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Crítica/cinema/"Primo Basílio"
Adaptação de Daniel Filho para "Primo" é mais próxima do universo rodriguiano
SÉRGIO RIZZO
CRÍTICO DA FOLHA
Daniel Filho não nasceu
na TV Globo, mas é difícil não associar o seu
popular trabalho recente em cinema, como produtor e diretor
("A Dona da História", "Se Eu
Fosse Você"), à tradição de teledramaturgia consagrada pela
emissora. Para o bem e para o
mal.
Para o bem, em "Primo Basílio": o cuidado com o acabamento técnico, por exemplo,
em busca de equivalência no cinema ao "padrão Globo de qualidade" na TV, sobretudo o demonstrado em produções ficcionais de maior fôlego, como
as minisséries de época (entre
as quais a versão do romance de
Eça de Queiroz que o próprio
Daniel Filho dirigiu, em 1988).
A direção de arte de Marcos
Flaksman, a fotografia de Nonato Estrela e os figurinos de
Marília Carneiro respondem,
em especial, pela recriação da
São Paulo de 1958 - em substituição a Lisboa do século 19 -
como um espaço imaginário
que se funde com elementos
portugueses e cariocas.
O uso de canções, de Tom Jobim ("Saudade do Brasil") à dor
da poesia de Vinicius de Moraes em "Apelo", interpretada
por Dick Farney e Claudette
Soares, contribui para estabelecer um registro de melodrama associado a uma atmosfera
de nostalgia, inocência e conservadorismo. Em torno dela,
adultério, incesto e pecado.
Chama a atenção, nessa
abordagem do tema, que a personagem mais forte, a empregada feita por Gloria Pires na
fronteira entre o drama e o humor, esteja mais próxima do
universo de Nelson Rodrigues,
forte referência para a adaptação assinada por Daniel Filho e
Euclydes Marinho, do que para
a Juliana de Eça de Queiroz.
O escritor português talvez
seja quem mais vá interferir na
cobrança que "Primo Basílio"
poderá receber, como se tivesse
a obrigação de estar à altura do
clássico do realismo na literatura, do qual empresta o nome
e as coordenadas. Sua vida
seria provavelmente mais fácil
se ele se chamasse "A Madame
e a Empregada" ou "Lágrimas
de Adúltera".
Para o mal? A dependência
do verbo, por exemplo: os diálogos cumprem, muitas vezes, o
papel que caberia, em tratamento mais cinematográfico, à
imagem e a tudo o que na trilha
sonora não é palavra. Algumas
seqüências parecem apressadas, com um ritmo de cortes
que, funcional para os enquadramentos mais fechados da
TV (e para a carreira do filme
em DVD), limita o emprego da
direção de fotografia como cinematografia.
Ao menos um personagem
importante (o amigo de Jorge,
Sebastião, interpretado por
Guilherme Fontes) fica um
tanto solto no ar, sugerindo que
havia nele mais um pequeno
drama a explorar nessa enclausurada leitura - parafraseando
Vinicius, mas com a voz de Nelson Rodrigues - da tristeza que
há nas preces de quem suplica o
perdão do seu amor.
PRIMO BASÍLIO
Produção: Brasil, 2007
Direção: Daniel Filho
Com: Débora Falabella, Fábio Assunção, Reynaldo Gianecchini, Gloria Pires
Onde: Bristol, Cine Bombril, Central Plaza e circuito
Avaliação: regular
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