São Paulo, sábado, 11 de maio de 2002

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Obra defende biomassa como alternativa a petróleo

CLAUDIO ANGELO
EDITOR-ASSISTENTE DE CIÊNCIA

Em 1991, os donos de carros a álcool tiveram mais um motivo para amaldiçoar sua escolha, além da dificuldade para ligar o motor em manhãs frias. Naquele ano, o preço do açúcar subiu tanto no mercado internacional que os usineiros pararam de produzir álcool combustível. O país mergulhou num desabastecimento que sinalizaria o ocaso do Proálcool, o maior e mais bem-sucedido programa de energia renovável do mundo -hoje abandonado.
O fracasso mercadológico do programa governamental, no entanto, não tirou do Brasil a sua vocação para produzir energia por meio da biomassa, a matéria vegetal aproveitável como combustível. O cientista social Gilberto Felisberto Vasconcellos traz de volta a questão do álcool em "Biomassa - A Eterna Energia do Futuro" (editora Senac São Paulo).
Diante da perspectiva daquilo que chama de "apagão fóssil", com a morte anunciada das reservas mundiais de petróleo, ele propõe que o Brasil assuma o papel de gigante da energia renovável.
A mudança da matriz energética brasileira para a biomassa (álcool de cana, carvão e óleos vegetais) produziria o que o autor chama de "aurora vegetal dos trópicos", com o fim da dependência tecnológica externa, o fim do êxodo rural -a produção de plantas para combustível fixaria o homem no campo- e a descentralização de renda e poder que costuma vir no pacote das fontes energéticas alternativas ao petróleo.
Isso sem falar, é claro, no maior milagre prometido pela biomassa: a obtenção de energia limpa, sem as emissões de gás carbônico (CO2) produzidas pela queima de combustíveis fósseis que prometem deixar o planeta até 5,8C mais quente no fim deste século.
Num tempo de guerras no Oriente Médio, efeito estufa e crise energética generalizada, essa visão parece alentadora. Mas, claro, as coisas não são tão simples.
De início, a idéia de que o petróleo irá acabar é falaciosa. Seu declínio foi vaticinado já no começo do século, quando previa-se que as reservas se esgotariam em 1940.
O que ocorreu? A tecnologia de prospecção aumentou as reservas conhecidas, e hoje temos petróleo cada vez mais abundante e barato, por incrível que pareça.
Um outro problema da proposta do autor é que sua era da biomassa pode criar mais problemas ambientais do que resolvê-los. Vasconcellos arrisca-se a ressuscitar o ciclo da cana ao defender "a produção de biomassa em escala extensiva, ocupando com gentes brasileiras os grandes espaços vazios do território" -semelhanças com o bordão "terra sem homens para homens sem terra", com o qual militares justificavam o avanço sobre a Amazônia, é uma perigosa coincidência. E "plantations" de cana não combinam muito com conservação.
Seja como for, Vasconcellos acerta em cheio ao dizer que "inexiste predestinação energética da biomassa se não houver a força política dos interesses nacionais e populares". Um país que quer escapar da ditadura do petróleo precisa de um Estado forte. Quem acha isso pouco moderno pode continuar respirando fumaça.


BIOMASSA - A ETERNA ENERGIA DO FUTURO. Autor: Gilberto Felisberto Vasconcellos. Editora: Senac São Paulo. Quanto: R$ 20 (142 págs.).



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