São Paulo, quinta-feira, 11 de abril de 2002

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CINEMA

Série com seis capítulos dirigida por Amilcar M. Claro tem o primeiro episódio exibido no festival É Tudo Verdade

Longa traduz carreira de Antunes Filho

VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

PEDRO IVO DUBRA
DA REDAÇÃO

São cerca de seis horas, um piscar de olhos para traduzir 52 anos de carreira, mas uma eternidade no acirrado tempo da televisão.
O documentário "O Teatro Segundo Antunes Filho", que o canal a cabo STV Rede SescSenac leva ao ar de 20 a 25 deste mês, sempre às 23h, incumbe-se de sintetizar a trajetória artística e o pensamento de um dos maiores encenadores do teatro brasileiro.
Trata-se de uma série de seis capítulos com 50 minutos cada um. Os títulos estão subdivididos assim: "As Origens de um Artista", "60, a Década das Transgressões", "Desafios de um Tempo Duro", "Mestre e Discípulos", "A Poética do Mal" e "O Método".
A captação aconteceu entre junho e dezembro de 2001. A direção é de Amilcar M. Claro, sob concepção de Raul Teixeira e roteiro de Sebastião Milaré.
Invariavelmente com um cachecol xadrez nos ombros e um cachimbo na boca, o paulistano José Alves Antunes Filho, 71, rememora sua relação com o teatro, a começar pela experiência do "moleque" Zequinha, que foi debutar como ator dirigido por Osmar Rodrigues Cruz.
Cita o período em que foi assistente de diretores estrangeiros no Teatro Brasileiro de Comédia (TBC), nos anos 50, caso do italiano Ruggero Jacobbi e do polonês Zbigniew Ziembinski. Descreve a realização do teleteatro da TV Cultura, nos anos 70, com programas ao vivo. Estabelece o divisor de águas "Macunaíma" (1978), quando abandona os projetos do "teatrão", mais comercial, em nome de uma prospecção que vai culminar com a criação do Centro de Pesquisa Teatral (CPT), em 1982, sob o signo de uma ética e de uma estética sem concessões.
É o conhecido Antunes que trata o interlocutor como "bicho", expressão dos anos 70, ao mesmo tempo em que evoca Shiva, divindade que pode criar ou destruir o mundo com um gesto, ou Jung, que criou o conceito do "arquétipo", o inconsciente coletivo.
Atores como Laura Cardoso, Luís Melo, Eva Wilma, Raul Cortez, Giulia Gam, Cacá Carvalho e a nova geração do CPT, representada por Juliana Galdino e Emerson Danesi, prestam depoimentos sobre a relação artística e, por vezes, pessoal com Antunes.
O recorte estético ganha um programa todo seu, "O Método", sobre as teorias que norteiam o trabalho de voz, de corpo e de dramaturgia radicalizados na série "Prêt-à-Porter". "A criação artística é um parto. Tem de apanhar muito na cara. Se o cara é convenientemente agradável, não vai sair do lugar. Eu sempre fui muito inconveniente, inoportuno, chato, curioso", afirma Antunes em uma das suas autocríticas.
A intenção de realizar um documentário sobre o encenador é antiga. Raul Teixeira, 38, idealizador do projeto, costumava filmar em VHS ensaios e encontros do CPT, onde desempenha hoje a função de sonoplasta. Segundo ele, a idéia já existia cinco anos atrás.
"É muito difícil filmá-lo. O CPT é um lugar meio sagrado. Antunes dizia: "Não gosto dessas coisas". Quando se fechou o método, encontrei o Milaré, o Amilcar. Daí formamos o trio."
Definindo o registro documental como "uma grande reportagem sobre a vida e o processo de criação de um artista", o roteirista do projeto, Sebastião Milaré, 56, acredita que o vídeo antecipa, em certos pontos, o livro que está escrevendo (sem prazo de conclusão) sobre o método de Antunes.
"A matéria é a mesma, só que o vídeo é uma demonstração prática. Não entra tanto nos conceitos." Antes da concepção final, foi elaborado um primeiro roteiro, que só se completou com a captação de imagens e depoimentos.
Milaré escreveu "Antunes Filho e a Dimensão Utópica" (1994), em que trata da carreira do artista. Foi a ele que Antunes concedeu a longa entrevista -oito horas gravadas em dois dias- editada e mostrada aos pedaços. "Quando ele fala do passado, é mais linear. Já quando chega à atualidade, não se controla, volta a assuntos, é mais conturbado", diz Milaré.
Uma das preocupações era saber se o encenador teria paciência para enfrentar a maratona de perguntas. E, até, que apresentasse, quando tudo estava pronto para começar, uma eventual desistência. Deu, enfim, tudo certo. "Às vezes, ele ficava meio ansioso, falava: "Pára, vamos logo". Ele faz um teatro a que estou acostumado. Sei quando é brincadeira. Ele é um provocador. Mas acabava fazendo o que a gente pedia. Ele fala de uma forma no vídeo que a gente até desconhece. Ele se abriu mesmo", afirma Teixeira.
O primeiro capítulo da série será exibido no É Tudo Verdade, em SP e no Rio. O lançamento será na próxima terça, no Sesc Anchieta, para convidados.



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