|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CRÍTICA
Romantismo e ingenuidade ao cair da tarde
BIA ABRAMO
COLUNISTA DA FOLHA
Ainda não está devidamente
explicada a origem do fôlego de audiência que tiveram as
novelas da Globo nos últimos
tempos, mas é curioso notar que
isso aconteceu paralelamente à
retomada de certos cânones. A
idéia de uma grade de novelas
cujas temáticas e abordagens vão
se "apimentando" na medida em
que a noite avança é uma delas.
Quando essa grade se estabeleceu, nos anos 70, acompanhava
um pouco o estágio de liberação
dos costumes, como se a TV estivesse testando os limites daquilo
que ousava em termos de comportamento, e oferecia uma certa
gradação das ousadias. Hoje, a
grade não tem mais essa função
de ir alargando os limites do espectador, mas ainda assim serve
para criar nichos de temas e de
atmosferas, o que certamente
atrai ou repele determinados
grupos do público.
O último trio de novelas, "Cabocla", "Da Cor do Pecado" e
"Celebridade", manteve bastante
fiel a divisão temática. Enquanto
"Celebridade" movia-se à base
de sexo, sangue e simpatia pelo
demônio, a novela da sete, "Da
Cor do Pecado", é toda ensolarada, jovem e algo cômica, ainda
que tenha ali uns vilões bem nefastos e uma certa violência.
"Chocolate com Pimenta" e
sua sucessora, "Cabocla", ambas
às seis e ambas muito bem-sucedidas de audiência, seguiram na
trilha da novela de ares juvenis e
perdidas em algum ponto do
passado.
São novelas que tiram sua força
do fato de tentarem resgatar uma
certa ingenuidade nas relações
amorosas. Independentemente
da trama, a heroína, via de regra,
inicia a novela ainda virgem. O
herói ainda tem algo de garoto e,
muitas vezes, tem que se haver
com o pai -dominador ou ausente. É um espaço de elaboração
de questões adolescentes, mas
não exatamente uma novela para
adolescentes.
Na verdade, recolocadas numa
perspectiva romantizada e idealizada, tais questões deixam de ser
dos adolescentes e viram da adolescência e, portanto, de todos os
que a viveram. Talvez seja esse o
grande acerto do horário, fazer
novelas de alguma maneira evocativas, não apenas de outros
tempos e espaços, mas de períodos da vida do espectador.
Ainda assim, não deixa de ser
curioso o fato de que, via de regra, romantismo e ingenuidade
não cabem em ambientes urbanos e contemporâneos. A fórmula prevê ambiente rurais ou provincianos e uma certa distância
no tempo. A última novela das
seis que se pretendia romântica e
ingênua nos dias de hoje, "Coração de Estudante", sofreu uma
daquelas intervenções brutais e
acabou se transformando numa
mixórdia esquisitíssima.
"Chocolate com Pimenta" retomou o formato tradicional, escalou atores do primeiro time e
bingo! Agora, "Cabocla" mantém a fórmula da trama anterior
e continua se dando bem. É uma
novela bonitinha e doce, com
questões pequenas e horizontes
grandes.
@: biabramo.tv@uol.com.br
Texto Anterior: Novelas da semana Próximo Texto: TV paga: Eurochannel apresenta três horas da banda Oasis Índice
|