São Paulo, Terça-feira, 11 de Maio de 1999
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Bolshoi, que chega a São Paulo, afunda com a Rússia


Companhia de balé, que se apresenta de hoje a domingo no Municipal, busca a modernidade, mas está presa na crise


ANA FRANCISCA PONZIO
enviada especial a Moscou

Ao longo de seus 223 anos de história, o Ballet Bolshoi tornou-se um dos embaixadores da cultura russa. Representante de um teatro presidencial, como é chamada em Moscou a sua sede homônima, o Bolshoi já espelhou, artisticamente, a condição de potência mundial desfrutada pela antiga União Soviética.
Sempre um sensor preciso, o Bolshoi que chega hoje a São Paulo para a temporada que se estende até domingo no Teatro Municipal reflete a transição que a sociedade russa vem enfrentando desde o início da perestroika.
"A perda da primazia no mundo é a principal consequência das mudanças", diz Alexei Fadeechev, diretor artístico da companhia de balé, cujas decisões se subordinam a Vladimir Vassiliev, diretor principal do teatro Bolshoi.
Embora já tenha encarnado os ideais artísticos da era comunista, o ex-bailarino Vassiliev parece empenhado em substituir os traços monumentais do passado, responsável pelo imobilismo estético do Bolshoi, por uma proposta artística aberta, capaz de expressar o que se passa no mundo, e não só na Rússia.
Ao assumir a direção do Bolshoi, em 1995, Vassiliev surgiu como chance de renovação após o "reinado" de Yuri Grigorovich, que comandou a companhia de balé durante três décadas.
Também coreógrafo, Grigorovich impôs sua marca no repertório do Bolshoi, que possui inúmeros balés assinados por ele.
"Nos últimos quatro anos, tentei preservar o que havia de melhor de Grigorovich. Mas um teatro não pode ser governado pelas mesmas leis de um museu. Precisamos evoluir e, para tanto, espero convidar coreógrafos como Jiri Kylian, Willian Forsythe e Mats Ek", afirma Vassiliev, citando a trinca de criadores que hoje ocupa o Olimpo da dança contemporânea.
As boas intenções de Vassiliev, no entanto, vêm enfrentando as restrições causadas pela crise financeira russa. Por conta de tais problemas, o Bolshoi atual carrega uma imprecisão que, consequentemente, lhe roubou brilho e carisma. Nesse difícil período de travessia, também o elenco vem deixando para trás os moldes que deram identidade ao grupo.
Os balés heróicos, que se tornaram marcas do Bolshoi, já não atraem por exemplo um dos bailarinos da nova geração, Nikolai Tsiskaridze, de 25 anos.
Avesso aos papéis de super-homem, que compunham o antigo perfil do Bolshoi, Tsiskaridze prefere dançar balés líricos. Com relação ao repertório moderno, ele sonha em estrelar "Bolero", de Maurice Béjart.
"Com a desintegração da União Soviética, piorou muito a qualidade de vida dos artistas de ópera e balé. O setor mais favorecido, agora, é o da música pop, porque infelizmente o governo atual gosta de canções leves", diz o bailarino.
Embora distante das regalias que a Rússia proporcionava aos artistas do balé, Tsiskaridze não pretende sair de seu país. "O mercado ocidental ficou saturado de bailarinos russos, cujos desempenhos se tornaram mais medíocres."


Ana Francisca Ponzio viajou a Moscou a convite da organização do evento.


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