São Paulo, sexta-feira, 11 de abril de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Última Moda

ALCINO LEITE NETO - ultima.moda@folha.com.br

Zegna aposta no Brasil

Para Ermenegildo Zegna, protecionismo brasileiro atrasa economia do país

A Ermenegildo Zegna, uma das mais prestigiosas grifes de roupas masculinas do mundo, mudou todo o seu modelo de negócios no Brasil.
Desde 1994, o empresário André Brett tinha o licenciamento das marcas do grupo no país. A partir deste mês, a Zegna assume diretamente a administração de suas cinco lojas brasileiras, e Brett torna-se sócio do empreendimento, com 30% de participação.
O Brasil passa a ser também o centro de controle das operações da Ermenegildo Zegna na América Latina -continente que concentra apenas 3% das vendas mundiais do grupo.
Para anunciar as mudanças e inaugurar a nova loja da grife em São Paulo, anteontem, esteve na cidade o empresário Ermenegildo Zegna, atual CEO do grupo, neto e homônimo do fundador da marca italiana, criada em 1910.
Gildo Zegna, como é conhecido entre os mais próximos, também veio a São Paulo para participar do seminário Fashion Marketing 2008, organizado pela consultora Gloria Kalil.
Em sua palestra, ele falou a respeito dos negócios do grupo Zegna e contou sobre a aventura chinesa da grife. Primeira marca mundial a se estabelecer na China, ela hoje possui 50 lojas no país. "Quando fomos, em 1991, muita gente achou que estávamos loucos", revelou.
Na entrevista a seguir, Zegna explica por que no Brasil a situação para as grifes internacionais é ainda mais complicada do que na China comunista.
"O Brasil é provavelmente o país mais protecionista do mundo", ele diz.

 

FOLHA - Para uma grife estrangeira que queira se estabelecer no Brasil qual é a principal dificuldade?
ERMENEGILDO ZEGNA -
As altas taxas de importação, o protecionismo econômico do país.

FOLHA - O Brasil é muito protecionista?
ZEGNA -
Sim, se o comparamos com outros países emergentes, como a China, a Índia ou a Turquia. Eu diria que o Brasil é provavelmente o país mais protecionista do mundo. A Índia também era muito protecionista, mas decidiu gradativamente reduzir os impostos.

FOLHA - Em outros países da América do Sul a situação é diferente?
ZEGNA -
A Ermenegildo Zegna já está na Colômbia, na Argentina, no Chile e no México. Estes dois últimos países são menos protecionistas. Na Argentina, as restrições têm caído pouco a pouco.

FOLHA - Na sua opinião, por que o Brasil é assim?
ZEGNA -
Não sei, deve ser algo relacionado à história do país, como foi a inflação, que vocês, aliás, conseguiram controlar e vencer. Mas isso deveria ser mudado, porque o mundo inteiro está mudando. Ele precisa se abrir à competição, pois ela torna um país mais ativo e inovador. É o espírito do pioneiro, entende? Mas creio que a situação irá mudar nos próximos anos, porque o Brasil é um país voltado para o futuro, e os brasileiros têm a mente aberta.

FOLHA - Quais as vantagens de não ser protecionista?
ZEGNA -
O protecionismo torna os preços dos produtos muito altos. Além disso, eu tento me colocar no papel de um produtor brasileiro. Se houvesse menos proteção, eu tentaria ser mais arguto, entender o que fazer para poder exportar mais. Se você tem a garantia de que será protegido pelo Estado, que interesse terá em exportar? Se você está aberto à competição, acaba se comparando com os outros e tem que encontrar um bom caminho para crescer, tem que ter boas idéias. Comércio livre significa que você deve buscar oportunidades fora de seu país, que deve se comparar com o que é feito lá fora, porque mais cedo ou mais tarde os outros virão para a sua terra.

FOLHA - É lucrativo para uma grife como a Ermenegildo Zegna se estabelecer no Brasil?
ZEGNA -
Espero que seja. Mas não é no início. No começo, você perde dinheiro.

FOLHA - O sr. está perdendo dinheiro aqui?
ZEGNA -
Acabamos de abrir uma nova loja. Então, naturalmente estamos perdendo, porque ainda estamos na fase de investimentos. Antes, vendíamos para franqueados, André Brett, a Daslu... Agora, as lojas passaram a ser nossas. Então, recomeçamos do zero. Mas estamos preparados para perder dinheiro nesse início, porque acreditamos que, no longo prazo, seremos lucrativos.

FOLHA - Por quanto tempo o sr. ainda perderá dinheiro no Brasil?
ZEGNA -
Depende, temos um plano de negócios, mas por enquanto é cedo para julgar. Posso dizer que na China nós perdemos dinheiro por vários anos. Hoje, temos 50 lojas. Mas lá é uma outra história. Na Índia, onde começamos no ano passado, ainda estamos perdendo dinheiro.

FOLHA - Em sua palestra, o sr. distingue o luxo puro do luxo acessível. Mas não será contraditório um luxo acessível?
ZEGNA -
Não é contraditório. O luxo acessível é aquele que, apesar de não utilizar a principal matéria-prima, como uma supercashmere, mesmo assim é um produto de boa qualidade.

FOLHA - O luxo acessível significa que é possível massificar o luxo?
ZEGNA -
Não. Não estou falando em massificação do luxo. O luxo acessível talvez atinja apenas 10% da população de um país, enquanto o luxo puro é muito mais restritivo.

FOLHA - O que o sr. acha da tese da jornalista Dana Thomas, que no livro "Deluxe" (ed. Campus) argumenta que o luxo está deixando de ser luxo ao buscar um maior número de consumidores?
ZEGNA -
Eu discordo. Você não pode generalizar. Não é preto e branco, tem vários tons de cinza no meio. O que nós encaramos na Ermenegildo Zegna como um luxo acessível pode ser, para muita gente, um verdadeiro luxo puro.


Texto Anterior: Mônica Bergamo
Próximo Texto: Para Tufi, mercado mundial é sonho
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.