São Paulo, sexta-feira, 11 de abril de 2008

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Música

Charles Aznavour prepara despedida

Veterano da música francesa, cantor realiza shows em SP, no Rio e em Porto Alegre em turnê que afirma ser a sua última

Em entrevista à Folha, Charles Aznavour relembra sua carreira e comenta relação com Edith Piaf e problema no ouvido

LENEIDE DUARTE-PLON
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE PARIS

Ele é o último "monstro sagrado" da canção francesa. Aos 82 anos, Charles Aznavour, que morou com Edith Piaf (1915-1963) sem ter tido um caso de amor com ela, visita o Brasil pela "quinta ou sexta vez" para cantar em diversas capitais, em "turnê de despedida".
Baixo, feio e com a voz "ingrata" que a natureza lhe deu, Aznavour tem uma presença mágica em cena, que o transformou num ídolo da canção mundial. Ele já vendeu 100 milhões de discos e lota as salas de espetáculos das principais capitais do mundo há 50 anos. Leia a seguir entrevista que o cantor concedeu à Folha.

 
FOLHA - No início de sua carreira, dizia-se que o sr. tinha "um físico difícil e uma voz ingrata". Como o sr. conseguiu impor seu estilo?
CHARLES AZNAVOUR -
Ele se impôs sozinho, não fiz nada. Continuei, não quis ser diferente do que eu era. Não se pega um trem andando. Não tentei fazer iê-iê-iê, rock ou rap. Fiz o que fiz, e isso se tornou uma espécie de clássico. As pessoas vêm me ouvir como um show clássico, com uma diferença: tenho mais público que os músicos que fazem música clássica.

FOLHA - O sr. conheceu Edith Piaf, morou com dela, mas não tiveram uma relação amorosa. Por quê?
AZNAVOUR -
Eu era cúmplice dela. Na época, eu estava apaixonado e vivia um outro amor. Não se abandona a vida que a gente tem para viver com uma pessoa famosa por puro interesse, por carreirismo. Não sou um carreirista. Há muitas mulheres que eu amei com quem não tive uma vida sexual. Piaf e Amália Rodrigues são duas delas. Conheci bem Amália, tínhamos uma grande cumplicidade. Eu a via menos do que via Piaf, é claro, mas penso que as pessoas que se dão bem não devem necessariamente passar pela cama. Éramos cúmplices, gostávamos das mesmas coisas.

FOLHA - Qual foi o momento mais emocionante de sua carreira?
AZNAVOUR -
Foi quando meus pais foram olhar um grande cartaz de meu espetáculo da altura de um prédio de cinco andares, perto do Moulin Rouge, e ficaram olhando alguns minutos, completamente fascinados e felizes. Eu os observava de longe. Esse foi o momento mais emocionante da minha vida, lá pela década de 50.

FOLHA - O sr. conhece a música brasileira?
AZNAVOUR -
Sim, muito bem. Quando fui pela primeira vez ao Brasil, havia uma cantora chamada Marlene, que tinha ido ao programa de Edith Piaf no Bobino de Paris por muito tempo, e de quem Piaf gostava muito. E, quando cheguei ao Brasil, Marlene me disse: "Preparei uma surpresa, vou te mostrar o que há de mais novo aqui". Ela tinha preparado uma noite com Jobim, João Gilberto e Elizeth Cardoso. Em uma noite, conheci o Brasil.

FOLHA - O sr. gravou em inglês, italiano, espanhol e alemão. Nunca se sentiu tentado pelo português?
AZNAVOUR -
Eu canto as minhas canções, por isso não canto canções brasileiras. Nunca tive contato com tradutores para o português. Os tradutores me enviavam traduções de minhas canções em alemão, espanhol, italiano e inglês, e trabalhávamos juntos. Nunca me propuseram traduções em português. E eu nunca forcei.

FOLHA - Existe uma canção de um outro compositor que o sr. gostaria de ter feito?
AZNAVOUR -
Há muitas. Eu gostaria de ter escrito todas as belas canções do mundo.

FOLHA - O sr. cantou nas cidades mais importantes do mundo. Qual o público mais difícil ou exigente?
AZNAVOUR -
O mais difícil é o público esnobe. Ele pode ser de qualquer país. Aplaude com as pontas dos dedos ou com luvas. Viram tudo, ouviram tudo, conhecem tudo. Esse público pode dar opinião sobre tudo, e sempre uma opinião crítica. Esse é o público ruim.

FOLHA - O sr. teve uma das carreiras mais longas e importantes da canção francesa. Vai poder realmente parar depois dessa turnê?
AZNAVOUR -
Sou obrigado. Num dado momento não poderei mais subir num palco. Quando tive um grande problema de ouvido, disse que pararia. E então consegui me disciplinar para que meu ouvido só ouvisse o que era preciso. Mas foi muito difícil, e continua sendo. Com um ouvido ouço um tom diferente do que ouço com o outro. Isso é terrível. De repente, o violino que deve tocar ao mesmo tempo que o piano, o ouço com dois tons.

FOLHA - E o que acontece?
AZNAVOUR -
Eu me disciplinei. Passei a ouvir apenas o que quero ouvir, apenas o que tenho necessidade de ouvir. Mudei introduções, há instrumentos que tive que tirar, pois não dava para mantê-los.

FOLHA - E quando o sr. pretende parar de vez de cantar?
AZNAVOUR -
Quando estiver totalmente destruído (risos).


Leia a íntegra da entrevista

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