São Paulo, sexta-feira, 11 de junho de 2004

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COMENTÁRIO

Cantor foi pioneiro da "soul music"

CARLOS CALADO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Raríssimos artistas foram tão originais e influentes na música do último século como esse cantor, pianista e compositor americano, considerado por vários críticos o virtual inventor da "soul music". O codinome "The Genius" (O Gênio), que passou a ser associado a Ray Charles ainda na década de 50, era merecido.
Sua grande sacada musical já vinha estampada em seu primeiro sucesso. Lançada em 1955, a dançante "I've Got a Woman" exibia a voz rascante e tipicamente "bluesy" de Charles, impulsionada por seu piano marcado pelas harmonias do gospel, o gênero musical cultivado nas igrejas negras. Com o acréscimo das Raelettes, grupo vocal feminino que passou a acompanhá-lo pouco depois, Charles aproximou ainda mais sua concepção sonora do "feeling" dos coros gospel.
Em 1959, após o sucesso estrondoso de "What'd I Say", um longo blues que remetia à celebração emotiva e dançante das congregações batistas, Charles foi contratado a peso de ouro pela ABC Records. Apoiado em sua fórmula original, criou outros dos maiores hits de sua carreira: "Georgia on My Mind", "Hit the Road Jack" e "I Can't Stop Loving You".
Assim, em menos de uma década, Charles construiu uma obra originalíssima e popular, que serviu de modelo para que intérpretes e compositores mais jovens, como Sam Cooke, James Brown, Otis Redding e Solomon Burke, desenvolvessem o que se veio a chamar de "soul music", já em meados dos anos 60.
Mas Charles não se limitou a esse gênero musical. Em 1961, no álbum "Genius + Soul = Jazz", mostrou seu suingue jazzístico em arranjos de Quincy Jones e Ralph Burns. No ano seguinte, no álbum "Modern Sounds in Country and Western", perpetrou uma mistura até então considerada insólita: recriou canções country com um tratamento de rhythm and blues.
Quem assistiu a algumas de suas apresentações sabe que quase todas elas eram bem parecidas. Nos momentos mais emotivos do show, Charles conquistava de vez a platéia com seu gesto característico: levantava-se do piano, com aquele jeitão desengonçado, e simulava um grande abraço em todos. Atire a primeira pedra quem disser que não sentiu um arrepio diante dessa demonstração carinhosa de quem se dedicou por cinco décadas a tornar mais palatável a vida de milhões de fãs.


Carlos Calado é autor de "O Jazz como Espetáculo", entre outros livros



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