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É TUDO VERDADE
Israelense que fez filme sobre Sharon diz que ação do país contra palestinos mascara fuga à negociação
Documentarista vê surgir uma nova forma de terror
DA REPORTAGEM LOCAL
O documentarista israelense
Avi Mograbi, 45, diz que, neste
momento, em seu país, é impossível pensar em outra coisa além do
conflito com a Palestina. Mas a situação é "emocional demais" para que consiga planejar um filme.
Em entrevista, por telefone, de
Tel Aviv, ele fala de "Agosto", seu
longa a ser exibido no Brasil, e do
anterior, "Como Aprendi a Superar Meu Medo e Amar Ariel Sharon", que classifica como "profético".
(SILVANA ARANTES)
Folha - O sr. se arrepende de ter
feito "How I Learned to Overcome
My Fear and Love Arik Sharon"
("Como Aprendi a Superar Meu Medo e Amar Ariel Sharon")?
Avi Mograbi - Definitivamente
não me sinto mal por ter feito esse
filme. É fato que nele o sr. Sharon
parece uma pessoa muito amável.
Mas essa é precisamente a história
do filme -como alguém que parece tão legal e amável pode ser
tão horrível. Temos de lembrar o
tempo todo quem ele realmente é
e não quem ele parece ser.
Não é um documentário sobre
Sharon, mas sobre nós, os israelenses. Fiz esse filme em 96. A história é sobre como eu, um cineasta de esquerda, fiz um filme político sobre Sharon, encantei-me por
ele, fiquei cativado por seu carisma e mudei minha visão política.
Obviamente não mudei de fato
minha visão política. Foi uma maneira irônica de colocar as coisas.
Quando terminei o filme, Sharon parecia ser um político em
fim de carreira. Cinco anos depois, ele foi eleito primeiro-ministro. O filme acabou sendo um documentário profético, um retrato
de como a sociedade israelense
esqueceria o que Sharon é, qual é
a sua moral, o que fez nos longos
anos de sua carreira política, e se
renderia ao seu carisma, acreditando que ele poderia lhe dar paz
e segurança, como prometia.
Folha - Com que objetivo o sr. filmou "Agosto"?
Mograbi - Decidi fazer um filme
sobre agosto, o mês que mais
odeio, pensando que poderia ser
uma metáfora sobre a vida em Israel. Quando saí para filmar, não
tinha planos. Eu só queria ir às
ruas e filmar a violência, porque a
atmosfera em Israel nos últimos
anos tem sido bastante agressiva e
violenta. Minha intenção inicial
não funcionou, porque, sempre
que você sai à procura de algo, o
que busca não acontece onde você está, mas em outro lugar. E não
acontece quando você está com a
câmera ligada, mas quando você a
esqueceu ou está despreparado.
Não encontrei nenhuma violência, mas muitas pessoas reagiram
muito agressivamente a mim e à
minha câmera. Filmei com uma
pequena câmera digital, sozinho.
Eu não parecia uma equipe de
TV. Mesmo assim, as pessoas não
queriam que eu as filmasse, reagiam como se tivessem um sentimento de culpa, algo a esconder.
Não fiz nenhum tipo de provocação. Só falava depois que as pessoas se dirigiam a mim. Mas eu
era parte daquilo e me tornei
igualmente agressivo. Eu me sinto
muito desconfortável nessas partes em que me vejo sendo tão
agressivo quanto a rua, mas aconteceu, e eu não poderia esconder.
Tampouco queria fazer um filme
em que dissesse "eles são maus e
agressivos e eu, puro e maravilhoso", porque sou parte deste lugar
e provavelmente sou tão agressivo quanto a rua. A questão é: por
que somos tão agressivos?
Folha - Tem sido possível trabalhar atualmente em Israel?
Mograbi - Para os israelenses, a
situação está OK. Até há dez dias
tínhamos medo de bombas, mas
agora a situação está calma, e podemos fazer tudo o que fazíamos
antes, embora ainda tenhamos
medo em lugares públicos.
Ou seja, nossa vida está razoavelmente normal, mas não podemos pensar em nada além do
conflito. Enquanto falo com você
[na noite de terça", vejo pela TV
um tanque investindo contra
uma equipe de jornalistas numa
cidade palestina. O que está ocorrendo não é a demolição do terror, mas a criação de uma nova
forma de terror. É horripilante.
Folha - Qual é seu novo projeto?
Mograbi - Ainda não sei. A situação atual oferece muitas idéias,
mas tudo é emocional demais
agora para realmente pensar em
começar um filme. Estou ocupado enviando muitos e-mails, tentando espalhar informações a que
não se tem acesso pela imprensa.
Tento fazer as pessoas saberem o
que está acontecendo. Mais tarde,
provavelmente pensarei em algo.
Folha - Que tipo de informações
não publicadas pela imprensa o sr.
está divulgando?
Mograbi - É muito difícil saber o
que está acontecendo nos territórios ocupados, porque o Exército
isola o local e não autoriza a entrada da imprensa. Mas há depoimentos devastadores de palestinos sobre o que está ocorrendo lá
dentro, sobre quantas pessoas estão sendo mortas, sobre o fato de
as ambulâncias não conseguirem
recolher mortos e feridos, sobre
as atrocidades praticadas pelo
Exército e os danos causados a
moradias e instituições.
Temos recebido muitas notícias, não pelos meios tradicionais,
como jornais e TV, até porque a
mídia em Israel tornou-se uma
grande propaganda governamental. Não temos como ir lá checar a
veracidade de todas as informações, mas, de tempos em tempos,
há confirmações de algumas delas
e tentamos fazer com que as pessoas saibam e fiquem alertas.
O que está sendo feito [por Israel" não é uma operação limpa,
mas uma grande ofensa à população civil. E sua intenção não é necessariamente demolir o terror,
mas evitar a negociação.
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