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CINEMA
Nem tudo é verdade nos filmes Carlsen
Divulgação
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Cena de "Meu Diário Irlandês", de Jon Bang Carlsen
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MARCELO REZENDE
Reportagem Local
O desejo de capturar a vida pequena, a emoção dos fatos mais
banais. Essa é a ambição do cineasta dinamarquês Jon Bang
Carlsen, que será homenageado
no terceiro "É Tudo Verdade -
Festival Internacional de Documentários", que acontece
neste mês em São
Paulo e Rio de Janeiro.
Carlsen terá uma
retrospectiva na
mostra. Serão exibidos oito de seus trabalhos, que sempre
se caracterizam pela
mistura -por vezes bem-humorada- entre ficção e fato.
Em seus filmes as pessoas comuns se tornam atores, interpretando as suas mais rasas vontades,
ao mesmo tempo em que somos
informados sobre a história de um
lugar, de uma pessoa ou de uma
moradia.
Carlsen passou a ser notado pelo
público brasileiro na edição do
ano passado do festival, após a exibição de "Meu Diário Irlandês"
(1996). Agora serão mostrados
"Um Pescador de Hanstholm"
(1997), "A Vida Será Vivida"
(1993), "Hotel das Estrelas" (1981),
"Antes dos Hóspedes Chegarem"
(1986), "Já Corri Atrás da Verdade" (1988), "É Agora ou Nunca"
(1996) e "Um Rico Homem"
(1978).
Além da retrospectiva, Carlsen
fala no próximo dia 2 de abril no
auditório da Folha. No intervalo
de um dia de filmagem na África
do Sul, o diretor falou em entrevista por telefone sobre seu mais novo projeto e sua tentativa de abrigar a vida comum. Leia abaixo trechos da entrevista dada à Folha.
Folha - O que o sr. está agora filmando na África do Sul?
Jon Bang Carlsen - Eu estou
realizando um documentário sobre a habilidade que os homens
têm em mudar.
De que maneira são formados segundo idéias fundamentalistas para depois terem que assimilar novas situações. E a África do Sul é
um lugar especial para esse tipo de
história.
Folha - E o sr. pretende a mesma
mistura de imagens ficcionais e
testemunhos reais que marcam alguns de seus principais trabalhos?
Carlsen - Sim. Mas não se trata
exatamente de uma mistura... é na
verdade a maneira que eu trabalho
naturalmente. Quando estou trabalhando tomo algumas impressões da vida, do cotidiano mais banal, e ao mesmo tempo construo
algumas impressões que eu pessoalmente tenho sobre o mesmo
tema.
No final trata-se de um documentário, mas para mim documentários são uma forma de ficção, pelo menos em algum sentido. Alguns filmes ficcionais que tenho visto parecem ser mais documentais que meus próprios trabalhos.
Folha - O sr. acredita que para o
público a distinção entre documentário e ficção é também tão
pouco clara?
Carlsen - Não sei se essa é uma
questão que realmente exista. Talvez as categorias sirvam bem mais
aos organizadores de festivais,
porque estabelecer se um filme é
uma coisas ou outra depende sempre de critérios subjetivos.
Documentários e ficção são basicamente o resultado de um mesmo
processo: uma mente que tenta entender o mundo de uma maneira
artística. A maneira que escolhem
para dar conta do trabalho é mais
uma questão técnica do que qualquer outra.
Folha - Seus documentários parecem estar voltados mais ao presente, o momento, do que a uma
busca arqueológica do passado.
Carlsen - Eu sempre fui muito
fascinado com a vida do dia-a-dia.
Em todos os meus filmes você não
encontrará heróis, pessoas famosas. Você verá apenas pessoas comuns, que vivem nas sombras.
Isso porque são nessas pessoas
que eu acho que posso encontrar a
vida. Homens e mulheres comuns
em meio ao que existe de mais comum.
Eu sou muito mais inspirado nos
rituais da vida comum, que nos fazem encontrar uma função na própria existência. Tento mostrá-los
segundo um ponto de vista artístico, provocativo.
Sobre o fato de ficcionalizar essas
situações... mesmo os filmes de
ação hollywoodianos, os de explosões e alta velocidade, nos mostram algo sobre as pessoas.
Penso que a representação facilita o entendimento do homem com
a câmera. Quando interpretam,
cantam ou recitam diante da câmera estão mais livres e essa liberdade é essencial para que se possa
entendê-las. Eu não estou interessado em opiniões.
Folha - E quais as dificuldades de
ser um cineasta interessado nessa
existência do dia-a-dia?
Carlsen - Não é muito comercial, não esse apelo, porque o público adora heróis e pessoas conhecidas. É mais fácil conseguir
dinheiro quando se trata de heróis.
Mas é bom trabalhar na Escandinávia, onde temos mecanismos
para a manutenção desse tipo de
produção.
Algumas vezes filmar não parece
ser algo economicamente viável,
mas a Escandinávia (e também o
Canadá) está interessada nesse tipo de trabalho. Se eu vivesse em
Hollywood provavelmente faria
bem menos filmes.
O quê: É Tudo Verdade - Festival
Internacional de Documentários (terceira
edição)
Quando: 27 de março 2 de abril (São
Paulo) e 30 de março a 5 de abril (São
Paulo)
Onde: Centro Cultural Banco do Brasil (Rio)
e Centro Cultural São Paulo, Cinesesc,
Museu da Imagem e do Som
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