São Paulo, sábado, 11 de julho de 1998

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IMPRENSA NOS EUA
Disney leva diretora da "New Yorker'

AMIR LABAKI
de Nova York

Num golpe de mestre, a polêmica jornalista britânica Tina Brown, 44, surpreendeu a todos anteontem, anunciando que troca a direção da prestigiada revista semanal "The New Yorker" por um ambicioso projeto com a Miramax, a distribuidora de filmes de arte da Walt Disney Company.
A ida de Brown a Hollywood encerra uma colaboração de 16 anos com o grupo editorial Newhouse, detentor de jornais, canais a cabo e revistas como "Vanity Fair".
Tina Brown vai coordenar uma nova companhia, que deve desenvolver uma revista mensal, uma editora de livros, projetos de filmes e de especiais de TV.
"Essa parceria com a Miramax é uma grande oportunidade para a criação e para negócios", disse a jornalista em nota oficial. Brown classificou a proposta como "tentadora demais", tanto pela colaboração com a cultuada distribuidora dos irmãos Weinstein quanto pela retomada da dupla com Ronald A. Galotti, com quem trabalhara antes na "Vanity Fair" e que deixa o atual cargo de "publisher" de "Vogue", também do grupo Newhouse.
A transferência tem sabor de vingança para Brown. Há seis anos ela foi esnobada em Nova York ao trocar o cargo de editora-chefe de "Vanity Fair" pela direção de redação da "New Yorker". Era mulher, jovem, inglesa, bem-sucedida e vinculada à cultura pop. O que vinha fazer na mais elitista das publicações literárias americanas, fundada por Harold Ross e Raoul Fleischmann em 1925?
Brown respondeu logo. Arejou graficamente a revista, abrindo-a até para ensaios fotográficos. Renovou o time de articulistas, bancando novas estrelas como Adam Gopnik, Anthony Lane, David Remnick e Henri Louis Gates. A venda em bancas cresceu 145% em sua gestão. A revista reconquistou prestígio, vencendo 14 prêmios.
Ainda assim, as contas não fecharam. Desde que teve o controle assumido pelo grupo Newhouse, em 1987, "The New Yorker" acumulou um prejuízo estimado entre US$ 112 milhões e US$ 135 milhões. Apesar da recuperação com Brown, só no ano passado o balanço foi negativo em US$ 11 milhões.
As tensões cresceram, e desde o ano passado falava-se que a cabeça de Brown estava a prêmio. Ao renitente prejuízo somava-se a resistência dela aos planos centralizadores da Condé Nast, a companhia da Newhouse dedicada a revistas. Planeja-se mudar a "New Yorker" para a sede única do grupo, em construção na Times Square, retirando-a do célebre endereço na rua 43 oeste. Outro ponto de atrito seria o projeto de venda de anúncios em pacote para "The New Yorker" e as demais publicações do selo Condé Nast.
Volta por cima
Com a demissão voluntária, Tina Brown deu a volta por cima. O preconceito face à sua gestão esfumou-se e ela só tem colhido elogios desde o anúncio de sua saída.
O maior problema sobrou nas mãos de Samuel I. Newhouse Jr., o milionário diretor-geral do grupo. Uma porta-voz disse que a sucessão de Brown será logo definida. Ela deixa o cargo em agosto.
Não há um herdeiro óbvio. Se a intenção for manter o projeto Tina Brown, estão cotados seus pupilos Kurt Andersen e David Remnick. Se a idéia for aproximar a revista do grupo, fala-se em James Truman, executivo da Condé Nast, e em Graydon Carter, editor da "Vanity Fair".
A Newhouse sabe que não pode repetir o erro cometido ao assumir há 11 anos o controle da revista, adquirido dos fundadores, a família Fleischmann. Sem o menor tato, afastaram da direção William Shawn (1907-1992), funcionário da casa havia 55 anos e no cargo desde 1952, substituindo-o pelo editor de livros Robert A. Gottlieb.
A circulação cresceu um pouco, mas a revista perdeu prestígio e publicidade. O baixo lucro do final da era Shawn virou prejuízo. Em junho de 1992, Gottlieb era substituído por Tina Brown.
Num livro recente (leia texto nesta página), a jornalista Lillian Ross narra a simpatia com que Shawn recebeu as reformas de Brown na "New Yorker". Ross chegou a marcar um encontro entre Shawn e Brown, inviabilizado pela repentina morte do editor.
A passagem de bastão se deu simbolicamente por meio do livro de Ross. Nos últimos dois dias, a mídia americana tem feito "mea culpa" e celebrado a breve gestão de Tina Brown. É o reconhecimento que faltava: até o último suspiro, ninguém mais que William Shawn soube o que era melhor para "The New Yorker".



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