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5º CHIVAS FESTIVAL
Sem "estrelas pop", evento confirma vitalidade do jazz
CARLOS CALADO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Só o fato de ter trazido pela primeira vez ao país a Sun Ra Arkestra, uma das big bands mais
originais (e a mais subestimada)
na história desse gênero musical,
já seria um grande mérito. Mas o
5º Chivas Jazz Festival, que terminou na madrugada de anteontem,
deixou um saldo bem maior.
Com o DirecTV Music Hall lotado nas quatro noites, o festival
mostrou mais uma vez que não
precisa programar música pop,
nem mesmo jazzistas conhecidos
no país, para atrair seu público.
Um caso típico: sem discos lançados aqui, a veterana cantora Sheila Jordan conquistou fácil a platéia com versões de standards carregadas de emoção, bem acompanhada pelo trio do sofisticado pianista Steve Kuhn.
Também inédito no país, o
acordeonista Richard Galliano
provocou sorrisos com seu sacudido baião "Sertão", depois de
contagiar o público com valsas e
tangos jazzísticos. O francês teve
que voltar ao palco duas vezes.
Outro favorito foi o lendário baterista Louis Hayes, que deu uma
aula de suíngue e domínio do instrumento, sem apelar para exibicionismos. Destacando os talentosos Vincent Herring (sax alto) e
Jeremy Pelt (trompete), sua Cannonball Adderley Legacy Band
impressionou pela precisão.
Impacto semelhante causou a
Bump the Renaissance Band de
Bobby Previte, baterista inquieto
que mistura elementos de vanguarda com batidas próximas do
rock e do funk, em composições
que parecem trilhas sonoras.
Mesmo sem estar num dia inspirado como intérprete, o trompetista Tom Harrell confirmou
em quatro temas inéditos e belos
que é um compositor privilegiado. Em seu quinteto, o sax tenor
Marcus Strickland provou ser um
talento em ascensão.
O veterano sax alto Bud Shank
também agradou, tocando releituras do bebop, mas o ritmo mecânico que o baterista Joe la Barbera imprimiu ao único samba do
repertório ("Carousels") quase
comprometeu o prestígio de precursor da bossa nova de Shank.
Mais fria foi a reação da platéia
frente ao trio do pianista Andrew
Hill, que preferiu improvisos cerebrais a exibir melhor suas criativas composições. O homenageado Raul de Souza também não
chegou a empolgar. Apostou no
repertório de seu novo disco, que
não parece ter algo de novo.
Já os velhinhos alucinados da
Sun Ra Arkestra provaram que as
excentricidades musicais e cênicas de seu criador, morto há uma
década, soam cada vez mais contemporâneas. Recriando suíngue
dos anos 20, blues e standards,
sempre com um toque vanguardista, o saxofonista Marshall
Allen e seus parceiros sugerem
que no jazz o "como tocar" é, cada
vez mais, o espírito da coisa.
Carlos Calado é autor de "O Jazz como
Espetáculo", entre outros livros
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