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MÚSICA
CD dedicado ao ritmo brasileiro (que também tem valsa e David Byrne) é o mais belo dos dois lançamentos
Samba de "Universo" supera pop de "Infinito"
DA SUCURSAL DO RIO
Com tanto tempo disponível,
Marisa resolveu mexer em outro
baú: o dos antigos compositores
de samba. Foi chamando vários
ao estúdio que tem em casa para
que eles, informalmente, gravassem suas criações inéditas.
Conversou com familiares de
craques que já se foram, como
Manacea, Walter Rosa e Osório
Lima, e também registrou composições deles.
Na hora de escolher o repertório
de "Universo ao Meu Redor", selecionou poucas opções de tão
farto material. Mas entregou os
CDs que fez aos donos e repassou
alguns a gente que pode espalhar
essas sementes, como Paulinho
da Viola e Zeca Pagodinho.
"Esse trabalho que eu fiz não é
nada diante do que existe", diz.
Mas já é alguma coisa. A história
de Casemiro Vieira é exemplar.
No desfile de 1999 da Portela, ele
entregou a Marisa uma fita, sem
caixa, envolvida em um pacote de
biscoitos Globo -muito populares no Rio.
Dos 20 sambas registrados ali
precariamente, um foi aproveitado em "Tudo Azul", o disco da velha-guarda da Portela que Marisa
produziu, e outro, "Perdoa, Meu
Amor" está em "Universo ao Meu
Redor", com o próprio Casemiro
tocando a sua cuíca.
De outro portelense, Argemiro
Patrocínio, a cantora teve a chance de produzir um CD todo dedicado à sua obra. Saiu em 2002, ele
morreu em 2003, e agora Marisa
mostra a beleza de "Lágrimas e
Tormentos", uma canção de alegria, apesar do título. "Me perdoa
se eu me excedo em minha euforia/ Mas é que agora sei o que é felicidade", comove a letra.
Se no disco de Argemiro, Marisa optou por arranjos mais convencionais, pois queria algo "puro", no seu próprio CD de samba
ela promoveu combinações inusitadas como harpa com cuíca,
tamborim com theremim, cavaquinho com teclados vários.
"Não sou uma cantora de samba nem quero me tornar uma. É
um disco meu, com mais liberdade em relação ao que se faz no
samba", deixa claro.
Marisa prefere dizer que lida
com a "atmosfera do samba" no
CD. Ou seja, com a natureza, o
amor, a solidão e a relação menos
comercial com o ato de compor.
É um sentimento do mundo
que ela procurou traduzir nas
duas belas canções que abrem o
CD: a faixa-título e "O Bonde do
Dom". "Todo mundo tem um
canto de tristeza", ensina a primeira; "Carrego um quintal lá no
fundo", poetiza a segunda.
"É um disco de samba, mas que
tem uma valsa. E tem David
Byrne", volta a relativizar.
A valsa, deslumbrante, é da
maior das sambistas, Dona Ivone
Lara: "Pétalas Esquecidas" foi feita em 1945. A criação de Byrne/
Marisa, "Statue of Liberty", tem
como terceiro parceiro Fernandinho Beat Box, um expoente do
hip hop que cria sons com a boca.
Ainda há "Meu Canário", de
Jayme Silva (conhecido por outro
bicho, "O Pato"), e "Três Letrinhas", de Moraes Moreira/Galvão. Mas nos CDs predomina a
compositora Marisa, normalmente com Arnaldo e Brown.
É com o universo ao seu redor
que Marisa, abençoada por Paulinho da Viola (autor da inédita
"Para Mais Ninguém" e que ainda
toca em mais três faixas), faz um
belo "disco de samba". Já o "disco
pop", embora com maravilhas
como a faixa-título, "O Rio"
-feita para seu filho- e "Pernambucobucolismo", escorrega
em algumas banalidades típicas
de um "Infinito Particular".
A partir de abril, os dois "gêmeos bivitelinos", como chama a
cantora, estarão na estrada, em
uma turnê "menor e menos intensa" do que as anteriores. Afinal, há Mano Wladimir, a delicadeza e a maturidade.
(LFV)
Universo ao Meu Redor
Infinito Particular
Artista: Marisa Monte
Gravadora: Phonomotor/EMI
Quanto: R$ 40 em média, cada
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