São Paulo, sábado, 11 de março de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

MÚSICA

CD dedicado ao ritmo brasileiro (que também tem valsa e David Byrne) é o mais belo dos dois lançamentos

Samba de "Universo" supera pop de "Infinito"

DA SUCURSAL DO RIO

Com tanto tempo disponível, Marisa resolveu mexer em outro baú: o dos antigos compositores de samba. Foi chamando vários ao estúdio que tem em casa para que eles, informalmente, gravassem suas criações inéditas.
Conversou com familiares de craques que já se foram, como Manacea, Walter Rosa e Osório Lima, e também registrou composições deles.
Na hora de escolher o repertório de "Universo ao Meu Redor", selecionou poucas opções de tão farto material. Mas entregou os CDs que fez aos donos e repassou alguns a gente que pode espalhar essas sementes, como Paulinho da Viola e Zeca Pagodinho.
"Esse trabalho que eu fiz não é nada diante do que existe", diz.
Mas já é alguma coisa. A história de Casemiro Vieira é exemplar. No desfile de 1999 da Portela, ele entregou a Marisa uma fita, sem caixa, envolvida em um pacote de biscoitos Globo -muito populares no Rio.
Dos 20 sambas registrados ali precariamente, um foi aproveitado em "Tudo Azul", o disco da velha-guarda da Portela que Marisa produziu, e outro, "Perdoa, Meu Amor" está em "Universo ao Meu Redor", com o próprio Casemiro tocando a sua cuíca.
De outro portelense, Argemiro Patrocínio, a cantora teve a chance de produzir um CD todo dedicado à sua obra. Saiu em 2002, ele morreu em 2003, e agora Marisa mostra a beleza de "Lágrimas e Tormentos", uma canção de alegria, apesar do título. "Me perdoa se eu me excedo em minha euforia/ Mas é que agora sei o que é felicidade", comove a letra.
Se no disco de Argemiro, Marisa optou por arranjos mais convencionais, pois queria algo "puro", no seu próprio CD de samba ela promoveu combinações inusitadas como harpa com cuíca, tamborim com theremim, cavaquinho com teclados vários.
"Não sou uma cantora de samba nem quero me tornar uma. É um disco meu, com mais liberdade em relação ao que se faz no samba", deixa claro.
Marisa prefere dizer que lida com a "atmosfera do samba" no CD. Ou seja, com a natureza, o amor, a solidão e a relação menos comercial com o ato de compor.
É um sentimento do mundo que ela procurou traduzir nas duas belas canções que abrem o CD: a faixa-título e "O Bonde do Dom". "Todo mundo tem um canto de tristeza", ensina a primeira; "Carrego um quintal lá no fundo", poetiza a segunda.
"É um disco de samba, mas que tem uma valsa. E tem David Byrne", volta a relativizar.
A valsa, deslumbrante, é da maior das sambistas, Dona Ivone Lara: "Pétalas Esquecidas" foi feita em 1945. A criação de Byrne/ Marisa, "Statue of Liberty", tem como terceiro parceiro Fernandinho Beat Box, um expoente do hip hop que cria sons com a boca.
Ainda há "Meu Canário", de Jayme Silva (conhecido por outro bicho, "O Pato"), e "Três Letrinhas", de Moraes Moreira/Galvão. Mas nos CDs predomina a compositora Marisa, normalmente com Arnaldo e Brown.
É com o universo ao seu redor que Marisa, abençoada por Paulinho da Viola (autor da inédita "Para Mais Ninguém" e que ainda toca em mais três faixas), faz um belo "disco de samba". Já o "disco pop", embora com maravilhas como a faixa-título, "O Rio" -feita para seu filho- e "Pernambucobucolismo", escorrega em algumas banalidades típicas de um "Infinito Particular".
A partir de abril, os dois "gêmeos bivitelinos", como chama a cantora, estarão na estrada, em uma turnê "menor e menos intensa" do que as anteriores. Afinal, há Mano Wladimir, a delicadeza e a maturidade. (LFV)


Universo ao Meu Redor
   


Infinito Particular
  
Artista:
Marisa Monte
Gravadora: Phonomotor/EMI
Quanto: R$ 40 em média, cada



Texto Anterior: Sob o signo materno
Próximo Texto: Artistas fazem o visual dos CDs
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.