke.
O arquiteto Carlos Teixeira também não acredita em protecionismo, mas levanta que, até o momento, a contribuição estrangeira tem se limitado à arquitetura corporativa, área em que o país não teria necessidade. "De alguns anos pra cá, cresceu o número de prédio projetados por escritórios estrangeiros, principalmente em São Paulo, que, teoricamente, teriam que estar associados a algum escritório brasileiro para adaptar o projeto aos condicionantes legais locais. Infelizmente, essa entrada tem acontecido exclusivamente na área da arquitetura corporativa, do mercado imobiliário, áreas onde não é necessária a contribuição de estrangeiros", disse Teixeira.
Gianfranco Vanucchi, vice-presidente da Asbea (Associação Brasileira dos Escritórios de Arquitetura) acredita que a inflação tem sido nas últimas décadas a grande vilã para a falta de intercâmbio entre o Brasil e os arquitetos estrangeiros. "Não existe xenofobia. O grande protecionista da arquitetura brasileira nos últimos 20 anos foi a inflação, que proibiu qualquer intercâmbio. Existiram dificuldades estabelecidas por questões políticas e econômicas", disse. Segundo Vanucchi, a concorrência entre escritórios brasileiros e estrangeiros deve ser em igualdade de condições, com os estrangeiros seguindo as mesmas regras que os brasileiros, que precisam ter registro no Crea, pagar impostos etc.
O arquiteto Paulo Mendes da Rocha também culpa a falta de investimentos e de abertura política pela ausência de intercâmbio entre o Brasil e os outros países. "Acho que o Brasil não tem criado investimentos interessantes para o mercado exterior. Apenas as grandes empresas e corporações têm realizado grandes investimentos. A isso, contribuiu o fato de termos passado por momentos históricos pouco propícios ao intercâmbio nas últimas décadas", disse.
Mas Mendes da Rocha não se ressente disso, já que acredita que o Brasil ainda é um grande celeiro produtivo. "Como invenção arquitetônica, nós somos a América. Nós nos libertamos dos cânones arquitetônicos europeus. O nosso tempo ainda é o de falar e não o de escutar. Temos ainda um grande discurso arquitetônico a ser feito", disse.
O intercâmbio internacional tem sido a tônica da construção e da renovação arquitetônica em vários países desenvolvidos.
Apesar de contar com arquitetos renomados internacionalmente, países como Japão, Espanha e Alemanha têm insistido no intercâmbio como fonte de renovação arquitetônica e de dividendos turísticos. O Japão, por exemplo, se abriu. Apesar de pátria de gênios, como Tadao Ando e Arata Isozaki, entre outros, o país tem comissionado obras a Jean Nouvel, Renzo Piano e outros.
"No Japão, a importação de projetos arquitetônicos faz parte de um projeto cultural de abertura para o mundo. Nós ainda estamos engatinhando nesse sentido, mas um dia o Brasil terá que entrar nessa globalização cultural", disse Carlos Bratke. (CF)

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