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Última Moda
ALCINO LEITE NETO - ultima.moda@folha.com.br
Zegna aposta no Brasil
Para Ermenegildo Zegna, protecionismo brasileiro atrasa economia do país
A Ermenegildo Zegna, uma
das mais prestigiosas grifes de
roupas masculinas do mundo,
mudou todo o seu modelo de
negócios no Brasil.
Desde 1994, o empresário
André Brett tinha o licenciamento das marcas do grupo no
país. A partir deste mês, a Zegna assume diretamente a administração de suas cinco lojas
brasileiras, e Brett torna-se sócio do empreendimento, com
30% de participação.
O Brasil passa a ser também o
centro de controle das operações da Ermenegildo Zegna na
América Latina -continente
que concentra apenas 3% das
vendas mundiais do grupo.
Para anunciar as mudanças e
inaugurar a nova loja da grife
em São Paulo, anteontem, esteve na cidade o empresário Ermenegildo Zegna, atual CEO do
grupo, neto e homônimo do
fundador da marca italiana,
criada em 1910.
Gildo Zegna, como é conhecido entre os mais próximos,
também veio a São Paulo para
participar do seminário Fashion Marketing 2008, organizado pela consultora Gloria Kalil.
Em sua palestra, ele falou a
respeito dos negócios do grupo
Zegna e contou sobre a aventura chinesa da grife. Primeira
marca mundial a se estabelecer
na China, ela hoje possui 50 lojas no país. "Quando fomos, em
1991, muita gente achou que estávamos loucos", revelou.
Na entrevista a seguir, Zegna
explica por que no Brasil a situação para as grifes internacionais é ainda mais complicada do que na China comunista.
"O Brasil é provavelmente o
país mais protecionista do
mundo", ele diz.
FOLHA - Para uma grife estrangeira
que queira se estabelecer no Brasil
qual é a principal dificuldade?
ERMENEGILDO ZEGNA - As altas taxas de importação, o protecionismo econômico do país.
FOLHA - O Brasil é muito protecionista?
ZEGNA - Sim, se o comparamos
com outros países emergentes,
como a China, a Índia ou a Turquia. Eu diria que o Brasil é provavelmente o país mais protecionista do mundo. A Índia
também era muito protecionista, mas decidiu gradativamente
reduzir os impostos.
FOLHA - Em outros países da América do Sul a situação é diferente?
ZEGNA - A Ermenegildo Zegna
já está na Colômbia, na Argentina, no Chile e no México. Estes dois últimos países são menos protecionistas. Na Argentina, as restrições têm caído pouco a pouco.
FOLHA - Na sua opinião, por que o
Brasil é assim?
ZEGNA - Não sei, deve ser algo
relacionado à história do país,
como foi a inflação, que vocês,
aliás, conseguiram controlar e
vencer. Mas isso deveria ser
mudado, porque o mundo inteiro está mudando. Ele precisa
se abrir à competição, pois ela
torna um país mais ativo e inovador. É o espírito do pioneiro,
entende? Mas creio que a situação irá mudar nos próximos
anos, porque o Brasil é um país
voltado para o futuro, e os brasileiros têm a mente aberta.
FOLHA - Quais as vantagens de não
ser protecionista?
ZEGNA - O protecionismo torna
os preços dos produtos muito
altos. Além disso, eu tento me
colocar no papel de um produtor brasileiro. Se houvesse menos proteção, eu tentaria ser
mais arguto, entender o que fazer para poder exportar mais.
Se você tem a garantia de que
será protegido pelo Estado, que
interesse terá em exportar? Se
você está aberto à competição,
acaba se comparando com os
outros e tem que encontrar um
bom caminho para crescer, tem
que ter boas idéias. Comércio
livre significa que você deve
buscar oportunidades fora de
seu país, que deve se comparar
com o que é feito lá fora, porque
mais cedo ou mais tarde os outros virão para a sua terra.
FOLHA - É lucrativo para uma grife
como a Ermenegildo Zegna se estabelecer no Brasil?
ZEGNA - Espero que seja. Mas
não é no início. No começo, você perde dinheiro.
FOLHA - O sr. está perdendo dinheiro aqui?
ZEGNA - Acabamos de abrir
uma nova loja. Então, naturalmente estamos perdendo, porque ainda estamos na fase de
investimentos. Antes, vendíamos para franqueados, André
Brett, a Daslu... Agora, as lojas
passaram a ser nossas. Então,
recomeçamos do zero. Mas estamos preparados para perder
dinheiro nesse início, porque
acreditamos que, no longo prazo, seremos lucrativos.
FOLHA - Por quanto tempo o sr.
ainda perderá dinheiro no Brasil?
ZEGNA - Depende, temos um
plano de negócios, mas por enquanto é cedo para julgar. Posso dizer que na China nós perdemos dinheiro por vários
anos. Hoje, temos 50 lojas. Mas
lá é uma outra história. Na Índia, onde começamos no ano
passado, ainda estamos perdendo dinheiro.
FOLHA - Em sua palestra, o sr. distingue o luxo puro do luxo acessível.
Mas não será contraditório um luxo
acessível?
ZEGNA - Não é contraditório. O
luxo acessível é aquele que,
apesar de não utilizar a principal matéria-prima, como uma
supercashmere, mesmo assim
é um produto de boa qualidade.
FOLHA - O luxo acessível significa
que é possível massificar o luxo?
ZEGNA - Não. Não estou falando em massificação do luxo. O
luxo acessível talvez atinja apenas 10% da população de um
país, enquanto o luxo puro é
muito mais restritivo.
FOLHA - O que o sr. acha da tese da
jornalista Dana Thomas, que no livro "Deluxe" (ed. Campus) argumenta que o luxo está deixando de
ser luxo ao buscar um maior número de consumidores?
ZEGNA - Eu discordo. Você não
pode generalizar. Não é preto e
branco, tem vários tons de cinza no meio. O que nós encaramos na Ermenegildo Zegna como um luxo acessível pode ser,
para muita gente, um verdadeiro luxo puro.
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